A felicidade no amor aos livros
Da Grécia a Santo Isidoro de Sevilha e a São Bonifácio
Ricardo da COSTA
Bárbara DANTAS
In: CORTIJO OCAÑA, Antonio (dir. & ed.). eHumanista. Volume 59. Journal of Iberian Studies.
University of California Santa Barbara (EUA), 2024, pp. 211-235.
Resumo: Estudo sobre a Educação fundada no Espírito baseada na tradição livresca ocidental, no amor à palavra impressa. Sua trajetória a partir da Grécia e de Roma e sua disseminação do Cristianismo, com o protagonismo da Igreja Católica. Dos primeiros religiosos cristãos à tradição fundada por Bento de Núrsia (480-547) e Cassiodoro (c.485-585), até São Bonifácio (c.672-754) e o Enciclopedismo de Isidoro de Sevilha (c.560-636).
Abstract: Study on Education founded on the Spirit based on the Western bookish tradition, on the love of the printed word. Its trajectory from Greece and Rome and its dissemination of Christianity, with the leading role of the Catholic Church. From the first Christian religious to the tradition founded by Benedict of Nursia (480-547) and Cassiodorus (c.485-585), to Saint Boniface OSB (c.672-754) and the Encyclopedism of Isidore of Seville (c.560-636).
Palavras-chave: Bibliofilia – História da Leitura – Bibliotecas – Bento de Núrsia – Cassiodoro – Isidoro de Sevilha – São Bonifácio.
Keywords: Bibliophile – History of Reading – Libraries – Benedict of Nursia – Cassiodorus – Isidore of Seville – Saint Boniface.
Ricardo da COSTA
Bárbara DANTAS
In: CORTIJO OCAÑA, Antonio (dir. & ed.). eHumanista. Volume 59. Journal of Iberian Studies.
University of California Santa Barbara (EUA), 2024, pp. 211-235.
Resumo: Estudo sobre a Educação fundada no Espírito baseada na tradição livresca ocidental, no amor à palavra impressa. Sua trajetória a partir da Grécia e de Roma e sua disseminação do Cristianismo, com o protagonismo da Igreja Católica. Dos primeiros religiosos cristãos à tradição fundada por Bento de Núrsia (480-547) e Cassiodoro (c.485-585), até São Bonifácio (c.672-754) e o Enciclopedismo de Isidoro de Sevilha (c.560-636).
Abstract: Study on Education founded on the Spirit based on the Western bookish tradition, on the love of the printed word. Its trajectory from Greece and Rome and its dissemination of Christianity, with the leading role of the Catholic Church. From the first Christian religious to the tradition founded by Benedict of Nursia (480-547) and Cassiodorus (c.485-585), to Saint Boniface OSB (c.672-754) and the Encyclopedism of Isidore of Seville (c.560-636).
Palavras-chave: Bibliofilia – História da Leitura – Bibliotecas – Bento de Núrsia – Cassiodoro – Isidoro de Sevilha – São Bonifácio.
Keywords: Bibliophile – History of Reading – Libraries – Benedict of Nursia – Cassiodorus – Isidore of Seville – Saint Boniface.
Imagem 1
Cornélio Nepos descobre a História de Tróia de Dares, o frígio, em um armário. Iluminura de uma cópia (c.1340-1350) do poema Roman de Troie (c.1155-1160), de Benoît de Sainte-Maure (†1173). BnF, Manuscrits, français 782, folio 2v. O “armário” é o que hoje chamamos de Biblioteca.
A leitura é um diálogo – e este é o paradoxo do livro – com alguém que não está diante de nós (...) que está presente só como escrita. Existe uma interrogação dos livros (chama-se hermenêutica), e se existe hermenêutica, existe culto do livro. As três religiões monoteístas – judaísmo, cristianismo e islamismo – desenvolvem-se sob a forma de interrogação contínua de um livro sagrado (...) um homem que lê vale por dois: na verdade, vale por mil (os grifos são nossos).1
I. Grécia
Imagem 2
Hidria (ὑδρία, jarra para transportar água, azeite, e votos de juízes) de figuras vermelhas (c.450 a.C.). Ática, cerâmica, 33,02 cm. British Museum, n. 1885,1213.18. É possível que se trata de uma representação da poetisa Safo (c.630-570 a.C.). Uma mulher sentada lê um papiro. Ao seu redor, três atendentes, de pé, portam, cada uma, com um objeto (da esquerda para a direita, a primeira com uma espécie de bolsa, a segunda com uma caixa quadrada de vime e a terceira com uma flor). Todas estão trajadas com um chíton (χιτών), túnica de lã ou linho.
Vá rapaz, toma o texto e lê (Teeteto, 143c).2
A ordem ao escravo dada por Euclides no Teeteto (séc. IV a.C.) de Platão (428-348 a.C.) pode muito bem ser ampliada para todo o âmbito do conhecimento: pegue o livro, pegue um livro. Leia-o! Assim inicia este famoso diálogo platônico sobre o saber e a sabedoria.3 E é assim que também principia o mundo interior.4
No Ocidente, a escrita alfabética surgiu na Grécia por volta do séc. VIII a.C. Seus primeiros leitores praticavam a leitura em voz alta: só no séc. V a.C., alguns gregos passaram a ler em silêncio5 – justamente quando começou a ser disseminado um comércio de livros e, com ele, a leitura privada.6
Lia-se em papiros na Grécia (pelo menos até o séc. VI a.C.) (imagem 2), mas também em tabuinhas de argila.7 Em relação ao acesso aos textos além das iniciativas privadas, é provável que Pisístrato (c.600-527 a.C.) tenha fundado em Atenas a primeira biblioteca pública.8
Com isso, a prática se disseminou. A tal ponto que, após a morte de Alexandre, o Grande (356-323 a.C.) e o início do período helenístico (323-31 a.C.), especula-se que todos os núcleos urbanos por ele fundados contavam com uma biblioteca real, um prestígio de suas cidades, pois era um atrativo para estudiosos e auxiliares para a administração pública.9
I.1. A Grande Biblioteca de Alexandria
Imagem 3
A Grande Biblioteca de Alexandria, de O. von Corben (1812-1886). Interpretação artística da Biblioteca de Alexandria baseada em algumas evidências arqueológicas. Fonte: Tolzmann, Don Heinrich; Alfred Hessel and Reuben Peiss. The Memory of Mankind. New Castle, DE: Oak Knoll Press, 2001.
Alexandre, o Grande, fundou a cidade de Alexandria em 331 a.C., na extremidade ocidental do Delta do Nilo. Provavelmente por volta de 295 a.C. Demétrio de Falero (c.350-280 a.C.) sugeriu a Ptolomeu I (367-282 a.C.) a criação da Biblioteca de Alexandria10, na forma de um anexo do Moseion (Μουσεῖον τῆς Ἀλεξανδρείας) – instituição dedicada às Musas e local de estudo e aprendizado.11
Por volta de 30-25 a.C., o geógrafo grego Estrabão (c.63 a.C.-24) visitou Alexandria com Élio Galo, governador do Egito (26-24 a.C.), e fez uma breve descrição da Biblioteca:
O Museu faz parte dos palácios. Tem um passeio público, um lugar mobiliado com assentos e um grande salão, no qual os homens de instrução, que pertencem ao Museu, fazem sua refeição. Esta comunidade também tem bens em comum, e um clérigo, anteriormente nomeado pelos reis mas atualmente por César, preside o Museu.12
As obras do Moseion foram concluídas sob o reinado de Ptolomeu II (309-246 a.C.). Sob Ptolomeu III (246-221 a.C.) a coleção da Biblioteca cresceu rapidamente graças a um decreto faraônico que determinava que todos os navios que chegassem a Alexandria deveriam entregar as obras sob suas posses para que fossem feitas cópias para a Biblioteca.13
Somado a isso, Ptolomeu II adquiriu os papiros do Liceu de Aristóteles provavelmente das mãos de Neleu de Escépis, discípulo do Estagirita que viveu por volta de 300 a.C. (ou de um de seus descendentes), fato que ajudou a formar o núcleo da maior biblioteca do mundo antigo14 – cerca de quinhentos mil volumina, segundo tradição relatada pelo historiador Flávio Josefo (c.37-100). Assim, Alexandria se transformou na capital intelectual do mundo mediterrâneo e matriz do trabalho intelectual de todas as civilizações ocidentais.15
II. Roma
No mundo romano, até Catão, o Censor (234-149 a.C.), a escrita estava circunscrita aos sacerdotes e nobres, responsáveis pelos conhecimentos citadinos sobre o sagrado e o jurídico. Com a chegada a Roma de bibliotecas gregas, obras helênicas passaram a servir como modelos para os livros latinos. Isso a ponto de, com seu bisneto, Catão, o Jovem (95-46 a.C.), a leitura privada já se tornara uma prática comum (e, com ela, as bibliotecas privadas, consideradas espaços de ócio).16
A leitura nasceu em Roma como uma atividade de prazer (voluptas), como nos diz Cícero (106-43 a.C.):
...tais estudos atraem pelo seu valor intrínseco, porque a mente se interessa por eles apesar de nenhuma utilidade prática oferecerem (...) Sei bem que a história tem uma certa utilidade, para além do prazer. Que motivo, porém, nos leva a ler com prazer obras de ficção de que nenhuma utilidade é possível extrair? (...)
Os antigos filósofos descrevem como seria a vida dos sábios nas Ilhas dos Bem Afortunados: libertos de todas as preocupações, sem necessitarem dos cuidados e apetrechos da vida quotidiana, a única coisa em que acham dever empregar o tempo é no estudo e na investigação dos fenómenos da natureza.17 Por nosso lado, entendemos que nestes estudos reside, não só aquilo que nos proporciona a felicidade nesta vida, mas também o alívio para os nossos sofrimentos (...).18
A primeira biblioteca pública romana foi fundada pelo cônsul Caio Asínio Polião (76-4 a.C.), ao lado do Templo da Liberdade.19. A segunda foi iniciativa de Augusto (63 a.C.-14), e ficava localizada no Pórtico do Templo de Apolo Palatino (infelizmente foi destruída por um incêndio).20 Sua irmã Otávia, a Jovem (66-11 a.C.), fundou duas bibliotecas no Pórtico de Otávia em honra à memória de seu filho Marco Cláudio Marcelo (41-23 a.C.) (todas com duas partes: uma para textos em grego, outra para obras latinas):
Sua linhagem manteve seu esplendor até Marcelo, sobrinho de César Augusto, filho da irmã de César, Otávia, com Caio Marcelo, que morreu durante seu cargo de edil em Roma21, tendo recentemente se casado com uma filha de César. Em sua homenagem e em sua memória, Otávia, sua mãe, dedicou a biblioteca, e a César o teatro, que leva seu nome.22
A partir de então, Roma tomou para si a missão de estender as letras ao mundo, à medida que o conquistava. Trajano (53-117) tornou a Biblioteca Úlpia uma das mais importantes da Antiguidade (imagem 4).
Imagem 4
Reconstituição (maquete) da Biblioteca Úlpia (112-114), localizada no Fórum de Trajano, em Roma.
Definitivamente, Roma adquiriu o gosto pela leitura. Além das públicas, havia bibliotecas privadas. Um magnífico exemplo de uma biblioteca privada romana – aliás, a única que sobreviveu, graças à tragédia da erupção do Vesúvio (em 79) – foi a da Vila dos Papiros (Villa dei Pisoni), em Herculano. Mais de mil e oitocentos papiros!23
A Vila, luxuosíssima, também abrigava a maior coleção de esculturas de bronze descoberta em um único contexto – pelo menos oitenta, de magnífica qualidade.24 Provavelmente pertenceu a Lúcio Calpúrnio Pisão Cesonino (c.105-43 a.C.), sogro de Júlio César (101-44 a.C.). Sua biblioteca era, definitivamente, filosófica, para seu uso particular: como as bibliotecas públicas, havia uma seção grega (de tratados epicuristas) e outra latina (de escritos contemporâneos).25
II.1. O papiro e o códice
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Busto masculino. Um homem, jovem, lê um papiro em um rolo. Afresco, Herculano, séc. I a.C. Museo archeologico nazionale di Napoli, inv. nr. 9072.
Para que tenhamos uma ideia de quão revolucionária foi a posterior difusão do códice (codex) na Idade Média, é preciso considerar o suporte textual anterior, o papiro.26 Este, frágil, não era flexível a ponto de poder ser dobrado. Seu armazenamento ocupava muito espaço (em escaninhos) e, para conter uma obra volumosa – como um tratado filosófico, por exemplo –, eram necessários muitos rolos. Por isso, o papiro era um suporte mais adequado a documentos oficiais, de chancelaria.
Imagem 6
Fragmento do Codex Gregorianus (c.291-294), compêndio de pronunciamentos legais de imperadores romanos dos séculos II-III.
Por todos aqueles motivos, os romanos desenvolveram o códice (codex), formato mais prático tanto para a escrita quanto para a leitura. Sua difusão se deu pari passu com a difusão do Cristianismo no Império, a ponto de, no início do século IV, ambos os suportes se equiparavam no uso dos escritores e copistas.27
O formato compacto do códice e sua praticidade logo ganharam o pragmático espírito romano, como se vê em um poema de Marcial (38-104) no início do século I:
qui tecum cupis esse meos ubicumque libellos
et comites longae quaeris habere uiae,
hos eme, quos artat breuibus membrana tabellis:
scrinia da magnis, me manus una capit.
ne tamen ignores ubi sim uenalis et erres
urbe uagus tota, me duce certus eris:
libertum docti Lucensis quaere Secundum
limina post Pacis Palladiumque forum.***
Tu que desejas ter contigo, em toda parte, meus livrinhos,
que procuras companheiros para uma longa viagem.
compra estes, que o pergaminho condensa em pequenas tabuinhas.
Guarda na estante os grandes; quanto a mim, apanha-me uma única mão.
Para que não ignores, pois, onde estou à venda e ande incerto,
por toda a cidade, estarás seguro com minha orientação:
procura o Secundo, liberto do douto Lucense,
na porta do templo da Paz, atrás do foro de Palas.28
III. Cristo, códices, cristãs
Et ecce audio vocem de vicina domo cum cantu dicentis et crebro repetentis, quasi pueri an puellæ, nescio: “Tolle, lege; tolle, lege.”29
***
Eis que, de súbito, oiço uma voz vinda da casa próxima. Não sei se era de menino, se de menina. Cantava e repetia frequentes vezes: – “Toma e lê; toma e lê”.30
Nos primeiros séculos do Cristianismo, o amor aos livros (códices) e aos estudos a muito custo foi mantido pela Igreja Católica, única instituição a sobreviver à queda do Império Romano do Ocidente, em 476.31 Isso porque as bibliotecas romanas estavam localizadas nas capitais e principais cidades, as primeiras a serem pilhadas pelos invasores bárbaros, povos germânicos analfabetos que contribuíram para uma sensível baixa do nível global de cultura.32
O modelo arquivístico seguido foi o da biblioteca pontifícia fundada pelo papa Dâmaso I (305-384) – posteriormente transferida para o Palácio de Latrão (anteriormente Domus Laterani33) – e o da biblioteca do papa Agapito I (c.490-536), no Célio34, ambas antecessoras da atual Biblioteca Apostólica Vaticana.35
Imagem 7
Esdras, o Escriba. Codex Amiatinus (c.700). Iluminura, Florença, Biblioteca Laurenziana, MS Amiatinus 1, folio 5r. Ao fundo, o armarium, com códices.36
O esmero e a preocupação da Igreja em preservar os livros para seus futuros leitores estão muito bem expressos em uma passagem da Vida de Santo Agostinho, escrita por Possídio de Calama (†c.437), a respeito da morte do bispo africano, em 430:
Testamentum nullum fecit, quia unde faceret pauper Dei non habuit. Ecclesiae Bibliothecam omnesque códices diligenter posteris custodiendos sempre iubebat (...).
***
Não fez qualquer testamento porque, como pobre de Deus, nada tinha para deixar. Sempre determinou que a Biblioteca da Igreja e todos os seus códices fossem cuidadosamente guardados para a posteridade (...).37
Juntamente com o amor aos livros por parte dos cristãos, nesses primeiros séculos do Cristianismo a participação das mulheres na cultura letrada foi fundamental. As cartas de São Jerônimo (c.342-420) a Paula (347-404) e a Marcela (325-410) atestam a importância da leitura e compreensão das Escrituras para uma sólida conversão.38 Aliás, a biblioteca de Marcela era provavelmente bem provida de obras gregas – nas classes elevadas, mulheres instruídas eram um fenômeno muito comum.39
Imagem 8
Retrato de Safo (c.55-79), 37 x 36 cm. Afresco no gesso (4° estilo pompeiano) descoberto na Casa VI, 17 (Insula occidentalis) em 1760 em Pompéia. O busto da jovem está em um medalhão violeta que se destaca contra a parede branca. Ela segura na mão esquerda um políptico de quatro tábuas e na direita um estilete que, afetivamente, traz para os lábios, em uma atitude meditativa, momento antes de escrever. O afresco, que acompanhava um retrato masculino, foi elaborado conforme um esquema imagético tradicional. Com seu tema da docta puella, ele indica que a menina pertencia a uma família culta e rica. Museo Archeologico Nazionale di Napoli, sala LXXVIII, inv. 9084.
Já Melânia, a Jovem (c.383-439) era, de fato, uma amante dos livros: adquiria-os com frequência, tomava-os por empréstimo ou mesmo os copiava, diariamente (e com uma elegante caligrafia!).40 Essas mulheres, aristocráticas, romanas, letradas, cultas, recentemente convertidas, eram um desdobramento real, cristão, da tradição clássica das doctae puellae41 (imagem 8).
Foi um gradativo processo cultural de interiorização: de uma descompromissada leitura literária ligada ao lazer, pagã, para uma comprometida leitura concentrada e atenta, cristã. Dos papiros e tabuinhas, pagãos, para o códice, cristão (imagem 9).42
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São Mateus escreve em um códice, inspirado por um anjo. Mosaico, séc. VI, Basílica de São Vital, Ravena, Itália. A seus pés, um cesto redondo com oito papiros. A cena é uma maravilhosa síntese da crucial mudança do suporte dos textos.
IV. Fundadores culturais da Europa: Bento (480-547) e Cassiodoro (c.485-585)
Na Idade Média, os livros foram provavelmente mais decisivos na elaboração de teorias do que na Antiguidade e na Idade Moderna. Certamente, o Sócrates platônico explicava seu itinerário filosófico seguindo o fio de leituras de filósofos pré-socráticos, mas em seu conjunto a filosofia antiga surgiu do contexto imediato dos problemas políticos do momento (...) Em comparação, a filosofia medieval foi muito mais livresca (...) Um dos interesses básicos da filosofia medieval foi a harmonização das vozes discordantes no contexto da tradição (os grifos são nossos).43
Kurt Flasch (1930-) está certo: o Cristianismo é uma religião do Livro – aliás, como o Judaísmo (e, posteriormente, o Islamismo).44 Está essencialmente ligado à escrita.45
Imagem 10
São Mateus escreve seu Evangelho em um códice. Evangelhos de Lindisfarne (c.710-720). Iluminura, Cotton Nero D. IV, folio 25v, British Library. Acima, sua representação no Tetramorfos (um anjo, nesse caso manuscrito também com um livro e uma trombeta). Um homem aureolado, também com um códice, estupefato, desponta por trás da cortina e presencia a cena). Nos primeiros séculos da expansão do Cristianismo na Europa, os iluministas que decoraram as Escrituras (e evangeliários, saltérios etc.) representaram costumeiramente os quatro evangelistas redigindo seus respectivos evangelhos. Assim, firmaram solidamente essa imagem na tradição manuscrita: um homem com um livro, escrevendo, absorto, meditando o que escreveu. Consolidaram imageticamente o vínculo cultural entre a fé e o texto.
Além de viver do livro, diferentemente do Islamismo, por exemplo (em que o Alcorão regula a vida dos muçulmanos), o Cristianismo crê que Cristo é o Verbo (λóγος) encarnado e vivo46, isto é, palavra pensada, meditada, refletida, ou seja, plenitude do pensamento.
Um dos motivos basilares da importância dos livros para a formação espiritual na Idade Média foi o protagonismo das Sagradas Escrituras na conversão consciente:
Que ninguém despreze a tua jovem idade. Quanto a ti, sê para os fiéis um modelo na palavra, na conduta, na caridade, na fé, na pureza. Esperando a minha chegada, aplica-te à leitura, à exortação, à instrução. Não descuides do dom da graça que há em ti, que te foi conferido mediante profecia, junto com a imposição das mãos do presbitério. Desvela-te por estas coisas, nelas persevera, a fim de que a todos seja manifesto o teu progresso (1Tm 4, 12-15) (os grifos são nossos).
O instrumento material que auxiliou a trilha dessa via do ser foi a Bíblia.47 O amor aos livros profanos naturalmente daí decorreu.48 As bibliotecas surgiram como espaços ideais para a meditação daquelas palavras escritas.49 E uma das primeiras dessa nova tradição considerativa foi a de Vivarium, de Cassiodoro (c.485-585).
IV.1. Vivarium, locus amoenus
Imagem 11
Representação do mosteiro Vivarium, com grande destaque para seus tanques de piscicultura. Institutiones (séc. IX), Mainz, Universität Würzburg.
Antes de se retirar da vida pública, Cassiodoro foi um político: questor (507-511), cônsul ordinário (514), prefeito da pretoria (533) e chanceler real (magister officiorum) por trinta anos.50 Tudo sob o reinado da Itália do rei ostrogodo (e ariano) Teodorico, o Grande (454-526).51 Também foi um notável literato, pois autor de uma vasta obra: escreveu tratados históricos, filosóficos, gramaticais, além de panegíricos e cartas.52
Cassiodoro foi contemporâneo de Boécio (c.477-524).53 Como ele, ansiou transmitir aos pósteros a cultura da Antiguidade. Católico, com o papa Agapito I (c.490-536) planejou a fundação de uma escola de estudos cristãos em Roma, mas o projeto foi abortado por causa da Guerra Gótica (535-554), estopim bélico que o obrigou a se exilar em Constantinopla com o papa Vigílio (c.500-555).54
Com o fim da guerra, Cassiodoro retornou para a Itália. Tinha cerca de sessenta anos quando então decidiu se retirar da vida pública e fundar um mosteiro em uma de suas propriedades, possivelmente em Squillace, na Calábria (sul da Itália): Vivarium (ou Castellum).
Além do mosteiro, em Vivarium havia uma biblioteca, um scriptorium – aposento preparado para o trabalho de copiar e ilustrar (iluminar) obras antigas55 – e um viveiro para a criação de peixes (imagem 11):
A localização do Monastério Vivariense vos convida a preparar muitas coisas aos peregrinos e necessitados, uma vez que tendes jardins irrigados e, próximo a eles, as águas do Rio Pellena que é repleto de peixes e que não deve ser tido como perigoso pelo tamanho de suas ondas nem como desprezível por sua pequenez (...) Há também mares que vêm até vós, abertos de tal modo a pescadores que, quando desejardes, a pesca pode ser colocada nos viveiros. Pois fizemos lá, com a ajuda do Senhor, tanques apropriados onde a multidão de peixes possa vagar sob o fiel monastério (...) Ademais, mandamos que construíssem banhos, aptamente preparados a corpos doentes, onde fluem propícias águas transparentes, que são perfeitas tanto para beber como para tomar banho.56
Essas disciplinas já haviam sido apresentadas como auxiliares (servas) da Filologia na obra Sobre o Casamento da Filologia e Mercúrio (De Nuptiis Philologiae et Mercurii, séc. V) de Marciano Capela (fl. 410-420)58, texto que serviu de inspiração para a base curricular de toda a Educação ocidental, do séc. V até pelo menos o Renascimento do séc. XII.59
As disciplinas do Trivium são assim por Cassiodoro definidas:
A gramática é a arte de discursar com beleza, uma habilidade que adquirimos através dos poetas e autores ilustres (Inst., Livro II, cap. I, 1).60
A retórica é a ciência do bem falar acerca de questões civis (Inst., Livro II, cap. II, 1).61
Varrão definiu a dialética e a retórica em Nove livros das disciplinas, usando a seguinte comparação: “Dialética e retórica são o punho fechado e a palma aberta da mão de um homem”. Uma encerra os argumentos numa breve oração, a outra percorre os campos da eloqüência com um discurso abundante; uma contrai a linguagem, a outra a distende (Inst., Livro II, cap. III, 2).62
E o Quadrivium:
Os escritores das letras seculares estabeleceram a aritmética como a primeira entre as disciplinas matemáticas, porque a música, a geometria e a astronomia, que a seguem, precisam dela para explicar suas noções (Inst., Livro II, cap. IV, 1).63
Ao tratar da Música, Cassiodoro nos proporcionou uma de suas mais belas definições:
A música difunde-se por todos os atos de nossa vida à medida que praticamos sobretudo os mandamentos do Criador e obedecemos de coração puro às regras por Ele instituídas. O que quer que digamos, o que quer que nos mova desde dentro pelo pulsar das veias, está associado pelos ritmos musicais à força da harmonia. A música é, como se vê, a ciência da correta modulação. A ela nos ligamos quando fazemos uso do bom convívio em nossas relações.
Mas quando praticamos iniquidades, já não possuímos música. O céu, a terra e todas as coisas neles realizadas pelo governo divino estão vinculadas à disciplina musical; ora, Pitágoras atesta que este mundo foi criado e pode ser governado por meio da música (Inst., Livro II, cap. IV, 2).64
E a Geometria e a Astronomia:
Voltemo-nos agora à geometria, que é a descrição especulativa das formas e a prova visível de que dispõem os filósofos (...) Tudo o que é bem arranjado e acabado pode ser atribuído às qualidades dessa disciplina (...) A geometria é, em verdade, a ciência da extensão imóvel e das formas (Inst., Livro II, cap. VI, 1 e 2).65
Resta tratar da astronomia. Se a buscamos com espírito moderado e casto, ela esclarece nossas ideias, como dizem os antigos, com grande luminosidade. É como subir com a alma até os céus, examinar racionalmente toda aquela máquina suprema e colher, em parte, com a sutileza contemplativa da inteligência, o que os mistérios de tanta grandeza esconderam. Ora, diz-se que o próprio mundo foi encerrado na circularidade esférica para encerrar as formas das coisas no espaço circular de sua órbita. Donde Sêneca compôs um livro em forma de diálogo, como é costume entre os filósofos, cujo título é Da forma do mundo. Livro que também vos deixamos para ler (...) A astronomia é, portanto, como já foi dito, a ciência que versa sobre o curso dos astros no céu. Ela investiga todas as formas e percorre as configurações das estrelas em relação a si mesmas e à Terra (Inst., Livro II, cap. VII, 2, 1 e 2).66
A proposta de Cassiodoro em suas Instituições foi preservar o patrimônio cultural antigo. Por isso, na biblioteca de Vivarium figuravam obras gregas de Homero (séc. VIII a.C.), Hipócrates (c.460-370 a.C.), Platão (c.427-348 a.C.), Aristóteles (384-322 a.C.), Euclides (fl.300 a.C.), Arquimedes (c.287-212 a.C.), Galeno (129-216) e Ptolomeu (c.100-170). De autores latinos, textos de Ênio (c.239-169 a.C.), Terêncio (c.195-159 a.C.), Varrão (116-27 a.C.), Cícero (106-43 a.C.), Lucrécio (c.99-55 a.C.), Salústio (86-35 a.C.), Virgílio (70-19 a.C.), Horácio (65-8 a.C.), Sêneca (4 a.C.-65 d.C.), Plínio, o Velho (23-79), Quintiliano (c.35-95) e Macróbio (fl.400).67
Após sua morte, a biblioteca de Vivarium desapareceu sem deixar vestígios. Alguns de seus livros foram para a biblioteca papal, outros para bibliotecas de cidades episcopais (Pavia, Milão, Ravena e Verona). Mas o mais importante fora semeado: se não fosse o trabalho de seus monges copistas em Vivarium, possivelmente não teríamos conhecido as obras clássicas completas (com exceção das de Virgílio).68
Por tudo isso, Cassiodoro já foi considerado um dos pais da Idade Média, não só por ter defendido a sabedoria antiga, a leitura dos clássicos e a necessidade de copiar suas obras para que não desaparecessem, mas sobretudo por ter influenciado Isidoro de Sevilha (c.560-636), Beda, o Venerável (c.672-735) e Alcuíno de York (c.735-804).69
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Entronado, Cassiodoro apresenta seu livro. Inicial iluminada “C” (séc. XII). Vault Case Manuscript 8, Institutiones, folio 1r. A Idade Média nunca se esqueceu do autor das Instituições.
IV.2. Bento e a centralidade beneditina da leitura
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Um livro de presente: entronado, São Bento (à esquerda) presenteia sua Regra a São Mauro (seu primeiro discípulo), admoestando-o a segui-la, enquanto outros dois monges observam a cena e comentam. Iluminura, Regula Sancti Benedicti (séc. XII), Saint Gilles, Nîmes, França, BL Add MS 16979, folio 21v.
Contemporâneo de Cassiodoro, Bento de Núrsia (480-547) foi declarado Patrono da Europa pela Igreja Católica.70 Com sua Regra (c.530)71, fundou um programa de vida, com disciplina e moderação, ordem e obediência, hierarquia na igualdade.72
Após a morte de Bento, sua Regra recebeu a bênção do papa Gregório Magno (c.540-604):
...o homem de Deus, além dos muitos milagres pelos quais se destacou no mundo, também se tornou notavelmente célebre em virtude da palavra de sua doutrina. Com efeito, escreveu uma regra monástica que é notável pelo espírito de discernimento e clara pela sua linguagem. Se alguém quiser conhecer mais profundamente a sua vida e os seus costumes, poderá encontrar na própria doutrina da regra os princípios de seu magistério, haja vista que o homem santo não poderia de nenhum modo ensinar outra coisa a não ser aquilo que ele mesmo viveu (os grifos são nossos).73
Graças à Regra e ao apoio do papado, a Ordem beneditina espalhou-se pela Europa. Para o tema que aqui nos interessa, a Ordem criou escolas monásticas por todo o continente que, pelas circunstâncias históricas refratárias ao estudo, se transformaram em refúgios da cultura intelectual.74
Na Regra, há determinações expressas para que os monges beneditinos se dediquem à leitura:
Capítulo 38 - Do leitor semanário
1. Às mesas dos irmãos não deve faltar a leitura; não deve ler aí quem quer que, por acaso, se apodere do livro, mas sim o que vai ler durante toda a semana, a começar do domingo.
Capítulo 48 - Do trabalho manual cotidiano
1. A ociosidade é inimiga da alma; por isso, em certas horas devem ocupar-se os irmãos com o trabalho manual, e em outras horas com a leitura espiritual (...).
4. Da hora quarta até mais ou menos o princípio da hora sexta, entreguem-se à leitura (...).
10. De 14 de setembro até o início da Quaresma, entreguem-se à leitura até o fim da hora segunda (...),
13. Depois da refeição, entreguem-se às suas leituras ou aos salmos.
14. Nos dias da Quaresma, porém, da manhã até o fim da hora terceira, entreguem-se às suas leituras, e até o fim da décima hora trabalhem no que lhes for designado.
15. Nesses dias de Quaresma, recebam todos respectivamente livros da biblioteca e leiam-nos pela ordem e por inteiro;
16. esses livros são distribuídos no início da Quaresma (...).
23. Também no domingo, entreguem-se todos à leitura, menos aqueles que foram designados para os diversos ofícios.
24. Se, entretanto, alguém for tão negligente ou relaxado, que não queira ou não possa meditar ou ler, determine-se-lhe um trabalho que possa fazer, para que não fique à toa.75
Ora et labora.76 Acrescente-se que labora não diz respeito apenas ao trabalho manual, mas também inclui, como se percebe nas passagens acima da Regra, a leitura, o estudo – e, consequentemente, a meditação do que se leu (além do trabalho de copiar textos para enriquecer a biblioteca do mosteiro77).
E também Scienter nescia et sapienter indocta (“conscientemente ignorante e sabidamente sem instrução”): trata-se da douta ignorância, incessante (e instigante) paradoxo na vida cultural da Igreja.78
Claro que essa perplexidade existencial da associação beneditina do trabalho manual com o trabalho intelectual (ou da vida ativa com a vida contemplativa) é mais do que isso. O sintético aforismo da douta ignorância (desenvolvido filosoficamente por Nicolau de Cusa [1401-1464]79), não significa que devemos aceitar passivamente nossas dificuldades compreensivas.
Pelo contrário: ele expressa a ideia de que o reconhecimento tanto de nossa insignificância intelectual quanto nossa pequenez diante do universo são pressupostos fundamentais para a verdadeira aquisição do conhecimento, predisposição livre de preconceitos, com a mente e o coração abertos e espontaneamente dispostos a aprender a maravilha da Criação.80
Por isso, a tradição beneditina logo desenvolveu um conceito amplo, o de paisagem cultural81– a biblioteca como o epicentro de um ambiente total (além de abrigar o reservatório livresco propriamente dito, ser um local para leitura e cópia de obras manuscritas), privilegiado lugar de estudo diretamente ligado a seus mosteiros.82
V. Nas trevas, luzes: Santo Isidoro de Sevilha (c.560-636) e São Bonifácio (c.672-754)
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Isidoro de Sevilha escreve suas Etimologias. Iluminura, Aberdeen University Library, Univ. Lib. MS 24 (Aberdeen Bestiary), folio 81r.
De Bento a Isidoro, quase um século se passou. A cultura recuou – foram tempos particularmente difíceis para os amantes da leitura, das bibliotecas. Por volta do ano 600, epicentro da vida de Isidoro de Sevilha (c.560-636), a maior parte dos mosteiros espalhados pela Europa não tinha interesse pela cultura. Suas bibliotecas abrigavam basicamente livros litúrgicos e a Bíblia, mas quase nada de literatura clássica.83
Em contrapartida, as sementes estavam sendo plantadas: por exemplo, no reino merovíngio, as bibliotecas das recém fundadas abadias de Sainte-Geneviève (c. 520), Saint-Germain-des-Prés (558) e a de Saint-Denis (c. 650) tornam-se, pouco a pouco, as mais ricas do reino até o final de Antigo Regime.84
Nesse contexto refratário às letras, ainda que frutuoso, não deixa de ser notável o surgimento em cena do bispo Isidoro de Sevilha. Como a ele se referiu Bráulio (c.590-651), também bispo (visigodo), mas de Zaragoza:
Depois de tanta miséria, Deus fez surgir, creio eu, para restaurar os monumentos dos antigos e apartar de nós em qualquer ocasião o envelhecimento da ignorância e o colocou próximo de nós como um tutor.85
Sua obra mais famosa, Etimologias, foi redigida graças à sua notável biblioteca, mas sobretudo por sua refinada educação, provavelmente adquirida na escola episcopal de Sevilha (estes centros episcopais hispânicos eram então herdeiros diretos das antigas escolas municipais do Império Romano).86
Para redigir seu opus magnum, Isidoro se valeu tremendamente da cultura clássica. Um levantamento feito de suas citações dão o mapa de sua vasta cultura profana, de modo semelhante a Cassiodoro, porém ainda mais amplo: Virgílio (70-19 a.C.), duzentas e sessenta e seis citações (nominalmente mais de cem vezes); Cícero (106-43 a.C.), cinquenta e sete citações, trinta e nove nominais; Lucano (39-65), quarenta e cinco citações, trinta e duas nominais.
Com uma média de quinze citações, os dramaturgos Ênio (239-169 a.C.) e Plauto (230-180 a.C.), Terêncio (195-159 a.C.), Lucrécio (c.99-55 a.C.), Salústio (86-35 a.C.), Horácio (65-8 a.C.), e os poetas Ovídio (43 a.C.-17 d.C.) e Marcial (c.40-104).
Por fim, dos cristãos, Ambrósio de Milão (340-397), os poetas Prudêncio (348-413), Dracôncio (c.455-505) e Sedúlio (séc. V), Paulino de Nola (354-431), Jerônimo (340-420) e Agostinho (354-430).87
Para ater-nos exclusivamente às artes liberais, Isidoro dá um passo a mais em relação a Cassiodoro e não só as define, mas aprofunda seus conteúdos. Assim, a obra passa a ter um novo e original caráter, consultivo, enciclopédico, e cumpre a notável função de ser um confiável canal de transmissão da cultura antiga à Idade Média.88
V.1. Sobre as bibliotecas
No Livro VI de suas Etimologias, Isidoro aborda o tema: “Dos livros e ofícios eclesiásticos”, e nele define e, de modo sucinto, historiciza a ideia de biblioteca:
1. O termo biblioteca foi herdado do grego, e é lá que os livros ficam armazenados, já que biblíon “livro”, e theka, “lugar em que se coloca algo”.
2. Os livros do Antigo Testamento foram reparados por Esdras, escriba, inspirado pelo Espírito Santo, após terem sido queimados pelos caldeus enquanto os judeus voltavam a Jerusalém. Ele organizou todo o Antigo Testamento em vinte e dois livros, de modo que havia na Lei tantos livros quantas as letras do alfabeto.
3. Acredita-se que Pisístrato, tirano ateniense, foi o primeiro entre os gregos a fundar uma biblioteca que, depois de ser enriquecida pelos atenienses, foi trasladada para a Pérsia por Xerxes após o incêndio de Atenas. Muito depois, Seleuco Nicátor a fez regressar à Grécia.
4. Desde então, reis e várias cidades desejaram ter volumes de diversas procedências e traduzi-los para o grego por intérpretes.
5. Alexandre Magno e seus sucessores tiveram todo o interesse em dotar as bibliotecas com todo o tipo de livros. Especialmente Ptolomeu Filadelfo, o mais profundo conhecedor de toda a Literatura, tratou de emular a Pisístrato em seu cuidado pelas bibliotecas e dotou a sua própria não só de obras dos gentios, mas também das Sagradas Escrituras. Em sua época estavam catalogados em Alexandria setenta mil livros.89
A passagem acima das Etimologias mostra a relação direta que Isidoro estabelece entre o suporte do livro, cristão – o códice – e a tradição religiosa católica. Inclusive cronologicamente: da Grécia para o universo judaico, ao citar nominalmente o sacerdote (e escriba) Esdras (עזרא, fl. 480-440 a.C.), personagem fundamental para restaurar as escrituras judaicas após o retorno do cativeiro babilônico. Do papiro para o códice. Da Grécia e da tradição judaica para o códice e a tradição cristã.90
Mas Isidoro não se esqueceu de Roma. Logo a seguir se volta para o mundo romano para então depois tratar de “nossas bibliotecas”:
5.1. O primeiro a suprir Roma com livros foi Emílio Paulo, após a derrota de Perseu, rei dos macedônios; depois dele, Lúculo, dos despojos do Ponto. A seguir, César confiou a Marco Varrão a missão de construir uma grande biblioteca.
5.2. O primeiro a abrir em Roma uma biblioteca pública foi Polião91, com obras gregas e latinas acrescidas com imagens dos autores no átrio, magnificamente dispostas à mão.
6.1. Entre nós, foi o mártir Pânfilo, cuja vida foi escrita por Eusébio de Cesareia, o primeiro a se esforçar para se igualar a Pisístrato no estudo da biblioteca sagrada. Chegou a ter em sua biblioteca cerca de trinta mil volumes.
6.2. Também Jerônimo e Genádio procuraram por todo o orbe obras de escritores eclesiásticos, catalogando-as ordenadamente, e reuniram em pequeno índice de um volume os trabalhos daqueles autores.92
Como se percebe na passagem acima, Isidoro determina que os primeiros cristãos a terem uma biblioteca viveram ao redor do século IV, e tiveram interesses sobretudo teológicos. Essa afirmação do bispo de Sevilha não era novidade para os cristãos cultos. Isso já havia sido constatado na História Eclesiástica, do bispo Eusébio de Cesaréia (c.260-339): segundo ele, seu professor (e amigo) Pânfilo (†309), mártir, tinha grande zelo pelas coisas divinas e conseguiu reunir em sua biblioteca muitas obras de escritores eclesiásticos – como reafirma Isidoro, trezentos anos depois.93
Mais: Eusébio nos informa que, em seu tempo, ainda existia a Biblioteca de Élia – a mais antiga biblioteca cristã com datação comprovada, originalmente fundada por Alexandre – onde ele pôde reunir material para escrever sua História.94
Isidoro inicia suas Etimologias com as sete artes liberais, baseado em Cassiodoro. São artes porque se baseiam em regras, e tratam do que é verossímil e opinável. A Gramática é a perícia no ato de falar; a Retórica, a eloquência; a Dialética separa o verdadeiro do falso; a Aritmética fundamenta os números; a Música, as métricas e os cantos; a Geometria, as medidas e as dimensões terrenas e, por fim, a Astronomia, as leis dos astros.95
O bispo de Sevilha teve à sua disposição mais fontes do que Cassiodoro – certamente sua biblioteca era mais diversificada que a de Cassiodoro. Para tratar da Gramática (um verdadeiro tratado nas Etimologias!), além de literalmente citar Aristóteles (384-322 a.C.), Ênio (239-169 a.C.), Varrão (116-27 a.C.), Virgílio (70-19 a.C.), Lucano (39-65) e Donato (c.310-380), Isidoro se baseia em Cícero (106-43 a.C.), Quintiliano (c.35-100), Agostinho (354-430), Jerônimo (c.342-420), Pompônio Porfirião (séc. III, gramático africano comentador de Horácio), Diomedes, o Gramático (séc. IV), Flávio Sosípater Carísio (séc. IV), Mário Sérvio Honorato (séc. IV) e Prisciano (fl. 500).
Para que o leitor tenha uma ideia de sua riqueza expositiva e erudição, na seção dedicada aos tropos (expressões em sentido figurado – metáforas, catacreses, metalepses, metonímias etc.), Isidoro oferece exemplos literários para cada um deles.96
A mesma metodologia é aplicada para a Retórica. Há uma passagem importante que trata da coerência, isto é, a obrigatória organicidade entre discurso e prática – que Isidoro chama de pureza latina, provavelmente devido à tradição romana da palavra dada. A Cícero97:
A Retórica é a ciência de falar bem nas questões cívicas e com os adequados recursos da eloquência para persuadir o que é justo e o que é o bem. O nome Retórica deriva do grego rhetorídsen, que quer dizer “recurso da palavra”, já que entre os gregos “palavra” se chama rhésis e, orador, rhétor. A Retórica está inseparavelmente ligada à arte da Gramática. Com a Gramática aprendemos a falar corretamente e, com a Retórica, a expor os conhecimentos adquiridos.
(...)
O orador é um homem bom, perito na arte de falar. A retidão do homem se baseia em sua natureza, em seus costumes e em suas qualidades. Sua experiência se baseia em uma eloquência regulada por normas e que tem cinco partes: invenção, disposição, elocução, memória e pronunciação.
(...)
Fala com pureza latina aquele que utiliza palavras apropriadas e verdadeiras sem se distanciar da maneira de falar e da elegância próprias da época em que vive. Quem se expressa dessa maneira não considera suficiente meditar o que diz, mas dizê-lo com clareza e de modo suave. Mais: deve praticar o que diz! (os grifos são nossos)98
Em outras palavras: é condição sine qua non para a educação católica praticar a ética que está intrínseca (e deve ser ressaltada) nos conteúdos ensinados. É a tão ansiada harmonia entre atos e palavras, como admoestou o Cristo!99 Sem Isidoro de Sevilha e seu metódico e bibliófilo trabalho de enciclopedista da tradição literária e científica da Antiguidade, a transmissão da cultura clássica teria sido praticamente impossível.100
V.2. Envie-me algumas faíscas da tocha que brilha em sua terra: São Bonifácio (c.672-754), apóstolo dos alemães
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São Bonifácio converte um pagão e é martirizado. Sacramentário (Fulda, séc. XI). Msc. Lit. 1, folio 126v. Münchener DigitalisierungsZentrum, Staatsbibliothek, Bamberg. Apesar de ser uma iluminura impactante (tanto por sua moldura em folhagens laranjas, intenso colorido, traços irregulares que sugerem viva movimentação dos personagens e por seu fundo azul), trata-se de uma iluminura de pequenas dimensões que ocupa apenas uma parte da página (que tem as dimensões totais de 22,5 x 16,5 cm).
Justamente nesse período culturalmente declinante – mesmo com esparsas, porém brilhantes luzes como Isidoro de Sevilha –, a Igreja deu um novo impulso à cultura cristã. O papa Gregório Magno (c. 540-604), certo de que o mundo se aproximava do fim e que era preciso salvar almas enquanto fosse possível, enviou o monge beneditino Agostinho (†c.604), de temperamento tristis et dubitans101, com quarenta irmãos às ilhas britânicas para converter os saxões, “povo bárbaro, selvagem e incrédulo”.102 E levou livros. Muitos códices foram enviados de Roma à Inglaterra, especialmente York (cidade originalmente fundada pelos romanos – Constantino fora ali designado imperador, em 306, e aceito pelas tropas).103
Aquela preocupação apocalíptica papal curiosamente desencadeou um notável processo livresco: o monge (também) beneditino Winfredo (c.672-754), de Devonshire (Wessex), foi educado nesse ambiente bibliófilo, nos mosteiros de Essex e Nursling (ambas localidades fundadas pelos romanos).104 Ao peregrinar a Roma em 718, Winfredo expôs ao papa Gregório II (669-731) seus planos missionários. Recebeu então do pontífice o nome de Bonifácio, o apostolado das gentes pagãs e, posteriormente (732), do papa Gregório III (†741) o pallium episcopal, o que lhe conferia o poder de fundar novas sedes episcopais.105
Com a proteção (mundeburdio106) de Carlos Martel (c. 688-741), então em campanha militar na Baviera, Bonifácio viajou à Turíngia, Frísia e Hesse, onde realizou conversões especialmente após cortar o Carvalho de Donar (por volta de 723), árvore sagrada para os pagãos germânicos. Essa façanha nos informa a Vida de São Bonifácio, hagiografia escrita por São Willibaldo, bispo de Eichstätt (c.700-787):
...naquela época, muitos hessianos foram trazidos para a fé católica e, confirmados pela graça do espírito septiforme, aceitaram a imposição de mãos; outros, ainda não confortados em suas almas, recusaram-se a aceitar integralmente as evidências da fé; outros praticavam secretamente aruspícios, adivinhações, conjurações e encantamentos, e outros faziam tudo isso abertamente. Alguns se voltavam para auspícios, presságios e introduziam rituais de sacrifícios. Mas também havia quem, por terem uma mente mais sã, abandonaram as profanações pagãs e não praticavam mais nenhuma dessas coisas.
Aconselhado por estes últimos, o santo tentou derrubar, em um lugar chamado Gésmere, um carvalho de extraordinário tamanho, chamado no antigo vocábulo pagão de Árvore de Júpiter, com os servos de Deus a seu lado. Confortado pela determinação de sua mente, ele cortou a árvore, na presença de muitos pagãos que, devota e diligentissimamente, amaldiçoavam o inimigo de seus deuses. Mas quando ele cortou um pequeno pedaço da árvore, imediatamente o enorme volume de carvalho, impulsionado por um sopro divino vindo do alto, quebrou o cume da palmeira e caiu. Como por um sinal superior se quebrou em quatro partes, e quatro enormes troncos iguais em comprimento apareceram sem qualquer trabalho dos irmãos presentes.
Ao verem isso, os devotos pagãos que antes abjetamente amaldiçoavam, voltaram atrás, tornaram-se crentes e abençoaram o Senhor. Então, aquele ancião da mais elevada santidade tomou conselho com os irmãos e construiu um oratório de madeira com o material da supracitada árvore e o dedicou em honra a São Pedro, o Apóstolo.107
Com a madeira do carvalho pagão derrubado, Bonifácio ergueu uma capela dedicada a São Pedro, próximo do futuro mosteiro de Fritzlar (atualmente distrito de Schwalm-Eder).108
Quando foi enviado como missionário às terras germânicas com três outros monges, pediu que lhe enviassem livros da Inglaterra para as bibliotecas das novas sés episcopais (Mogúncia e Salzburg), e dos mosteiros que fundou, especialmente o de Fulda.109 Seu scriptorium, sua escola e, naturalmente, sua biblioteca, foram fundamentais para a difusão da conversão – e aculturação – da Europa, pelo menos até a época moderna.110
Três anos após proceder à unção real de Pepino, o Breve (c. 714-768), em Saint-Denis, Bonifácio foi martirizado pelos frísios em 754.111 Em um detalhe de uma iluminura do Sacramentário de Fulda (séc. XI), ele morre em seu martírio abraçado a um livro – que se conserva ainda hoje, tingido com o sangue do mártir: é o tratado de Isidoro de Sevilha, De officiis ecclesiasticis112 (imagem 15)!
Não é exagero afirmar que o trabalho de São Bonifácio lançou as bases culturais da cristandade medieval. Seu programa de construção e reforma seguiu os métodos da tradição romana. Suas fundações monásticas, especialmente Fulda, passaram a ser centros de cultura intelectual cristã, de ação missionária e de civilização material.113 Os mosteiros tomaram o lugar das cidades romanas, então moribundas, e permaneceram como centros de cultura até o desabrochar das cidades medievais e do ensino universitário no século XII.114
Conclusão
Isidoro de Sevilha representa o desabrochar hispânico do longo e amoroso processo de cultivo das Letras, de paixão pelos manuscritos, da devoção à vida meditativa. São Bonifácio, por sua vez, é um exemplo de quão importantes foram os mosteiros medievais para a preservação das obras da Antiguidade. Por exemplo, à guisa de conclusão, somente no scriptorium de Fulda foram copiadas, entre outras, as seguintes preciosidades:
1) Ambrosianus L 85 sup. (com o De agricultura de Columela [4-70]);
2) Bamberg Msc. Clas. 54 (Historia Augusta);
3) Laurentianus 47, 36 (as Epístolas, de Plínio, o Jovem [61-113]);
4) Leeuwarden 55 (as Noites áticas, de Aulo Gélio [c. 125-180]);
5) Tacitus Codex Laurentianus Mediceus 68.1. (os Anais de Tácito [c.56-120]);
6) Vaticanus latinus 1874 e o Cassel Phil. 2° 27 (dois códices das Res gestæ de Amiano Marcelino [c.330-400]);
7) Vaticanus latinus 3277 (as Argonáuticas, de Caio Valério Flaco [c.45-95]);
8) Códice com o Diálogo dos oradores e a Germânia, de Tácito;
9) códice com a obra De re coquinaria de Marco Gávio Apicio (séc. I);
10) Um dos códices da obra De rerum natura de Lucrécio (c. 99-55 a.C.) e
11) Ms. 8 da Biblioteca do conde Baldeschi-Balleani (com De grammaticis et rethoribus, de Suetônio [c. 69-122]).115
Sem as sementes clássicas e os troncos monásticos alto-medievais, não existiriam as árvores dos renascimentos posteriores – nem as tradições bibliotecária, museológica e arqueológica da história do Ocidente. Somos gratos aos nossos antepassados europeus por terem legado a nós, pósteros, o cultivo à Arte, à Cultura, à Educação Superior.
Notas
- 1. ECO, Umberto. A memória vegetal e outros escritos sobre bibliofilia. Rio de Janeiro: Editora Record, 2010, p. 16.
- 2. PLATÃO. Teeteto (trad.: Adriana Manuela Nogueira e Marcelo Boeri). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2010, p. 187 (os grifos são meus).
- 3. Para uma análise do Teeteto, ver BORGES, Anderson de Paula. Razão e Sensação no Teeteto de Platão. São Paulo: USP (tese de doutorado), 2009.
- 4. “E, contudo, se fecho os olhos, e mergulho / Dentro de mim, vejo à luz de outro sol, outro abismo / Em que um mundo mais vasto, armado de outro orgulho, / Rola a vida imortal e o eterno cataclismo, / E, como o outro, guarda em seu âmbito enorme, /Um segredo que atrai, que desafia, – e dorme.” – ASSIS, Machado de. “Mundo interior”. In: ASSIS, Machado de. Obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1985, vol. 3, p. 153 (os grifos são meus).
Ver DIXON, Paul. “Por dentro e por fora: Mundo Interior de Machado de Assis e a teoria fenomenológica”. In: Texto Poético, v. 15, n. 26, jan./jun. 2019, p. 146-153. - 5. SVENBRO, Jesper. “A Grécia arcaica e a clássica: a invenção da leitura silenciosa”. In: CAVALLO, Guglielmo; CHARTIER, Roger (orgs.). História da Leitura no Mundo Ocidental 1. São Paulo: Editora Ática, 1998, p. 41-42 e 55.
- 6. MANGUEL, Alberto. Uma História da Leitura. São Paulo: Companhia das Letras, 1997, p. 78.
- 7. FOURNET, Jean-Luc. “Papyrus, Greco-Roman period”. In: Roger S. Bagnall; Kai Brodersen; Craige Brian Champion; Andrew Erskine; Sabine R. Huebner (eds.). Encyclopedia of Ancient History, IX, 2013, p. 5057-5058.
- 8. MACLEOD, Roy. “Introduction: Alexandria in History and Myth”. In: MACLEOD, Roy (org.). The Library of Alexandria: Centre of Learning in the Ancient World. New York and London: I. B. Tauris Publishers, 2000, p. 1.
- 9. FOX, Robert Lane. “Hellenistic Culture and Literature”. In: BOARDMAN, John; GRIFFIN, Jasper; MURRAY, Oswyn (eds.). The Oxford History of the Classical World. Oxford University Press, 1986, p. 340.
- 10. MANGUEL, Alberto. Uma História da Leitura, op. cit., p. 216.
- 11. ESCOLAR SOBRINO, Hipólito. La biblioteca de Alejandría. Madrid: Gredos, 2001.
- 12. “Strabo, Geographia XVII 1”. In: The Ancient Library of Alexandria. A Project on the Ancient Library of Alexandria, its History, and its Place in Western Culture.
- 13. GALEN. “Commentary on Hippocrates' Epidemics, XVII.a, 605-607”. In: Extracts from Greek and Latin writers in translatio. Attalus’ home page.
- 14. CANFORA, Luciano. “The Fate of Aristotle’s Library”. In: ANTIGONE.
- 15. BARBIER, Frédéric. História das Bibliotecas. De Alexandria às Bibliotecas Virtuais. São Paulo: Edusp, 2023, p. 41-52.
- 16. CAVALLO, Guglielmo. “Entre volumen e codex: a leitura no mundo romano”. In: CAVALLO, Guglielmo; CHARTIER, Roger (orgs.). História da Leitura no Mundo Ocidental 1. São Paulo: Editora Ática, 1998, p. 72-73.
- 17. O tema das Ilhas dos Bem Afortunados – ou Ilhas Afortunadas – “...surge com Píndaro, e lá viveriam os justos depois de passarem por três encarnações terrestres. Já em Homero e Virgílio, temos as descrições dos Campos Elísios, onde vivem os beatos. E Horácio fala deles justamente em referência às inquietações da sociedade romana depois das guerras civis, como fuga de uma realidade desagradável.” – ECO, Umberto. História das terras e lugares lendários. Rio de Janeiro: Editora Record, 2013, p. 148.
- 18. MARCO TÚLIO CÍCERO. “As Últimas Fronteiras do Bem e do Mal (De finibus bonorum et malorum)”. In: Textos Filosóficos (trad. do latim, introd. e notas de J. A. Segurado Campos). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2012, p. 498-500 (Livro V, XIX, 51-53).
- 19. “Caio Asínio Polião (76-4 a.C.), republicano convicto, escritor e político sensível à cultura, colaborador de César e de Antônio, exerceu altos cargos dentro e fora da Itália (...) Foi amigo de Catulo, Cina e Horácio. Fundou a primeira biblioteca pública em Roma, no Templo da Liberdade, introduziu as recitações públicas da nova Literatura e reuniu uma famosa coleção de arte.” – VILLALBA I VARNEDA, Pere. Roma a través dels historiadors clàssics. Bellaterra: Universitat Autònoma de Barcelona, 1996, p. 365 (nota 1072).
- 20. BARBIER, Frédéric. História das Bibliotecas. De Alexandria às Bibliotecas Virtuais, op. cit., p. 56.
- 21. Edil (edilis curulis) – em Roma, magistrado responsável pela inspeção de bens e serviços públicos (o cargo foi criado em 483 a.C. para auxiliar o tribuno da plebe).
- 22. PLUTARCH. “The Life of Marcellus 30, 1”. In: The Parallel Lives.
- 23. Para a Biblioteca da Vila dos Papiros, uma boa obra introdutória é SIDER, David. The Library of the Villa dei Papiri at Herculaneum. Los Angeles: J. Paul Getty Museum, 2005.
- 24. BIEBER, Margaret. The Sculpture of the Hellenistic Age. Columbia University Press, 1961, p. 106-107.
- 25. CAVALLO, Guglielmo. “Entre volumen e codex: a leitura no mundo romano”, op. cit., p. 75.
- 26. LEWIS, Naphtali. Papyrus in Classical Antiquity. Oxford University Press, 1975.
Por sua vez, o códice era o livro manuscrito. Surgiu no século I de nossa era em Roma (85 ou 86) e se difundiu pelas comunidades cristãs entre os séculos I e III, provavelmente para se diferenciarem da tradição judaica. Ver CHARRON, Pascale. “Manuscrit”. In: CARRON, Pascale & GUILLOUËT, Jean-Marie. Dictionnaire d’Histoire de l’Art du Moyen Âge Occidental. Paris: Éditions Robert Laffont, 2009, p. 592-594. - 27. ROBERTS, Colin H; SKEAT, T. C. The Birth of the Codex. London: Oxford University Press, 1983, p. 1-75.
- 28. Epigramas de Marco Valerio Marcial (texto, introducción y notas: José Guillén; revisión: Fidel Argudo). Zaragoza: Institución “Fernando el Católico” (CSIC), 2004, p. 80 (Libro I, 2).
Edição brasileira: MARCIAL. Epigramas de Marco Valério Marcial (trad., notas e posfácio: Rodrigo Garcia Lopes). Cotia: Ateliê Editorial, 2017. - 29. S. AURELII AUGUSTINI. Confessiones, Liber octavus, 12, 29. The Project Gutenberg eBook of Confessiones.
- 30. SANTO AGOSTINHO. Confissões (trad.: Ambrósio de Pina). Braga: Livraria Apostolado da Imprensa, 1990, p. 205 (Livro VIII, 12) (os grifos são meus).
- 31. Para se ter uma ideia de quão desastroso foi para a Cultura a queda do Império Romano do Ocidente, nenhuma biblioteca greco-romana sobreviveu após 476. Ver THOMSON, Rodney. “Bibliotecas”. In: LOYN, Henry R. (org.). Dicionário da Idade Média. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1990, p. 48.
- 32. BARBIER, Frédéric. História das Bibliotecas. De Alexandria às Bibliotecas Virtuais, op. cit., p. 64-65.
- 33. Originalmente propriedade da gens Plautia.
- 34. SPECIALE, L. “Armarium”. In: TRECCANI. Enciclopedia dell’ Arte Medievale (1991).
- 35. Biblioteca Apostolica Vaticana.
- 36. “Na página adjacente está o soberbo e famoso retrato de Esdras, a mais antiga pintura inglesa à qual se pode atribuir qualquer data absoluta (isto é, não posterior a 716) (...) O que de pronto me impactou foi a reluzente claridade do ouro em torno do halo de Esdras, ao fundo de sua estante de livros, nos lados e na superfície superior de seu banquinho, e nos retângulos que ficam nos cantos. Eu sabia, por meio de reproduções, que o artista tinha usado ouro (...), mas não esperava tanta vividez e brilho.” – DE HAMEL, Christopher. Manuscritos notáveis. São Paulo: Companhia das Letras, 2017, p. 80-81.
- 37. SAN POSIDIO. “Vida de San Agustín”. In: Obras completas de San Agustín I. Escritos filosóficos (preparado por Victorino Capanaga). Madrid: Biblioteca de Autores Cristianos, MCMXCIV, p. 363 (cap. XXXI).
- 38. Cartas 25, 26, 27, 28, 29, 30, 33, 34 e 37. SAN JERÓNIMO. Obras Completas Xa. Epistolario I (Cartas 1-85) (introd., trad. y notas por Juan Bautista Valero). Madrid: Biblioteca de Autores Cristianos, MMXIII, p. 234-315.
- 39. Além disso, “A cultura oferecida por Jerônimo presumia que uma mulher da aristocracia, da mesma forma que qualquer homem, trouxesse em si ‘um coração em que se armazenava toda uma biblioteca’.” – BROWN, Peter. Corpo e Sociedade. O homem, a mulher e a renúncia sexual no início do cristianismo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1990, p. 303-304.
- 40. CAVALLO, Guglielmo. “Entre volumen e codex: a leitura no mundo romano”, op. cit., p. 93.
“Melania dedicava quotidianamente un determinato numero di ore a trascrivere, con calligrafia elegante e in modo preciso, i testi che servivano alla propria edificazione, nonché alla lettura dei libri sacri e di raccolte omiletiche” – Melânia dedicava diariamente um certo número de horas à transcrição, com caligrafia elegante e precisa, dos textos que serviam para a sua própria edificação, bem como à leitura de livros sagrados e coletâneas homiléticas). – GIARDINA, Andrea. “Melania, la Santa”. In: Roma al femminile (a cura de A. FRASCHETTI). Roma: Editori Laterza, 1994, p. 278. - 41. “Las doctae puellae, por tanto, serían las hijas de los hombres más poderosos de la ciudad que, en previsión de la labor que tenían que cometer en la educación de sus hijos, eran preparadas desde niñas, educadas con los niños en ambientes cultos, donde les transmitían el conocimiento. Dentro de los círculos literarios, como el de Mesala, estaban rodeadas de los poetas más vanguardistas de la época, que habían tomado como modelo la tradición poética griega y componían sus propios versos.” – GONZÁLEZ SAAVEDRA, Berta. “La obra de una docta puella (Tibul. Carmina III 13-18)”. In: Quaderns de Filologia. Estudis literaris, vol. XVII (2012), p. 61.
- 42. CAVALLO, Guglielmo. “Entre volumen e codex: a leitura no mundo romano”, op. cit., p. 96.
- 43. FLASCH, Kurt. El pensament filosòfic a l’Edat Mitjana. Santa Coloma de Queralt: Obrador Edèndum, 2006, p. 138.
- 44. “A diferencia de las antiguas creencias politeístas, el cristianismo fue una religión de libro. La Antigüedad clásica no conocía ninguna imagen de un dios sosteniendo un libro en la mano, cosa que tan a menudo hace el Sumo Creador cristiano en las representaciones Majestas (…) El hecho de que en innumerables imágenes de crucifixión se pueda ver a san Juan profundamente afligido y con un libro en la mano dice mucho sobre la importancia del libro en Occidente.” – WALTHER, Ingo F.; WOLF, Norbert. Codices illustres. Los manuscritos iluminados más bellos del mundo. Desde 400 hasta 1600. Taschen, 2014, p. 11-12.
- 45. BARBIER, Frédéric. História das Bibliotecas. De Alexandria às Bibliotecas Virtuais, op. cit., p. 68.
- 46. “No princípio era o Verbo e o Verbo estava com Deus e o Verbo era Deus.” – Jo 1, 1.
- 47. MIGUEL ALDAZ, Luis. La Encarnación del Logos, plenitud de la naturaleza humana. Quito: Pontificia Universidad Católica del Ecuador, 2014.
- 48. “Pour moi, il est clair que l’Europe est apparue entre le IVe et le VIIe siècle, sous l’effet de deux phénomènes considérables; le premier étant le métissage entre les anciens habitants de l’Empire romain et ceux que l’on appelle traditionnellement les Barbares; le second étant le christianisme, qui a été incontestablement l’idéal commun de tout le continent. Cette Europe-là a eu beaucoup de chance dans son histoire. À commencer par l’héritage antique. Il n’y aurait pas eu d’Europe sans les bibliothèques, sans la présence du savoir gréco-romain dans l’enseignement. Platon, Aristote, Cicéron, c’est bien le Moyen Âge qui les a fait connaître et qui les a installés dans la pensée européenne!” (“Para mim, está claro que a Europa nasce entre o século IV e VII, sob o efeito de dois fenômenos consideráveis: o primeiro é a mestiçagem entre os antigos habitantes do Império Romano e aqueles que chamamos tradicionalmente de bárbaros; o segundo é o cristianismo, que foi incontestavelmente o ideal comum de todo o continente. Essa Europa teve muitas oportunidades em sua história. A começar pela herança antiga. Não haveria Europa sem as bibliotecas, sem a presença do saber greco-romano no ensino. Platão, Aristóteles, Cícero, é a Idade Média que os tornou conhecidos e que os instalou no pensamento europeu!”) (os grifos são nossos) – ROUGE, Jean-François; ARMANET, Max; DESMEDT, Gérard. “Les convictions européennes de l'historien Jacques Le Goff”. In: La Vie.
- 49. “Se producían libros nuevos en gran parte gracias a la religión cristiana que, a diferencia de otras creencias paganas anteriores, transfería ideas a los nuevos fieles mediante la palabra escrita en vez de una simple instrucción oral. Los que se convertían también recordaban las historias, los himnos y los rituales gracias a los textos. Los interminables debates que los eruditos cristianos crearon con ideas nuevas e interpretaciones de textos más antiguos, sus comentarios y los cismas resultantes todos dieron lugar a un auge en la producción de libros y la lectura, aunque también a la destrucción de aquellos libros considerados subversivos.” (os grifos são meus) – CARTWRIGHT, Mark. “Las bibliotecas de la antigüedad”. In: World History Encyclopedia en español.
- 50. BANNIARD, Michel. “Cassiodoro”. In: LE GOFF, Jacques (dir.). Homens e mulheres na Idade Média. São Paulo: Estação Liberdade, 2013, p. 45.
- 51. Ario (c. 256-336), presbítero de Alexandria, defendeu que “...o Logos, a Palavra de Deus que em Jesus se fizera carne, não era o próprio Deus, mas uma criatura infinitamente superior aos anjos, embora como eles criada do nada antes do começo do mundo.” – DUFFY, Eamon. Santos & Pecadores. História dos Papas. São Paulo: Cosac & Naif, 1998, p. 22.
- 52. STOPPACCI, Patrizia. “A herança do mundo antigo e a nova cultura cristã”. In: ECO, Umberto (org.). Idade Média I. Bárbaros, cristãos e muçulmanos. Alfragide: D. Quixote, 2014, p. 469-470.
- 53. Autor de uma das obras mais influentes na Idade Média: a Consolação da Filosofia. Ver BOÉCIO. Consolação da Filosofia (trad.: Luís M. G. Cerqueira). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2011. Edição brasileira: SEVERINO BOÉCIO. A consolação da Filosofia (trad.: André Gonçalves Fernandes; apres.: Ricardo da Costa). Campinas, SP: Vide Editorial, 2023.
- 54. STOPPACCI, Patrizia. “A herança do mundo antigo e a nova cultura cristã”, op. cit., p. 469.
- 55. KAUFFMANN, Martin. “Scriptorium”. In: Grove Arte Online. Oxford University Press, 2003.
- 56. CASSIODORO. Institutiones. Introdução às letras divinas e seculares (trad. e notas: Hugo Medeiros). Campinas: CEDET, 2018, p. 123 (Livro I, Cap. XXIX, 1).
- 57. MINOIS, George. História da Idade Média. Mil anos de explendores e misérias. São Paulo: Editora Unesp, 2023, p. 78.
- 58. CARDIGNI, Julieta. De nuptis Philologiae et Mercurii o la farsa del discurso. Una lectura literaria de Marciano Capela. Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Editorial de la Facultad de Filosofía y Letras Universidad de Buenos Aires, 2018.
- 59. SILVA, Matheus Corassa da; COSTA, Ricardo da. “A Alegoria. Do Mundo Clássico ao Barroco”. In: OSWALDO IBARRA, César; LÉRTORA MENDONZA, Celina (coords.). XVIII Congreso Latinoamericano de Filosofía Medieval – Respondiendo a los Retos del Siglo XXI desde la Filosofía Medieval. Actas. Buenos Aires: Ediciones RLFM, 2021, p. 91.
- 60. CASSIODORO. Institutiones. Introdução às letras divinas e seculares, op. cit., p. 149.
- 61. CASSIODORO. Institutiones. Introdução às letras divinas e seculares, op. cit., p. 153.
- 62. CASSIODORO. Institutiones. Introdução às letras divinas e seculares, op. cit., p. 167.
- 63. CASSIODORO. Institutiones. Introdução às letras divinas e seculares, op. cit., p. 197.
- 64. CASSIODORO. Institutiones. Introdução às letras divinas e seculares, op. cit., p. 211.
- 65. CASSIODORO. Institutiones. Introdução às letras divinas e seculares, op. cit., p. 219-221.
- 66. CASSIODORO. Institutiones. Introdução às letras divinas e seculares, op. cit., p. 223.
- 67. FLASCH, Kurt. El pensament filosòfic a l’Edat Mitjana, op. cit., p. 138.
- 68. PREVITÉ-ORTON, C. W. Historia del Mundo en la Edad Media. Desde el Bajo Imperio Romano hasta la disolución del Imperio Carolingio. Tomo I. Barcelona: Editorial Ramon Sopena, S. A., 1967, p. 404.
- 69. M. COLOMBÁS, García. La tradición benedictina. Ensayo histórico II. Los siglos VI y VII. Zamora: Ediciones Monte Casino, 1990, p. 418.
- 70. “...Con el libro, o sea con la cultura, el mismo San Benito, de quien tantos monasterios tomaron nombre y vigor, salvó con providencial solicitud, en el momento en que el patrimonio humanista estaba desperdigándose, la tradición clásica de los antiguos, transmitiéndola intacta a la posteridad y restaurando el culto del saber (...) Por lo tanto, a propuesta de la Sagrada Congregación de Ritos, tras atenta consideración, en virtud de Nuestro poder apostólico, con el presente Breve y para siempre constituimos y proclamamos a San Benito Abad celestial Patrono principal de toda Europa, con todos los honores y privilegios litúrgicos que de derecho corresponden a los Protectores primarios. Y ello contra cualquier disposición en contrario (os grifos são meus).” – CARTA APOSTÓLICA PACIS NUNTIUS DEL SUMO PONTÍFICE PABLO VI. PROCLAMACIÓN DE SAN BENITO COMO PATRONO DE EUROPA. PARA RECUERDO PERPETUO.
Ideia, aliás, da qual Jacques Le Goff (1924-2014) discorda. Para o medievalista francês, os fundadores culturais da Idade Média foram Boécio (c. 477-524), Cassiodoro (c.485-585), Isidoro de Sevilha (c. 570-636), Beda, o Venerável (c. 672-735) e o papa Gregório Magno (c. 540-604). Ver LE GOFF, Jacques. ¿Nació Europa en la Edad Media? Barcelona: Crítica, 2003, p. 17-18. - 71. SÃO BENTO DE NÚRSIA (480-547). Regra de São Bento (c. 530) (trad.: Dom João Evangelista Enout, OSB).
- 72. M. COLOMBÁS, García. La tradición benedictina. Ensayo histórico II. Los siglos VI y VII, op. cit., p. 24.
- 73. SÃO GREGÓRIO MAGNO. Virtudes e milagres. Os Diálogos de São Gregório Magno incluindo a Vida de São Bento. Curitiba: Editora Instituto Santo Atanásio, 2023, p. 180 (Diálogo II, cap. XXXVI. A regra dos monges escrita por São Bento).
- 74. NUNES, Ruy Afonso da Costa. História da Educação na Idade Média. Campinas, SP: Kírion, 2018.
- 75. SÃO BENTO DE NÚRSIA (480-547). Regra de São Bento (c. 530) (trad.: Dom João Evangelista Enout, OSB).
- 76. Expressão do séc. XIX. Ver MEEUWS, Marie-Benoît D., OSB. “Ora et Labora: devise bénédictine?”. In: Collectanea Cisterciensia, vol. 54, 1992, p. 193-219.
- 77. BARBIER, Frédéric. História das Bibliotecas. De Alexandria às Bibliotecas Virtuais, op. cit., p. 81.
- 78. LECLERCQ, Jean. O amor às letras e o desejo de Deus. Iniciação aos autores monásticos da Idade Média. São Paulo: Paulus, 2012, p. 21.
- 79. NICOLAU DE CUSA. A Douta Ignorância (trad., introd. e notas: João Maria André). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2012.
- 80. “...para os monges em seu conjunto, o primeiro instrumento das boas obras é um texto, pois é ele que permite a leitura meditada da Palavra de Deus (...) Assim, a escola monástica contém simultaneamente a escola clássica, em razão do método tradicional da grammatica, e a escola rabínica, em razão do texto sobre o qual se exerce em parte esse método.” – LECLERCQ, Jean. O amor às letras e o desejo de Deus. Iniciação aos autores monásticos da Idade Média, op. cit., p. 27 e 28.
- 81. BARBIER, Frédéric. As paisagens da escrita e do livro. Cotia, SP: Ateliê Editorial; São Paulo: Edições Sesc São Paulo: 2023, p. 11.
- 82. “...a metáfora do mosteiro como escola continuará a impor-se também na literatura religiosa da plena Idade Média.” – BENVENUTI, Ana. “A instrução e os novos centros de cultura”. In: ECO, Umberto (org.). Idade Média. Volume I. Bárbaros, Cristãos e Muçulmanos. Lisboa: D. Quixote, 2014, p. 152.
- 83. FLASCH, Kurt. El pensament filosòfic a l’Edat Mitjana, op. cit., p. 139.
- 84. BARBIER, Frédéric. História das Bibliotecas. De Alexandria às Bibliotecas Virtuais, op. cit., p. 82.
- 85. Citado em PAUL, Jacques. Historia intelectual del Occidente medieval. Madrid: Ediciones Cátedra, 2003, p. 139.
- 86. DÍAS Y DÍAS, Manuel. “Introducción General”. In: SAN ISIDORO DE SEVILLA. Etimologías I (texto latino, versión española y notas por José Oroz Reta y Manuel Antonio Marcos Casquero). Madrid: Biblioteca de Autores Cristianos (BAC), MM, p. 105.
- 87. DÍAS Y DÍAS, Manuel. “Introducción General”. In: SAN ISIDORO DE SEVILLA. Etimologías I (texto latino, versión española y notas por José Oroz Reta y Manuel Antonio Marcos Casquero), op. cit., p. 193-194.
- 88. “Essa primeira enciclopédia do mundo medieval, que faz de Isidoro o ‘pai fundador’ do gênero, deve ser considerada como uma obra científica, na medida em que sua composição obedece a regras definidas, a uma metodologia precisa e a um sistema de organização rigoroso...” – RIBÉMONT, Bernard. “Isidoro de Sevilha. Cerca de 560-636”. In: LE GOFF, Jacques (dir.). Homens e mulheres da Idade Média. São Paulo: Estação Liberdade, 2013, p. 64.
- 89. SAN ISIDORO DE SEVILLA. Etimologías I (texto latino, versión española y notas por José Oroz Reta y Manuel Antonio Marcos Casquero). Madrid: Biblioteca de Autores Cristianos (BAC), MM, p. 576-579 (Livro VI, 3).
Traduzi do espanhol, mas cotejando com o texto latino (pois a tradução espanhola é bastante livre). - 90. “Essa conexão ativa entre ouvinte e leitor era coisa nova no mundo do Oriente Próximo antigo (...) as procissões do judaísmo têm em seu centro devocional um rolo de texto (...) O desempenho de Esdras leva a austeridade de um código legal – a Torá – ao domínio do teatro público coletivo: um espetáculo santo (...) No século XVII, Baruch Espinosa, inaugurando a crítica bíblica ao insistir que o Pentateuco era um documento histórico escrito por autores humanos muitas gerações depois dos fatos narrados, apontou Esdras como o candidato mais provável ao papel de autor principal.” – SCHAMA, Simon. A história dos judeus. À procura das palavras – 1000 a.C.-1492 d.C. São Paulo: Companhia das Letras, 2015, p. 56-58.
- 91. Para Caio Asínio Polião (76-4 a.C.), ver nota correspondente.
- 92. SAN ISIDORO DE SEVILLA. Etimologías I (texto latino, versión española y notas por José Oroz Reta y Manuel Antonio Marcos Casquero), op. cit., p. 580-581 (Livro VI, 5-6). Do mesmo modo, traduzi do espanhol, mas cotejando com o texto latino (pois a tradução espanhola é bastante livre).
- 93. EUSEBIO DE CESAREA. Historia Eclesiastica II (texto, versión española, introducción y notas por Argimiro Velasco-Delgado, O.P.). Madrid: Biblioteca de Autores Cristianos (BAC), MCMXCVII, p. 403 (VI, 32, 3).
- 94. EUSEBIO DE CESAREA. Historia Eclesiastica II, op. cit., p. 387 (VI, 20, 1).
“Por volta do ano 132, rebentou na Judeia uma rebelião que, segundo autores como Dião Cássio, exigiu 50 mil soldados e três anos para ser reprimida (...) Não temos nesse caso um Josefo para nos dar sequer uma ideia aproximada de como começou a revolta ou quais suas causas imediatas, ainda que a criação, por Adriano, de uma cidade a que ele chamou de Élida Capitolina no local da Jerusalém destruída, quase com certeza foi a maior provocação.” – SCHAMA, Simon. A história dos judeus. À procura das palavras – 1000 a.C.-1492 d.C., op. cit., p. 196. - 95. SAN ISIDORO DE SEVILLA. Etimologías I (texto latino, versión española y notas por José Oroz Reta y Manuel Antonio Marcos Casquero), op. cit., p. 276-277 (Livro I, 2).
- 96. “Para oferecer um exemplo de sua síntese etimológica, Isidoro se valeu do poeta romano Virgílio (70-19 a. C.). A seguir, o bispo explicou cada uma das sete principais variantes alegóricas. Por exemplo, o carientismo é um tropo que ocorre quando se atenua a dureza de uma expressão (I, 37, 27); sarcasmo, um desprezo hostil, cheio de amargura (I, 37, 29); astismo, o contrário do sarcasmo: uma urbanidade sem iracúndia (I, 37, 30)!” – SILVA, Matheus Corassa da; COSTA, Ricardo da. “A Alegoria. Do mundo clássico ao Barroco”. In: OSWALDO IBARRA, César; LÉRTORA MENDONZA, Celina (coords.). XVIII Congreso Latinoamericano de Filosofía Medieval – Respondiendo a los Retos del Siglo XXI desde la Filosofía Medieval. Actas, op. cit., p. 93.
- 97. “Mas você é tão insensato que, durante todo o seu discurso, você esteve em desacordo consigo próprio, pois disse coisas que não só não tinham coerência entre si, mas que eram inconsistentes e contraditórias, de modo que não havia tanta discórdia comigo como quanto contigo (Tam autem erat excors, ut tota in oratione tua tecum ipse pugnares, non modo non cohaerentia inter se diceres, sed maxime disiuncta atque contraria, ut non tanta mecum quanta tibi tecum esset contentio).” – M. TVLLI CICERONIS IN M. ANTONIVM ORATIO PHILIPPICA SECVNDA, XVIII, 8. E também CICERO. Philippics 2 (translated by C. D. Yonge). In: LEXUNDRIA.
- 98. Etimologias, II, 1, 1-2; 3, 1, e 16, 2. Citado em COSTA, Ricardo da. “A Retórica na Antiguidade e na Idade Média”. In: Revista Trans/form/ação v. 42, n. 4, 2019, Edição Especial, p. 371.
- 99. “Então falou Jesus às turbas e aos seus discípulos, dizendo: Sobre a cadeira de Moisés sentaram-se os escribas e os fariseus. Observai pois, e fazei tudo o que eles vos disserem; mas não imiteis as suas acções, porque dizem e não fazem. Atam cargas pesadas e impossíveis de levar, e as põem sobre os ombros dos (outros) homens, mas nem com um dedo as querem mover. E fazem todas as suas obras para serem vistos pelos homens; por isso trazem mais largas filatérias, e mais compridas as franjas (dos vestidos). E gostam de ter nos banquetes os primeiros lugares, e nas sinagogas as primeiras cadeiras, e as saudações na praça, e serem chamados mestres pelos homens. Mas vós não queirais ser chamados mestres, porque um só é o vosso Mestre, e vós sois todos irmãos. E a ninguém chameis vosso pai sobre a terra, porque um só é o vosso Pai, que está nos céus. Nem sejais chamados mestres, porque um só é o vosso Mestre, o Cristo. O que entre vós for o maior, será vosso servo. E aquele que se exaltar será humilhado, e o que se humilhar será exaltado. Mas, ai de vós, escribas e fariseus hipócritas! que fechais o reino dos céus aos homens, pois nem vós entrais, nem deixais que entrem os que estão para entrar. Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas! que devorais as casas das viúvas, a pretexto de longas orações; por isto sereis julgados mais severamente. Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas! que rodeais o mar e a terra para fazerdes um prosélito; e, depois de o terdes feito, o tornais duas vezes mais filho do inferno do que vós.” – Evangelho de Jesus Cristo segundo S. Mateus, cap. XXIII, 1-15. In: Bíblia Sagrada. Novo Testamento (traduzido da Vulgata e comentado pelo Pe. Matos Soares). Braga, Vila Nova de Famalicão: Grandes oficinas gráficas Minerva de Gaspar Pinto de Sousa, 1950, p. 56-57.
- 100. CABRERA VALVERDE, Jorge Mario. “San Isidoro de Sevilla: puente entre la Antigüedad y la Edad Media”. In: Revista de Filología y Lingüística de la Universidad de Costa Rica, vol. XXII (2), 1996, p. 203-213.
- 101. GARCIA-VILLOSLADA, Ricardo. Historia de la Iglesia Católica II. La cristiandad en el mundo europeo y feudal. Madrid: BAC, MMIII, p. 38.
- 102. BEDA EL VENERABLE. Historia Eclesiástica del Pueblo de los Anglos (ed. de José Luis Moralejo). Madrid: Ediciones Akal, 2013, p. 76 (Libro I, 23).
- 103. LEITHART, Peter. Em defesa de Constantino. O crepúsculo de um Império e a aurora da cristandade. Brasília, DF: Editora Monergismo, 2020, p. 63.
- 104. LE GOFF, Jacques. A civilização do ocidente medieval. Volume II. Lisboa: Editorial Estampa, 1984, p. 271.
- 105. MITRE FERNÁNDEZ, Emilio. “Emperadores, papas, patriarcas y missioneros hasta finales del siglo IX”. In: MITRE FERNÁNEZ, Emilio (coord.). Historia del cristianismo II. El mundo medieval. Madrid: Editorial Trota, S.A., 2004, p. 80.
- 106. Mundeburdio – Nos reinos romano-bárbaros, a alta proteção do rei (verbum regis, sermo regis). Muito semelhante ao auxilii latio do imperador romano, consistia no direito de tutela aos que dele se beneficiavam por lei, como viúvas, órfãos, pobres e estrangeiros. Ver “Mundeburdio”. In: Treccani. Enciclopedia online.
- 107. “Cum vero Hessorum iam multi, catholica fide subditi ac septiformis spiritus gratia confirmati, manus inspositionem acciperunt, et quidem, nondum animo confortati, intermeratae fidei documenta integre perceipere rennuerunt, alii etiam lignis et fontibus clanculo, alii autem aperte sacrificabant; alii vero aruspicia et divinationes, prestigia atque icantationes occulte, alii quidem manifeste exercebant; alii quippe auguria et auspicia intendebant diversosque sacrificandi ritus incoluerunt; alii etiam, quibus mens sanior inerat, omni abeicta gentilitatis profantione, nihil horum commisserunt. Quorum consultu atque consilio roborem quendam mirae magnitudinis, qui prisco paganorum vocabulo appellatur robor Iobis, in loco qui dicitur Gaesmere, servis Dei secum adstantibus succidere temptavit. Cumque, mentis constantia confortatus, arborem succidisset, – magna quippe aderat copia paganorum, qui et inimicum deorum suorum intra se diligentissime devotabant, – sed ad modicum quidem arbore praeciso, confestim inmensa roboris moles, divino desuper flatu exagitata, palmitum confracto culmine, corruit et quasi superni nutus solatio in quattuor etiam partes disrupta est, et quattuor ingentis magnitudinis aequali longitudine trunci absque fratrum labore adstantium apparuerunt. Quo viso, prius devotantes pagani etiam versa vice benedictionem Domino, pristina abiecta maledictione, credentes reddiderunt. Tunc autem summae sanctitatis antistes, consilio inito cum fratribus, ligneum ex supradictae arboris metallo oratorium construxit eamque in honore sancti Petri apostoli dedicavit.” – LEVISON, Wilhelm. Vitae Sancti Bonifatii archiepiscopi moguntini. Monumenta Germaniæ historica: Scriptores rerum germanicorum in usum scholarum separatim editi. Hannover and Leipzig: Hahn, 1905.
Tradução inglesa: The life of Saint Boniface by Willibald (translated into english for teh first time with introduction and notes: George W. Robinson). Cambridge: Harvard University Press, 1916, p. 63-64. - 108. “A repressão do paganismo na Germânia foi espetacular: o próprio Bonifácio derrubou, próximo a Fritzlar, o carvalho do deus Thor que sustentava a abóbada celeste e dele retirou a madeira necessária para a construção de uma capela.” – FAVIER, Jean. Carlos Magno. São Paulo: Estação Liberdade, 2004, p. 121.
- 109. “A atividade missioneira, científica e cultural deste centro religioso – basta recordar a Rábano Mauro, Walafrido Estrabão, Servato Lupo – foi de incalculável transcendência para a história do povo alemão.” – GARCIA-VILLOSLADA, Ricardo. Historia de la Iglesia Católica II. La cristiandad en el mundo europeo y feudal, op. cit., p. 42-43.
- 110. BARBIER, Frédéric. História das Bibliotecas. De Alexandria às Bibliotecas Virtuais, op. cit., p. 87.
- 111. “Em novembro, em Saint-Denis, os bispos do reino procederam a esse ato litúrgico até então ignorado no reino franco: a unção real. Sem dúvida, o arcebispo Bonifácio estava entre esses bispos. Bonifácio é então o mais proeminente dos bispos do rei franco. É provável que ele próprio tenha vertido os santos óleos.” – FAVIER, Jean. Carlos Magno, op. cit., p. 121.
RAIOLA, Marcela. “A Igreja de Roma e o poder temporal dos papas”. In: ECO, Umberto (dir.). Idade Média. Volume I. Bárbaros, Cristãos e Muçulmanos. Lisboa: D. Quixote, 2014, p. 142. - 112. GARCIA-VILLOSLADA, Ricardo. Historia de la Iglesia Católica II. La cristiandad en el mundo europeo y feudal, op. cit., p. 43.
- 113. “Os mosteiros de Bonifácio não só eram foco de fé cristã, mas também de cultura no mais amplo sentido do vocábulo. De cultura literária, especialmente. A Gramática que compôs tinha como objetivo desbastar as mentes dos pequenos oblatos (...). J. Leclerq, após as pegadas de P. Lehmann e W. Levison, analisou a gramática de Bonifácio, sua teoria de arte literária aplicada aos mosteiros, que considera – com razão – como um dos instrumentos de seu apostolado, um de seus meios, e não o menos importante, com o qual pôde implantar nas regiões por ele evangelizadas a fé e a cultura da Igreja.” – M. COLOMBÁS, García. La Tradición Benedictina. Ensayo histórico. III. Los siglos VIII-XI. Zamora: Ediciones Monte Casino, 1991, p. 66-67.
Especialmente para o caso do mosteiro de Fulda, ver RAAIJMAKERS, Janneke. The Making of the Monastic Community of Fulda, c. 744 - c. 900. Cambridge University Press, 2012. - 114. DAWSON, Christopher. Criação do Ocidente. A Religião e a Civilização Medieval. São Paulo: É Realizações, 2016, p. 90-92.
- 115. REYNOLDS, L. D.; WILSON, N. G. Scribes and Scholars: A Guide to the Transmission of Greek and Latin Literature. Oxford University Press, 2013, p. 68.