Polindo
Los Libros de Rocinante 16
Ricardo da COSTA
Resenha publicada em Signum 7 - Revista da Abrem.
Associação Brasileira de Estudos Medievais.
São Paulo: USP, 2005, p. 327-336
(ISSN 1516-6295).
Gravado da edição toledana da História do invencível cavaleiro Dom Polindo, de 1526, em J. MINDLIN, Uma vida entre livros. Reencontros com o tempo. São Paulo, Edusp/Cia. das Letras, 1997, p. 159.
Los Libros de Rocinante 16. Alcalá de Henares: Centro de Estudios Cervantinos, 2003 (ed. de Manuel Calderón Calderón), 316p.
Vagar. Errar. Percorrer. De bom grado, o jovem cavaleiro abandonava suas raízes familiares e sociais para descobrir o mundo, para conhecer as maravilhas da vida, para ver pessoas diferentes e viver as aventuras inerentes ao seu grupo social, enfim, para combater, para lutar, para crescer. Importante, distinto, ele se considerava melhor, diferente dos demais. Superior. Altivo. Primeiro cavaleiro, depoiscavalheiro: muito cedo, ele havia recebido uma educação diferenciada na casa de outrem.1
Por isso, além de treinado na arte da guerra e, portanto, muito violento, após seu progressivo controle e domesticação de suas pulsões levada a cabo pela Igreja, ele também foi lapidado carinhosa, generosa e amorosamente pela senhora de seu senhor, educado por ela para ser cortês com as damas, em suma, foi polido para saber amar.2 Assim, refinado, porém ainda rude, gentil, mas violento, trovador e guerreiro, católico e matador, ele era tanto capaz de manejar o alaúde e a espada, de conduzir o cavalo e de jogar xadrez, de se comportar bem à mesa com os talheres, na festa com as damas, como também tilintar sua espada no campo de batalha, diante da morte.3
Em resumo, esse era o ideal cavaleiresco forjado no longínquo século XII e lentamente maturado pela sociedade feudal do ocidente medieval. Sociedade de corte, de gestos civilizados entre si e pulverizada em centenas de castelos espalhados desde a Espanha até o Sacro Império. Nessa parcela ínfima do tecido social que o historiador pode observar, esses homens e mulheres desenvolveram um estilo de vida que marcaria indelevelmente a história do ocidente até os dias de hoje. De um lado, com o convívio social. De outro, com o registro dessa forma de comportamento nos romances e nas gestas, na poesia e na prosa.
Contudo, logo, logo, esse ideal foi confrontado com a realidade e por ela alterado, degradado, transformado. Pelos homens, pela estupidez humana. E à medida que se expandia aquele novo tipo de comportamento para terras cada vez mais distantes, seus registros escritos burilavam cada vez mais o ideal – obviamente se distanciando do real. Assim, o imaginário crescia, ganhava corpo na literatura. Com o passar do tempo, cada vez mais aqueles romances se distanciavam da realidade. E com o entardecer da Idade Média, a tradição literária cavaleiresca – em minha consideração, calcada inicialmente em cenas vívidas e muito bem vividas, desde Chrétien de Troyes – perdeu definitivamente seu contato com a realidade.4
Esse fenômeno de distanciamento do real dos romances de cavalaria criou uma literatura que, em minha consideração, é um reflexo distorcido da realidade. Esse processo textual dos romances cavaleirescos é um pouco semelhante ao que ocorreu com os tratados políticos que tratavam do ideal de unidade, de Império, da christianitas, fenômeno já observado pelo Professor José Antônio de C. R. de Souza.5
Em contrapartida, esse distanciamento do real proporcionou cada vez mais um “sucesso” literário. E assim chegamos ao século XVI, século em que desabrocharam as novelas de cavalarias castelhanas.6 Obras caras, de tiragem limitada, elas têm sido de difícil localização pelos especialistas. Dessa forma, o trabalho levado a cabo pelo Centro de Estudios Cervantinos merece nosso louvor. Mais especificamente, sua coleção intitulada Los Libros de Rocinante tem justamente o objetivo de oferecer edições de livros de cavalarias castelhanos seiscentistas, impressos ou manuscritos. Em seu volume 16 foi lançada a obra Polindo, publicada uma única vez em Toledo, em 1526, obra que agora resenhamos.7
Em seu Prólogo, o desconhecido autor de Polindo afirma que se propôs escrever a obra para combater o ócio e a preguiça (p. 03). São 101 capítulos divididos em cinco partes e uma amplificação final. A partir de sua história familiar e os augúrios de seu destino heróico (parte 1), a narrativa navega desde a viagem de Polindo até a distante corte da Macedônia para se encontrar com seu amor, a infanta Belísia (parte 2), passando por sua educação cavaleiresca e nomeação de capitão-geral do exército da Macedônia (parte 3), suas façanhas cavaleirescas, bem como dos cavaleiros que o acompanharam em suas aventuras e a doença de Belísia (parte 4), chegando, por fim, a seu sonho e a cura de sua amada Belísia (parte 5).
A presente edição dos Libros de Rocinante possui um excelente texto introdutório, de autoria de Manuel Calderón Calderón (p. IX-XXXIX). Após uma breve apresentação do conteúdo da obra – seguida de quadros muito didáticos –, o especialista divide seu texto discorrendo-o pelos temas mais significativos desenvolvidos na obra, estrutura que seguiremos em nossa resenha. Por exemplo, Calderón Calderón assinala o valor estético e moral da guerra ao longo das narrativas de D. Polindo, bem como sua intrepidez e coragem. Citemos uma passagem de Polindo sobre esse tema:
Assim que todos os cavaleiros estavam no campo, cada um se olhou para ver se estava bem colocado; cada um abraçou bem seu escudo, pôs sua lança em riste e, muito rapidamente, com seus cavalos, uns foram em direção aos outros. Dom Polindo se encontrou com o gigante Maurião, quem o golpeou em seu escudo, sem movê-lo da sela. Então, Dom Polindo o golpeou tão bravamente que, rompendo-lhe as armas, meteu a lança em seu corpo, transpassando-o uma grande braçada. Ele caiu morto no solo (...).
E começa uma cruel batalha, pois era a mais formosa que existiu no mundo, que nunca viu nada igual. Nessa batalha estava a flor de toda a cavalaria que, naquele momento, havia na rotundidade do mundo (a tradução é nossa).8
“Flor da cavalaria” porque era (ou deveria ser) composta de uma elite de jovens afáveis, mas também porque saía para esse colorido combate escatológico sempre na primavera. Primavera, o tempo mais propício para a guerra e para o amor: enquanto as flores desabrochavam e a natureza renascia do inverno hibernante, os poetas e trovadores, imbuídos desse espírito cavaleiresco, anunciavam a chegada da vida, momento ideal para o combate.9 Cobrindo-se de cores, ornamentando-se de flores, o mundo conspirava a favor de deles.
Polindo possui essa clara visão estética do mundo. Seus códigos cavaleirescos são encimados pelo amor cortês, mas não exatamente o amor cortês medieval e profano, com seus tribunais femininos que julgavam casos de adultério conhecidos por todos das cortes.10 O amor cavaleiresco proposto pelo autor já é um amor transformado pela mão do cristianismo, incompatível com o adultério; não é mais o amor medieval, pois é um amor destrutivo, feiticeiro como o amor da sábia Leonisa por Polindo:
Dom Polindo esteve três dias naquele castelo da sábia Leonisa, muito a seu prazer. E cada dia aumentava a dor de Leonisa ao ver a formosura de Dom Polindo; dias e noites seu inflamado coração passava em contínuos suspiros (...) E estando assim, pensou em se aproveitar de suas artes, e logo fez seus encantamentos na sala onde Dom Polindo estava (...)
Entrando no quarto, logo (Dom Polindo) foi encantado. Sem acordo algum, com os braços abertos, ele foi para Leonisa, que o recebeu com muita alegria. Como Dom Polindo pensava em sua senhora, assim a tomou entre seus braços e fez com ela sua vontade. Leonisa tornou-se mulher e, com muito prazer, se despojou de seus panos. Dom Polindo fez o mesmo, pois não sabia o que fazia, já que estava fora de seu sentido (a tradução é nossa).11
Assim, o amor adúltero só é permitido em Polindo através dos encantamentos das mulheres, das sábias amantes detentoras dos segredos dos artifícios amorosos. Em contrapartida, o amor verdadeiro de Polindo pela princesa Belísia serve como agente civilizador, motivo de educação, de contenção e de amadurecimento pessoal.
Por exemplo, esses dois amantes, “feridos pela flecha do Deus do Amor”, se encontram em um jardim, locus amoenus, local paradisíaco chamado de Jardim do Consolo. Ali os amantes se consolam, trocando carícias e dizendo juras de amor. Nele, os dois ficam juntos, envolvidos por roseirais que se mesclam a diversas árvores, exóticos e aromados ciprestes, formosas palmeiras, oliveiras, frondosos plátanos, odorantes jacintos e nardos, todos “criados pela mão de Deus”.12 Naquele espaço natural conspiratório, os dois se declaram, trocam “doces beijos mesclados com amorosos abraços” e tomam as mãos por esposos.13
Essas qualidades corteses, necessárias ao bom cavaleiro, tinham um ponto nevrálgico e paradoxal: o comportamento social do guerreiro, talvez, de todos, o aspecto mais distante da realidade. Pois desde cedo os cavaleiros faziam justamente o contrário do que propugnava a Igreja: ao invés de proteger as viúvas, eles as raptavam, as estupravam; em vez de defender as igrejas, muitos invadiam suas terras – especialmente para se embriagarem nas adegas cheias de vinho. Desde muito isso estava claro, especialmente quando dos juramentos feitos na Paz de Deus, movimento civilizador promovido pelos clérigos a partir do final do século XI.14
Ao lado do amor e da gentileza, da cortesia e da afabilidade, a violência e a morte. Seguindo pari passu essa ambivalência dos medievais, o texto de Polindo trata com muita insistência das justas e dos torneios, os famosos encontros cavaleirescos em que os cavaleiros mediam suas forças, treinavam para a guerra, ganhavam, com suas vitórias, os tão necessários cavalos e armas (cada vez mais caras) e, principalmente, liberavam suas pulsões agressivas em um ambiente viril de camaradagem.
Em seu prefácio, o professor Calderón Calderón afirma que até o século XV os combates provocavam poucas mortes entre os cavaleiros, pois o propósito não era matar o adversário, e sim capturá-lo para ganhar honra ou mesmo o botim (p. XIX). Embora, de fato, fosse esse o objetivo dos torneios, contudo, era humana e simplesmente impossível para um homem daqueles tempos, no auge de sua potência agressiva e produção hormonal, se lembrar de qualquer código cortês quando recebia um golpe duro no corpo em meio a um combate, mesmo que fosse um exercício.
Para comprovar esse morticínio festivo e brilhante dos torneios, basta apenas uma rápida olhada nas iluminuras medievais – como as do Codex Manesse15 – ou mesmo nos sermões dos pregadores – como um de Jacques Vitry16– para perceber que a realidade não era tão asséptica quanto idealiza Calderón Calderón.
No entanto, como Polindo tem pouco contato com a realidade, como disse antes, as cenas literárias dos torneios são corteses, gentis e cavaleirescas, como todo bom ideal o requer. Por exemplo, no capítulo XXX (p. 87), Dom Polindo parte com seus homens em direção à corte do rei da Macedônia. No caminho, a hoste passa pelo reino de Moria e chega à grande e formosa cidade de Patras. Ali estava o rei hospedado.
Naquela manhã, ele saíra para caçar em uma floresta próxima que era muito cerrada. Por sorte, Dom Polindo passou no lugar onde eles estavam estacionados. A lareira tinha cinco tendas armadas, do rei e de seus cavaleiros. Na entrada de cada tenda, havia um cavalo, um escudo e muitas lanças. Esse era um sinal que significava que o cavaleiro da tenda convidava a quem passasse por ali a se bater com ele em uma justa:
Um cavaleiro daqueles rogou a Dom Polindo que lhe desse a primeira justa. Ele se lhe outorgou. Logo saiu um cavaleiro da tenda, e ele foi recebê-lo.17 E trocaram tão grandes golpes que as lanças se quebraram em pequenos pedaços. No encontrar dos cavalos, o cavaleiro de Dom Polindo teve uma grande queda no solo, mas como tinha bom coração“18, logo se levantou. Pediu então ao cavaleiro da tenda que, como havia sido vencido na lança, fosse provado na espada. “– Cavaleiro, eu não pedi uma batalha com a espada”, disse o cavaleiro da tenda, “mas deixai-me provar com vossos companheiros e eu combaterei com vós se os vencerdes com a espada.”
E assim, logo tomou outra lança e chamou outro para a justa. E logo saiu outro e um foi rapidamente ao encontro do outro com seus cavalos. O cavaleiro de Dom Polindo rompeu sua lança no cavaleiro da tenda, o qual deu um golpe tão grande nele que levemente o jogou na terra. Dom Polindo julgou o cavaleiro como tendo uma grande força.19
Além dos torneios, do amor, da educação cortês, dos cavaleiros andantes, o autor de Dom Polindo ainda se vale de material mitológico: algumas passagens da Odisséia (cap. 28 e 95), Hércules e Heitor também surgem no teatro da corte de Carmolique (cap. 5). Para completar o ambiente mágico e fantástico de suas aventuras, o ciclo arturiano ecoa generosamente em suas páginas quando do amor adúltero da rainha da Macedônia, oferecendo assim um ambiente mágico que coloca a obra bem mais próxima da sociedade medieval e cortesã que da renascentista e burguesa, como bem sugere Calderón Calderón (p. XXXIII).
Haveria muito, muito mais a comentar, a citar e a explorar para instigar o leitor à leitura de Dom Polindo. No entanto, o espaço nos obriga à concisão. E é sempre melhor um gosto de “quero mais” que o fastio do excesso. Assim, concluímos.
*
Forjadoras de mitos, criadoras de modos de expressão e convivência social, divulgadoras de novas formas de sociabilidade, de elegância, enfim, de idealizados modelos estéticos de conduta para a vida nobre, as novelas espanholas de cavalaria como Dom Polindo são um exemplo histórico de como a literatura de uma época pode conduzir e instigar os homens a novas formas de afeto e de comportamento. Seu súbito fim, como muito bem disse Mario Vargas Llosa, reprimiu o real imaginário, substituindo-o pelo real objetivo renascentista, muito menos generoso, muito mais árido, muito menos fértil.20
Infelizmente, essa substituição literária, que teve influências na vida real, pertence à longa duração: hoje ainda observamos esse processo de esvaziamento estético da vida. Contudo, momentos fugazes e fruitivos como a leitura de Dom Polindo podem manter acesa a chama da prosa poética, estilo tão ferido pelos golpes da insensível pós-modernidade. Despedimo-nos com as palavras finais de nosso autor:
Finis
Senhor Jesus Cristo, em quem tenho esperança, embora indigno e pecador, rogo que me deis graça para que vos sirva, e que meu pobre engenho, fértil e abundante de dificuldades, não seja reprovado. Mas sabendo que sempre serei julgado de acordo com o desejo que me dispus a fazer essa obra, feita para que o tempo que estivesse desocupado não desse folga a meu espírito para entrar a preguiça, quis fechar as portas com as fortes correntes do estudo. Com isso, suavizarei os detratores que costumam falar mal. E, certificados que o que nesse primeiro não se possa corrigir, no segundo, que já está feito, vereis o melhor estilo que traz, com o qual os leitores se distraem, e aos quais peço ajuda para ocultar minhas faltas.21
Notas
- 1. Uma das obras mais notáveis produzidas sobre o tema é a de G. DUBY, Guilherme Marechal, ou o melhor cavaleiro do mundo. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1987.
- 2. Sobre essas questões envolvendo o amor cortês, indicamos nosso texto, R. da COSTA, e P. L. COUTINHO, “Entre a Pintura e a Poesia: o nascimento do Amor e a elevação da Condição Feminina na Idade Média”, em N. GUGLIELMI (dir.), Apuntes sobre familia, matrimonio y sexualidad en la Edad Media. Colección Fuentes y Estudios Medievales 12, Mar del Plata, GIEM (Grupo de Investigaciones y Estudios Medievales), Universidad Nacional de Mar del Plata (UNMdP), diciembre de 2003, pp. 4-28.
- 3. Essa contradição medieval inerente a tudo e a todos é muito bem sintetizada pela historiadora María Rosa Menocal, em sua obra sobre a Península Ibérica medieval e islâmica, O ornamento do mundo (Rio de Janeiro, Editora Record, 2004, p. 26).
- 4. Não custa relembrar as sábias palavras do grande mestre e medievalista português José Mattoso: “O cavaleiro que parte sozinho ou em bando, com ou sem escudeiro, à procura de aventuras, está muito longe de ser uma ficção literária. Corresponde à realidade viva que se manteve durante longos anos na Idade Média ocidental, e que muitos outros romances de cavalaria idealizaram, desempenhando a função social de servirem de exortação e de suporte a uma manifestação fundamental do comportamento aristocrático.” – J. MATTOSO, “Cavaleiros andantes. A ficção e a realidade”, em A nobreza medieval portuguesa. A família e o Poder, Lisboa, Editorial Estampa, 1987, p. 356.
- 5. J. A. de C. R. de SOUZA e J. M. BARBOSA, O Reino de Deus e o Reino dos Homens. As relações entre os poderes espiritual e temporal na Baixa Idade Média, Porto Alegre, EDIPUCRS, 1997, p. 149.
- 6. Por exemplo, Don Belianís de Grecia (1547-1579), El Caballero del Febo (1555) e Don Olivante de Laura (1564). Ver M. F. SÁNCHEZ-CARNERERO, Los Libros de Caballerías.
- 7. Curiosamente, a base da edição do Polindo feita pelo Centro de Estudios Cervantinos foi um exemplar da Biblioteca José Mindlin, no Rio de Janeiro (Ver J. MINDLIN, Uma vida entre livros. Reencontros com o tempo. São Paulo, Edusp/Cia. das Letras, 1997, p. 159). O Velho Mundo vindo ao Novo em busca de seu passado...
- 8. “Así que ya todos los cavalleros estavan en el campo, cada uno se mirava si estaba bien puesto. E cada uno embraçó bien su escudo y enristró su lança. E vanse los unos para los otros al más correr de sus cavallos. Don Polindo se encontró con el gigante Maurión, el cual lo encontró en el escudo e no le movió de la silla. Mas don Polindo lo encontró tan bravamente que, falsándole las armas, le metió la lança por el cuerpo, que le passó de la otra una gran braçada. E cayó muerto en el suelo (...) E comiénçase una batalla cruel, porque era la más hermosa que en el mundo fue ni jamás se vido. Porque en aquesta batalla era la flor de toda la cavallería que, a la sazón, en aquel tiempo havía en la redondez del mundo.” – Don Polindo, cap. xxxiiii, p. 99-100. Todas as traduções dessa resenha foram gentilmente revistas e corrigidas pelo Prof. Jordi Pardo Pastor (ARCHIVIVM LVLLIANVM de la Universitat Autònoma de Barcelona).
- 9. R. da COSTA, “Amor e Crime, Castigo e Redenção na Glória da Cruzada de Reconquista: Afonso VIII de Castela nas batalhas de Alarcos (1195) e Las Navas de Tolosa (1212)”, em M. A. M. de OLIVEIRA (org.), Guerra e Imigrações, Campo Grande, MS, Editora da UFMS, 2004, pp. 73-94.
- 10. Os incríveis tribunais femininos medievais – durante muito tempo desacreditados pela erudição – são descritos pelo cronista do século XII, André Capelão, em seu Tratado do Amor Cortês (São Paulo, Martins Fontes, 2000, p. 233-248).
- 11. “Don Polindo estuvo tres días en aquel castillo de la sabia Leonisa mucho a su plazer. E cada día se acrecentava más la pena de Leonisa en ver la hermosura de don Polindo. Tanto que días y noches en continos sospiros que su coraçón inflamavan passava (...) Y estando ansí, pensó de se aprovechar de sus artes. Y luego hizo sus encantamientos en la sala donde don Polindo estava (...) Y en entrando por la cámara, luego fue encantado. E sin acuerdo ninguno, con los braços abiertos se va para Leonisa. La cual lo recibió com mucha alegria. Y don Polindo pensava con su señora y así la tomó entre sus braços e hizo con ella su voluntad. E Leonisa fue tornada dueña. E con mucho plazer se despojó de sus panos. E don Polinto, lo mesmo; que no sabía qué se hazía, qu’estava ya fuera de su sentido”. – Don Polindo, cap. xxv, p. 73.
- 12. A descrição do locus amoenus dos dois amantes (com todos os adjetivos que utilizamos acima) se encontra no capítulo XXI (p. 61). Vale a pena o leitor se entranhar em um breve estudo das qualidades ornamentais e aromáticas de cada planta descrita pelo autor. Ao conferir o sentido de cada palavra que representa cada planta, o leitor poderá perceber melhor as imbricações feitas pelo cronista de Polindo, bem como seu desejo de envolver os dois amantes na perfeição da criação divina que é a natureza.
- 13. Don Polindo, cap. XXI, p. 62.
- 14. R. da COSTA, “A violência da cavalaria medieval e o processo civilizador dos oratores”, em Dimensões 13, Revista de História da Ufes, jul/dez 2001, Vitória, Centro de Ciências Humanas e Naturais, pp. 174-186.
- 15. R. da COSTA, “Codex Manesse: três iluminuras do Grande Livro de Canções manuscritas de Heidelberg (século XIII) – análise iconográfica. Terceira parte”, em Revista Brathair 5 (1), 2003, p. 27.31. Por exemplo, o quadro 8 nos mostra o conde Heinrich von Anhalt (Henrique I, conde de Alsácia e príncipe de Anhalt) em um torneio com dois cavaleiros. Na cena, eles se preparam para cortar as cabeças de seus oponentes, tudo visto e graciosamente comentado por falantes e alegres damas...
- 16. “Recordo-me de estar um dia a falar com um cavaleiro que freqüentava com gosto os torneios e para eles convidava outros cavaleiros enviando-lhes arautos e histriões para anunciar os torneios e não cria, assegurava ele, que essa espécie de jogo ou de exercício fosse pecado (...) Mas eu dediquei-me a mostrar-lhe que os sete pecados mortais acompanhavam os torneios (...) Não lhes faltam o ódio e a ira, visto que cada um fere o outro, o maltrata e, as mais das vezes, o fere de morte e o mata...” – JACQUES DE VITRY, Sermão 52, Ad potentes et milites, em J. LE GOFF. “Realidades sociais e códigos ideológicos no início do século XIII: um exemplum de Jacques de Vitry sobre os torneios”, O imaginário medieval, Lisboa, Editorial Estampa, 1994, p. 278.
- 17. Quando o autor se refere ao sujeito “ele”, não se trata de Dom Polindo, e sim, ao cavaleiro que lutará contra Dom Polindo (“...porque ele se lhe outorgou”). Por isso, o autor da obra, por não saber o nome do cavaleiro – ou por não desejar dizê-lo – o denomina durante toda a passagem simplesmente “cavaleiro de Dom Polindo”. – Agradecemos à leitura crítica dessa difícil passagem por parte do Professor Jordi Pardo Pastor (ARCHIVIVM LVLLIANVM de la Universitat Autònoma de Barcelona).
- 18. ...mas como tinha bom coração”, isto é, forte, tenaz, persistente.
- 19. “Un cavallero de aquellos le rogó a don Polindo le diesse la primer justa. Él gelo otorgó. E luego salió un cavallero de la tienda e él le salió a rescebir. E danse tan grandes encuentros que las lanças quebraron en menudas pieças. E al encontrar de los cavallos, el cavallero de don Polindo cayó en el suelo una gran caída. Mas como era de buen coraçón, luego se levantó. E pidiole al cavallero de la tienda que pues le avía vencido de la lança, se provasse con él de las espadas. – Cavallero, yo no’s he demandado batalla de espada –dixo el cavallero de la tienda–. Mas dexadme provar con vuestros compañeros e yo me combatiré con vós si los venciere del espada. E en esto, luego tomó otra lança e llamó otro a la justa. E luego salió otro e vanse el uno para el otro al más correr de sus cavallos. El cavallero de don Polindo rompió su lança en el cavallero de la tienda; el cual dio tan gran golpe a su contrario, que ligeramente lo echó a tierra. Don Polindo juzgó al cavallero por de gran fuerça.” – Don Polindo, cap. XXX, p. 87. Observe o leitor que há vários atores na cena que acabamos de traduzir. Em primeiro lugar, há o encontro de Dom Polindo com aquele que é denominado “cavaleiro de Dom Polindo” (cf. nota 17). Posteriormente, o “cavaleiro de Dom Polindo” luta contra o cavaleiro da tenda, que é o vencedor (“No encontrar dos cavalos, o cavaleiro de Dom Polindo teve uma grande queda no solo [...]”). Após a derrota, o “cavaleiro de Dom Polindo” luta contra um novo oponente, e o derrota. Note o leitor que há uma interessante estratégia narrativa: Dom Polindo passa de protagonista a espectador da estória narrada. Portanto, não devemos crer, como a princípio parece sugerir o texto, que Dom Polindo seja um dos cavaleiros que estão lutando na justa (“Dom Polindo julgou o cavaleiro como tendo uma grande força [...]”).
- 20. M. VARGAS LLOSA, “Viejos y nuevos libros de caballerías”, em García Márquez: historia de um deicidio, Barral, Barcelona, 1971, p. 176.
- 21. “Finis. Señor Jesucristo en quien yo tengo mi esperança, aunque indigno y pecador, os ruego me deis gracia para que yo os sirva y que mi pobre ingenio, fértil e abundoso de dificultades, no sea reprovado. Mas conosciendo yo siempre ser juzgado según el desseo con que me dispuse a fazer esta obra, que fue para qu’el tiempo que desocupado tuviesse no diesse holgura a mi espíritu para que la pereza en él entrasse, quise cerrar las puertas con la cadena e fuerça del estudio. Y con esto a los retractores que mal acostumbran dezir templaré. E certificados que lo que en este primero no se pudo enmendar, en el segundo, que ya está hecho, veréis el mejor estilo que lleva, con que los lectores se recreeen. A los cuales de mis faltas encubrir ayuda demando.” – Dom Polindo, cap. CI, p. 307.