Entre a Pintura e a Poesia
O nascimento do Amor e a elevação da Condição Feminina na Idade Média
Priscilla Lauret COUTINHO e Ricardo da COSTA
In: GUGLIELMI, Nilda (dir.). Apuntes sobre familia, matrimonio y sexualidad en la Edad Media.
Colección Fuentes y Estudios Medievales 12.
Mar del Plata: GIEM (Grupo de Investigaciones y Estudios Medievales),
Universidad Nacional de Mar del Plata (UNMdP), diciembre de 2003, p. 4-28
(ISBN 987-544-029-9).
Priscilla Lauret COUTINHO e Ricardo da COSTA
In: GUGLIELMI, Nilda (dir.). Apuntes sobre familia, matrimonio y sexualidad en la Edad Media.
Colección Fuentes y Estudios Medievales 12.
Mar del Plata: GIEM (Grupo de Investigaciones y Estudios Medievales),
Universidad Nacional de Mar del Plata (UNMdP), diciembre de 2003, p. 4-28
(ISBN 987-544-029-9).
Imagem 1
Amantes (31 x 18). Detalhe da decoração do teto (em madeira) do claustro da abadia de Sto. Domingo de Silos (século XV - Burgos).
Primavera, desabrochar das flores.1 Um jovem casal de enamorados se encontra em um ambiente natural – lugar por excelência das aventuras amorosas.2 Neste pequeno pedaço de terra, nesta ilha do amor, eles estão cercados de plantas, imensas, exóticas, que circundam o espaço.
O ambiente transpira paixão. O ar está vermelho, quente. Os rostos estão colados, postura típica dos enamorados medievais; os pés unidos do jovem sugerem que ele está sentindo intensamente o contato físico de sua amada; as vestes têm o mesmo bordado e a mesma cor, indicando a harmonia e a perfeição do amor do casal, pois na Idade Média a relação entre os personagens na pintura se baseava na alternância rítmica das cores.3
As mãos, elas dão o movimento e explicam os atributos dos personagens ou o motivo pelo qual estão inseridos na cena.4 Repare na posição das mãos do casal: a dama impede suavemente o avanço do cavaleiro, com sua mão esquerda tocando o peito dele; sua atitude é aparentemente contida, já que sua mão direita o envolve. Ela quer e não quer. Dualidade feminina. Por sua vez, o cavaleiro, apaixonadamente ousado, a abraça com sua mão esquerda, enquanto a direita, insinuante, acaricia carinhosamente um de seus seios.
Na parte superior da imagem, duas linhas negras, vindas da esquerda e da direita, se entrecruzam no meio e evoluem para baixo, formando uma figura triangular que dá a impressão de estar viva, pois no interior de suas linhas se espremem dezenas de copos-de-leite.5 Planta aquática branca e em formato de um copo semicônico, considerada erótica por possuir um talo arredondado em torno do qual se desenvolve a flor – símbolo feminino –, um caule amarelo no meio – representando o falo, e do qual exala uma suave fragrância convidativa ao amor.
As linhas negras entrecruzadas ressaltam que o casal está naquela ilha do amor. Para destacar isso, o artista recorreu à chamada arte de reforçar, isto é, elevar o que se encontra por trás ou ao redor e mostrá-lo por cima. Assim, tudo o que está nele se vê de cima, como as flores. O fato de estarem cercados de água por todos os lados assegura a intimidade do casal: trata-se, portanto, de uma cena íntima. As mãos no peito e as flores eróticas circundando a cena indicam que o momento do amor se aproxima.6
Complementando a cena, acima, à esquerda e à direita, um arranjo laranja com as mesmas plantas, como se fosse uma extensão natural dos pensamentos compartilhados do casal. Afinal, na Idade Média, a concepção vigente era de que o corpo humano, formado pelos quatro elementos, se estendia e se comunicava com toda a natureza.7
***
Quando a vejo reconheço-me
Nos olhos, no rosto, na cor,
Pois tremo de medo como a folha ao vento
Uma criança tem mais juízo que eu
De tal modo me sinto possuído pelo amor
E de um homem vencido desta forma
Bem poderia uma dama ter grande piedade
(Bertrand de Ventadorn, c. 1150-1180)8
Quem nunca escreveu uma poesia de amor? Ter amado, ter sido amado, ter sofrido, ter feito sofrer: talvez essas sejam as condições necessárias para se escrever sobre o amor. Mas por que tão poucos historiadores brasileiros se dedicaram a esse tema? Por que o amor não faz parte do universo temático da História – pelo menos da História que se escreve no Brasil?9
O amor é um sentimento sublime, força unificadora e harmonizadora desde a Grécia Antiga. Para Platão, o amor é falta, necessidade, desejo de conquistar e preservar o que se conquistou; o amor dirige-se para a beleza, aparência do bem.10 Aristóteles, por sua vez, considerava o amor sexual, uma afeição que conduzia à amizade, sentimento superior11; ninguém seria atingido pelo amor se não fosse ferido pelo prazer da beleza.12
Contudo, não vamos contar a história do amor através dos filósofos. Queremos tratar do nascimento do amor cortês no século XII, do surgimento desse tipo de conduta masculina refinada e educada em relação ao sexo feminino, ao seu amor. Há séculos o amor arrasta os homens. Há séculos a mulher é cortejada. Em prosa, em verso. Diversos são os sentimentos que afloram ainda hoje quando nos deleitamos com amores como os de Abelardo e Heloísa13, Dante e Beatriz14 e Laura e Petrarca.15 Todos ilícitos, que à exceção do primeiro, nem chegaram a se concretizar.16 Os poetas medievais, apaixonados, derramaram suas lágrimas e seu sofrimento por amadas – acessíveis e inacessíveis.
O que desejamos ressaltar aqui é que esse sentimento, e o moderno comportamento de submissão masculina em relação ao sexo frágil, à vontade feminina, foram “inventados” na Idade Média. Sim, essa mesma Idade Média execrada por muitos, por desconhecimento, por preconceito ou simplesmente porque nunca amaram – nem escreveram apaixonados poemas de amor.
Paradoxalmente inventado na Idade Média e recusado em nosso século, o amor foi relegado a um segundo plano, enquanto a política vinha à tona nas discussões sociais. O amor chegou a ser considerado uma ideologia17 e um mal.18 Pior que isso, somente a proposta dos mais radicais: simplesmente eliminá-lo! Pelo menos essa era a idéia dos comunistas de Cambridge na década de 30. Eric Hobsbawm – não por acaso um dos historiadores mais influentes e lidos nos cursos de História em nosso país – conta-nos em sua autobiografia que cantava com seus camaradas universitários uma melodia de Cole Porter com uma letra adulterada e bastante sugestiva para o tema que nos propomos narrar aqui:
Vamos liquidar o amor / Vamos dizer daqui em diante que toda a nossa afeição /
É somente para os trabalhadores / Vamos liquidar o amor / Até a revolução /
Até esse momento o amor será / Uma coisa não bolchevique.19
Sintomático o fato de os trabalhadores receberem afeição dos bolcheviques, não amor. Claro, o verdadeiro revolucionário deveria ser duro. Hobsbawm reconhece a contradição: “Nós, que queríamos preparar o terreno para a bondade, não podíamos ser bondosos”.20 O amor – que une – não combinava com a Revolução – que separa.
A partir de então, pelo menos entre os intelectuais de esquerda dos círculos acadêmicos ingleses, as linhas traçadas pelo Partido Comunista determinariam as vidas privadas de seus membros. O público interferia no privado, já que sentimentalismos individuais faziam parte do “mundo burguês”: “Se o Partido mandasse abandonar o amante ou o cônjuge, obedecia-se (...) Era impensável qualquer relacionamento sério com quem não fosse membro do Partido ou estivesse pronto para ingressar (ou reingressar)”.21
Esse comportamento mecânico de mais de setenta anos parece-nos, no mínimo, ridículo, doentio, mas o impressionante é que, até hoje, ele norteia boa parte da inteligência universitária de esquerda em nosso país.22
Como acreditamos que, em tese, tudo o que o homem fez (e pensou) é motivo histórico, o amor, sem dúvida, é um tema propício para a História, pois se refere ao que é exclusivamente humano. Além disso, através dele, é possível fazer um estudo comparativo e temático de tempos distintos, pois ao contrário dos nossos famigerados tempos pós-modernos que propagaram a Revolução em detrimento do amor, a Idade Média cultivou e enalteceu esse sentimento, criando uma nova e revolucionária forma de relacionamento homem/mulher que continuou durante séculos. E em boa parte, até os dias de hoje, apesar dos brutos – ou até pelos brutos, pois, como sabemos, os brutos também amam.
Aqueles homens do século XII, os chamados feudais, deram origem a uma maneira sensível de expressão que foi denominada amor cortês.23 Assim, é preciso definir esse conceito para aprofundar a importância dessa transformação nos costumes do Ocidente Medieval.
I. Os conceitos de cortesia e de amor cortês
A cortesia medieval era uma qualidade mundana24, uma virtude essencialmente laica e que dizia respeito ao comportamento social daqueles que compartilhavam a vida nas cortes reais e principescas dos castelos que se multiplicaram no século XII.25
Cultura das elites, cortesia era visitar-se entre cortes.26 Mais do que isso, era um refinamento de costumes, um controle mais rigoroso das pulsões27, uma polidez, uma arte de viver28, uma sociabilidade e, principalmente, uma fina educação para com a mulher.
Ser amável, educado e fino. Saber expressar seu amor de forma gentil: essa foi a primeira e principal fase na transição do homem-guerreiro para o cortesão.29 Esse era o novo-homem cortês do século XII, um cavaleiro que caminhava a passos largos para se tornar um cavalheiro.
Essa revolução silenciosa e amorosa foi tão profunda na história do ocidente que os termos que expressam hoje o nosso amor romântico e o ambiente sedutor que definem o envolvimento entre duas pessoas de sexos opostos surgiram na primeira metade do século XII. Sem dúvida, trata-se de uma grande transformação histórica que elevou a condição feminina! Até Howard Bloch – um notável pesquisador, mas ferrenho e impiedoso crítico do amor cortês (amor “capacho-pedestal”, segundo ele30 – não pôde deixar de reconhecer, numa bela passagem, essa importante mutação cultural:
...a noção de fascinação romântica que governa o que dizemos sobre o amor, o que dizemos àqueles que amamos, o que esperamos que eles nos digam (...), como agimos e esperamos que eles ajam, como negociamos nossa relação com o social – em resumo, a higiene que governa nossa imaginação erótica até a escolha de quem amamos ou as posições físicas que usamos para exprimir isso – não existia na tradição judaica, germânica, árabe ou hispânica, na Grécia ou na Roma clássica, ou no início da Idade Média.
O amor romântico tal como o conhecemos não surgiu até aquilo que algumas vezes se chama a renascença do século XII.31
O nascimento do amor no século XII, foi um dos melhores legados que a Idade Média deixou para os tempos vindouros. Para analisá-lo um pouco mais de perto, tomaremos como base documental algumas passagens de poesias líricas trovadorescas – sabemos da existência de quatrocentos e sessenta trovadores32 –, a obra de André Capelão (Tratado do Amor Cortês33, c. 1186), algumas passagens dos Lais de Maria de França (contos em versos octossilábicos do século XII)34 três iluminuras do Livro de Canções de Heidelberg (Codex Manesse, do século XIV)35 e uma tapeçaria alemã (c. 1320-1330) intitulada Maltererteppich. Nas análises iconográficas, pretendemos mostrar que até os gestos entre os sexos – as “posições físicas”, como disse Howard Bloch – foram consideravelmente modificadas após o nascimento do amor, propiciando à mulher nobre um novo e destacado papel nas relações sociais.
Estamos cientes das dificuldades de se buscar a vida real tanto através da prosa e da poesia quanto das imagens. Duas questões se colocam diante do historiador: até que ponto elas retratam a realidade da época? Textos literários e (imagens) podem servir de parâmetro para o historiador que busca a existência concreta da vida humana? Marc Bloch já vislumbrou esse delicado problema. Dentro todos, teve a melhor resposta: embora a poesia de então tendesse a dissociar-se do “sentimento da carne”, ela não impediu que homens – e mulheres – continuassem a se satisfazer “assaz brutalmente”.36 Com certeza, a literatura diz muito sobre as atitudes e as aspirações humanas, do mesmo modo as imagens.37
Assim, o cultivo do amor por parte dos homens trouxe um abrandamento do impulso sexual violento (e masculino), assumindo um caráter educativo38, melhorando a condição feminina.39 Essa será a idéia básica norteadora desse trabalho.
II. Como elas eram tratadas?
A primeira pergunta que se deve fazer para melhor se avaliar o impacto do nascimento do amor é: como os homens tratavam as mulheres antes do século XII? Parece ser consenso entre os historiadores que, nos círculos sociais mais elevados que se têm notícia na documentação, a mulher não era tratada com qualquer tipo de ternura, muito pelo contrário.
Por um lado, a Igreja tinha um discurso regularmente misógino40, apesar de, pelo menos desde o século IX, colocar a mulher juridicamente em pé de igualdade com o marido.41 E não só em pé de igualdade jurídica, mas também de humanidade: ainda no século VIII as populações acreditavam que as mulheres possuíam relação e influência sobre os eclipses lunares! A Igreja lutou contra essaconcepção mágica feminina, e tentou fazer prevalecer o conceito de igualdade entre os sexos. O Concílio de Leptines (744) destacou a noção da mulher como um ser humano e não cósmico, pois muitos acreditavam que a mulher dominava as forças da natureza, que era um mistério – benéfico mas sobretudo maléfico.
Eles acreditavam que o maior poder da mulher era dominar o amor, visto então como um sentimento negativo, o oposto da caridade. Para aplacar essa angústia coletiva, oferecia-se aos jovens casados uma taça de hidromel (álcool do mel fermentado), um tranqüilizante que era considerado um antifiltro de amor, um antídoto contra aquele impulso negativo e destruidor (por esse motivo surgiu a expressão “lua-de-mel”). Para muitos, o amor era uma força subversiva, um desejo devorador que deveria ser combatido.42
Por outro lado, vivendo em uma sociedade que enaltecia a força viril masculina, no mundo laico seu espaço era bastante restrito. Sua função básica era procriar. E apanhar. Ainda no tempo de Filipe II Augusto (1180-1223), o gesto de violência mais comum era o soco no nariz: “O rei (Filipe II) ouviu isso e a raiva coloriu-lhe o rosto; erguendo o punho, atingiu-a no nariz com tal força que tirou quatro gotas de sangue. E a senhora disse: “Meus mais humildes agradecimentos. Quando lhe aprouver, pode fazer isso novamente”.43
Esta brutalidade do rei contradiz suas próprias palavras. Segundo Joinville, o próprio Filipe teria dito certa vez que havia uma grande diferença entre um homem valente e um homem-bom (prudhomme): para o rei, o último, homem cortês, gentil e educado para com as mulheres, era muito superior ao primeiro! Hipocrisia – claro, mas de qualquer modo, um sinal que, no início do século XIII, a força bruta e a coragem já não eram suficientes para caracterizar o perfeito cavaleiro.44
A situação feminina era ainda pior nas camadas sociais inferiores (burgueses e camponeses). Naturalmente, a descoberta da cortesia nas classes altas do século XII não se difundiu rapidamente por todo o corpo social. No século XIV um texto do direito de Aardenburgo (cidade flamenga que seguia o costume de Bruges) é muito chocante no que diz respeito à condição das mulheres burguesas: “Um homem pode bater na sua mulher, cortá-la, rachá-la de alto a baixo e aquecer os pés no seu sangue; desde que, voltando a cosê-la, ela sobreviva; ele não comete nenhum malefício contra o senhor.”45
Portanto, um homem não cometia nenhuma infração jurídica se batesse em sua mulher, desde que não a matasse (Costume de Namur de 1558, art. 18).46 Ainda no século XIV, os camponeses de Montaillou surravam suas mulheres regularmente. Surras conjugais. Naturalmente elas tinham medo, muito medo deles. Por exemplo, o lenhador Bernard Befyat surrava regularmente sua mulher para proteger a mãe da violência dela. Além disso, as agressões verbais eram freqüentes. Os textos inquisitoriais dessa aldeia são um desfile de grosserias com o sexo feminino. Por exemplo, Guillaume d'Ascon, católico, desconfiava que sua mulher tinha contatos ilegais com hereges cátaros. Então disse a ela:
Grandíssima porca (...) tu e a tua cúmplice Rixende, a mulher de Pierre Amiel de Ascou, essa grandíssima leprosa e herética, deviam ambas ser queimadas (...) E não me importava muito em arrancar o fígado e os intestinos a uma porca velha como ela!47
Essa violência – física e verbal – contra as mulheres perdurou modernidade adentro. Em uma de muitas histórias sobre mulheres das camadas inferiores do século XVI narradas em seu livro48, a historiadora Natalie Zemon Davis contou o drama de Marguerite, esposa de Jaquemin. Com seis filhos, ela era sempre espancada por seu marido, chegado à embriaguez do vinho. Num sábado, apenas oito dias após o fim do resguardo de suas duas últimas filhas gêmeas, Jaquemin surrou-a e atirou-lhe um cálice e um prato de cerâmica. Ferida em várias partes do corpo, Marguerite fugiu para a casa de um casal vizinho. Desesperada, dizia a todos que preferia morrer logo de uma machadada a viver com semelhantes tormentos.
No entanto, por amor à suas duas crianças que ainda amamentava, ela voltou para casa três semanas depois, somente para continuar o sofrimento. Sem forças, então pediu a ele por misericórdia que a matasse, a machadada. Blasfemando o nome do Senhor, ele pegou o machado e atirou nela, que conseguiu se esquivar. Transtornada, Marguerite voltou-se, pegou o machado e desferiu o golpe mortal no marido. Ela foi presa. Cerca de treze anos depois, em 1536, pediu a clemência do rei. Sua carta foi registrada por um requerente para ser enviada à Grande Chancelaria real. Ela foi perdoada.
Dessa forma, não é sem razão que quando uma mulher falava de amor no mundo medieval (e moderno) estivesse sempre se referindo a experiências vividas com carinhosos e solícitos amantes, nunca com o marido.49 Na Idade Média, com o enorme alcance desse fenômeno histórico, o amor cortês50, o amor e o tratamento carinhoso por parte dos homens nasceram a princípio sob o signo da infidelidade conjugal.
Feita esta delimitação metodológica – para saber realmente até que ponto um determinado período inova um aspecto de sua realidade é necessário compará-lo com o período anterior, não vê-lo em retrospectiva com os olhos do presente – trataremos brevemente dos “inventores” do amor cortês, de suas principais características para, a seguir, analisar brevemente os textos e as figuras selecionadas que retratam o gestual típico e apaixonado dos enamorados de então.
III. As mulheres tomam a iniciativa
Guilherme, duque da Aquitânia e conde de Poitiers (1071-1126), um dos príncipes mais poderosos do reino francês, é considerado por muitos especialistas o primeiro trovador medieval. Em sua corte teria nascido o amor cortês. O ambiente cultural aquitânio era bastante propício. Já a partir do século X, os duques aquitânios, antepassados de Guilherme, viviam quase como reis. Só faltava-lhes a sagração. Os cronistas a serviço de sua casa usavam em seus textos epítetos do vocabulário real e imperial (“duques piedosíssimos”, “príncipes sereníssimos”.51 Aqueles duques desejavam se tornar a corte ao sul do reino.
Para isso, tinham que resistir à influência cultural da corte parisiense capetíngia. Em seu tempo, Guilherme estimulou a disseminação da “alegria profana”. Reuniu cantores, muitos deles cavaleiros, para celebrar o prazer proporcionado pelas mulheres e os novos valores da cortesia. As mulheres da Aquitânia estavam em posição histórica mais favorável para essa mudança. No sul da França, os clérigos não exerceram tanta influência como no norte; a Igreja sempre fora menos rica, menos culta. Seus centros religiosos não tiveram força suficiente para impedir que surgisse uma cultura profana, uma “moral mundana”.52
Somado a isso, é fato que a mulher nobre medieval, ao contrário das lendas difundidas posteriormente, nunca viveu como uma prisioneira em seu gineceu, pelo contrário. Muitas vezes elas defendiam militarmente seus castelos como verdadeiros cavaleiros53; em várias regiões chegaram a herdar feudos (os chamados “feudos de roca” [fiefs de fuseau]54), governando-os muitas vezes com dureza55, tendo, por isso, recebido a admiração de seus contemporâneos (que as chamavam de viragos, mulheres-macho56).
Além disso, para além disso, o século XII proporcionou-lhes a novidade de protagonizar e dirigir o salão. Muitas vezes educada nos estudos liberais, aquelas mulheres nobres tinham o dever de cooperar na educação do donzel, o moço que ficava entregue aos cuidados de seu senhor57. Dona da corte, ela tornou-se uma cortesã – uma mulher que gentilmente recebia poetas, cantores e artistas. Eleonor da Aquitânia é o melhor exemplo do patrocínio feminino da poesia amorosa.58
Cortesã, cortejada: a grande “sala das damas” era o lugar no castelo onde os cavaleiros, agora também poetas, tentavam mostrar seus talentos literários, todos dirigidos a ela.59 Homens dominados, sob o poder das mulheres.
Esse contexto social aconteceu especialmente depois do retorno de Guilherme da Primeira Cruzada. Sobrevivente da vitória turca na batalha de Heracléia (1101), ele hospedou-se na corte de Boemundo I, príncipe de Antioquia, e visitou Jerusalém. Dezoito meses depois, já em casa, Guilherme passou a escrever suas canções, provavelmente influenciado pelo verso latino dos clérigos, pela cultura moura que conheceu em Antioquia e, talvez, pelas canções populares goliárdicas de sacerdotes e estudantes errantes que cantavam o amor e a natureza profana.60
Foram conservadas onze canções suas, com uma cronologia que ainda é objeto de discussão.61 Elas foram ordenadas no século XIX pelo erudito Alfred Jeanroy, que separou as canções eróticas e “obscenas” das que tratam do amor cortês e da proximidade da morte, teoricamente evoluindo de um estilo grosseiro para outro, refinado e sensível.
A partir de então, muitos especialistas dividiram sua produção nessas duas fases. Não discutiremos isso aqui. Para mostrar a proximidade da poesia com a realidade, escolhemos um dos poemas mais famosos de Guilherme, sua canção n. 5, a do “gato vermelho”62, possivelmente dessa primeira fase de sua poesia, a “mais sexualmente explícita em qualquer língua que existia antes do século XX”.63
A estória é a seguinte: um jovem – o próprio Guilherme – narra que, andando pela Auvergne disfarçado de peregrino, parou em um castelo e ali encontrou duas damas, irmãs, Agnes e Ermessen. Elas estavam sozinhas. Seus maridos, Guari e Bernart, estavam ausentes. Ele decidiu passar por mudo, e conversar com elas por sinais. Por hospitalidade, elas ofereceram uma refeição ao viajante e, após alimentá-lo, decidiram testar sua mudez. Se ele fosse mudo mesmo, elas disseram, “o que fizermos nunca será contado por ele”.
Então elas deixaram-no despido, pegaram um gato vermelho e selvagem, com longos bigodes e afiadas garras e arranharam suas costas. Masoquismo! Ele ficou bastante ferido pelos arranhões, mas, pálido, conseguiu manter o silêncio. “Irmã, ele é mudo de verdade! Acho que podemos nos preparar para a diversão e brincar”.64 Elas então prepararam um banho quente para o hóspede silencioso. Os três passaram oito dias na cama. Exausto pelo esforço sexual, o peregrino-mudo contou:
Tanto as fodi, tal como ouvireis / Tant las fotei com auziretz
Cento e oitenta e oito vezes, / cent et quatre-vinz et ueit vetz,
Por pouco não rompi minhas correias / que a pauc no'i rompei mos corretz
E meu arnês / e mos arnes;
E não vos posso dizer o mal-estar / e no'us puesc dir los malavegz,
Tão grande que me tomou / tan gran m'en pres (XIV)65.
Este poema mostra bem o grau de tensão erótica presente no amor cavaleiresco das cortes medievais.66 Outro bom exemplo é a obra Parzifal (c. 1200-1210)67, romance da tradição do Graal de autoria de Wolfram von Eschenbach (c. 1170-1220). Em uma passagem há uma cena bastante sensual:
No castelo Gahmuret viu-se rodeado por muitas damas. A rainha em pessoa, com sua escura mão, retirou-lhe a armadura. A seguir ele foi conduzido a uma alcova magnífica, toda guarnecida de pele de zibelina. Com isso ela procurou demonstrar a elevada consideração de que ele seria alvo na intimidade.
As donzelas deixaram o recinto e fecharam a porta. Ali apenas a rainha permaneceu. Embora a cor da pele de ambos fosse diferente, ela e seu querido Gahmuret entregaram-se despreocupadamente ao prazer inebriante de uma genuína paixão.68
De nascimento nobre, Wolfram von Eschenbach era, no entanto, pobre, possivelmente por não ter sido o primogênito da família. Possuiu apenas uma pequena propriedade em Wildenberg, perto de Ansbach (hoje Wehlenberg). Na corte do conde Hermann da Turíngia, Wolfram compôs seu Parzival.69
Imagem 2
Wolfram von Eschenbach. Cod. Pal. germ. 848. Große Heidelberger Liederhandschrift (Codex Manesse). Zürich (1305-1340). 149v. Detalhe. Wolfram von Eschenbach nasceu por volta do ano 1170 na Francônia, mas considerava-se um bávaro. Entre uma estadia e outra na corte do conde Hermann V von Thuringen (Turíngia) – amante das artes – provavelmente encontrou-se com Walther von der Vogelweide (c. 1170-1230).
Nesta obra, Wolfram diz-nos explicitamente que não sabia ler nem escrever, fato comum entre os poetas, que então ditavam seus poemas. Parzifal possui quase 25.000 versos e baseia-se no Conto do Graal de Chrétien de Troyes70, mas especialmente em um poeta provençal chamado Kyot (Guiot).71
Bem, o que estas duas passagens selecionadas possuem em comum? A iniciativa das mulheres. No poema de Guilherme da Aquitânia, o homem é um objeto a serviço dos prazeres femininos: as duas irmãs seduzem o viajante em um variado ménage à trois com um toque de sadomasoquismo quase pós-moderno – é por esse e outros motivos que Guilherme escandalizou os ambientes nobres do século XII, suscitando a imaginação de seus contemporâneos, que o consideravam um bufão72, um devasso, um libertino diabólico que inclusive mantinha um harém em forma de um convento de freiras.73
Por sua vez, no trecho de Parzifal, a rainha assume o papel de protagonista e conduz a cena: ela retira pessoalmente a armadura de seu amado, rebaixando-se de sua condição superior para demonstrar publicamente sua afeição por ele – e o que o aguardava na intimidade de seu recinto, ricamente decorado para essa ocasião.
Qual a relação desses textos com a realidade? Na verdade, nunca saberemos inteiramente. Podemos imaginar, conjeturar. Em nossa opinião, é muito improvável que eles não traduzam pelo menos uma parcela razoável do que acontecia na vida real.74 Caso contrário, os ouvintes rejeitariam-nos – e sabemos do imenso sucesso, nos círculos nobiliárquicos, tanto dos chamados “contos arturianos”, contos que enalteciam o “cavaleiro perfeito”, “fiel e enamorado”75, quanto dos poemas sobre o amor cortês, escritos por homens – e por mulheres.76
IV. Características do amor cortês
A mais intrigante característica desse amor medieval é a submissão absoluta do homem à dama. E mais: ele é solteiro, jovem; ela, casada, mais velha! Naquele jogo, onde a mulher era quem sempre vencia, a capacidade do homem em se prostrar, mesmo sendo fisicamente mais forte, é notória.77 Por amor, ela se tornou a senhora, a dama, e ele o vassalo, o submisso, aquele que prestava juras de fidelidade absoluta e agia sempre com moderação para não corromper a reputação da mulher amada, já que era uma mulher casada. Nos textos, o amor da dama é inacessível, intocável, distante. Claro, o segredo era a arma poderosa contra os fofoqueiros que existiam na vida cotidiana das cortes. Porém, a beleza da mulher era exaltada, pois os trovadores usavam recursos para resguardar o nome de sua amada, como pseudônimos, mensageiros alados ou confidentes de alcova.78 Esse “silêncio” a respeito das façanhas de amor foi bem contado por Guilherme da Aquitânia:
Obediência deve professar / Obediensa deu portar
A quem muitas gentes deseja amar / a maintas gens, qui vol amar;
E convém saber fazer / e cove li que sapcha far
Feitos corteses / faitz avinens
E se guardar de na corte falar / e que's gart en cort de parlar
Coisas vis / vilanamens.79
André Capelão, uma “testemunha autêntica do seu mundo” (o mundo da corte de Filipe II Augusto)80, diz:
Quem desejar manter o amor intacto por muito tempo deverá cuidar, antes de tudo, para que ele não seja divulgado e mantê-lo oculto dos olhos de todos. Pois, assim que várias pessoas começam a conhecê-lo, ele deixa de desenvolver-se naturalmente e entra em declínio.”81
Na poesia medieval, quem amava também tinha medo e angustiava-se pensando na hipótese de perder esse amor ou não poder reconquistá-lo. Os homens amavam os romances sofríveis porque eram esses que tinham uma bela história, eram esses que faziam com que eles fugissem da realidade que os cercava a fim de alcançar a “beatitude do amor”.82 Na verdade, o que eles queriam era a sensação de estarem completos, unidos ao seu amor, como Tristão e Isolda depois da poção milagrosa ou quando juntos no Além.83
Cantando poemas rimados e acompanhados por instrumentos de som agradável, os homens das cortes medievais estabeleciam contatos, sem, contudo, desobedecer às normas do código de amor cortês que eles mesmos criaram para estar perto da amada.84 Ser poeta estava além de uma virtude, era uma condição para o amor, pois até um pobre poderia conquistar uma bela dama e substituir os presentes que essa mais gostaria de ter, se soubesse construir belas frases.85
Os defeitos femininos deveriam ser apagados, esquecidos e suas virtudes glorificadas, exaltadas, e supervalorizadas até o ponto em que o objeto daquele amor fosse tão sublime quanto a aurora ou o próprio amor. A idealização da mulher amada muitas vezes fazia com que o poeta a afastasse da realidade e isso transformava o “morrer-de-amor” numa constante em versos.86
Para Maria de França (século XII), quanto maiores a nobreza, a prudência, a beleza e a cortesia da dama, maiores seriam os motivos para a angústia e submissão do amante complacente, que se jogaria ao chão com juras de amor eterno.87 Esse amor deveria ser alimentado com a presença constante, mesmo que fortuita, pois se acreditava que o hábito também desenvolveria o amor: como afirma Ovídio – autor muito prezado pelos medievais – estando sempre próximos de quem pretendemos conquistar, essa empreitada se tornaria mais simples a cada dia que passassem nas mediações.88
Para obter as recompensas do amor também era preciso estar na idade certa. Segundo André Capelão, com menos de dezoito os meninos são inconstantes e com os maiores de sessenta o amor não pode ser engendrado; da mesma maneira, as meninas antes dos doze ou depois dos cinqüenta.89 Até Eros, o porta-voz do ideal cortês, era representado num corpo adulto: coberto de flores, possuía uma coroa de rosas e seu arco e flechas mais bonitas representavam as qualidades da mulher que amava. Ferido por essas virtudes, o cavaleiro convertia-se num fiel vassalo-amante que trancaria com uma chave seu coração para qualquer outra que porventura o quisesse adentrar.90Homem e mulher se completavam naturalmente, e o que não fosse natural não poderia engendrar o amor:
É preciso deixar bem claro que o amor só pode existir entre pessoas do sexo oposto. Não pode surgir entre dois homens ou duas mulheres: duas pessoas do mesmo sexo não são absolutamente feitas para se propiciarem mutuamente os prazeres do amor ou para realizar os atos naturais que lhe são próprios. E o amor envergonha-se de aceitar o que a natureza veda.91
Mas isso não impedia que houvesse uma perturbação dos sentidos quando o amor se iniciasse, mesmo que de acordo com a natureza. Era então que a voz ficava embargada, perdia-se o apetite, o sono e a vontade de viver. Num sentimento de masoquismo, aquele ferido pelo amor queria até mesmo que a dor da humilhação se prolongasse para ficar mais próximo dela:
Sinto prazer quando enlouqueço
E me faz em vão esperar tanto
Acho belo também quando ela me escarnece
Ou me engana, diante de mim ou pelas costas
Pois tão logo do mal me virá bem
Se lhe aprouver. (Cercamon, c. 1135-1147)92
Mas como o “ato de amar merece, com o tempo, mais alegria e prazer do que aflição”93, esse amor romântico, platônico e fiel foi, aos poucos, dando lugar ao amor carnal, insaciável e repleto de deslealdade.94 O belo físico e a facilidade de elocução eram dois dos três grandes trunfos do homem95, que não mais precisaria de uma excelente moralidade para conquistar sua dama. O amor se concretizava e a moral aí nada tinha a ver com isso. O calor que norteava a alma, queimava o corpo e o beijo era apenas a fagulha de infinitas demonstrações de desfrutes ardorosos, como afirma Maria de França em um de seus contos.96
V. Os tribunais femininos
Mas a maior prova da elevação feminina com o surgimento do amor cortês, não vem da pintura nem da poesia, e sim das maravilhosas descrições que André Capelão faz dos tribunais femininos. O incrível cenário era esse: dezenas de damas reuniam-se em uma corte de uma condessa ou baronesa e formavam uma assembléia feminina, espécie de “tribunal do amor”, para ouvir queixas e julgar delitos cometidos por amantes, delitos que infringiam as “leis” do amor cortês, o código de conduta aceito por todos. Em outras palavras: tratavam-se de reuniões femininas “a portas fechadas” para fofocas e intrigas palacianas sobre mulheres adúlteras e amantes fogosos!97 E tudo isso sem o conhecimento dos maridos traídos!
André Capelão comenta vinte e uma sentenças proferidas por damas: sete emitidas pela condessa Maria de Champagne, cinco pela viscondessa Ermengarda de Narbonne, três por Eleonor de Aquitânia (mãe de Maria de Champagne), três por Adélia de Champagne98, duas pela condessa de Flandres, Elizabeth de Vermandois (sobrinha de Eleonor) e uma pela assembléia das damas da Gasconha.99 Nessa última, há uma sentença interessante para a questão do silêncio das fontes (problema recorrente para os historiadores):
Um cavaleiro divulgou desavergonhadamente os segredos de seu amor e seus casos sentimentais íntimos. Todos os que servem na cavalaria do amor pedem que tal delito seja severamente punido, para que, não deixando impune esse exemplo de traição, não seja dada aos outros ocasião de imitá-lo.
Foi então reunida uma corte de damas na Gasconha, onde se decidiu por unanimidade, em disposição de validade permanente, que esse indivíduo passaria a ser privado de qualquer esperança de amor e considerado indigno e desprezível por todos, em qualquer corte de damas ou cavaleiros. E se alguma dama fosse suficientemente audaciosa para violar a disposição tomada naquela assembléia, concedendo-lhe amor, por exemplo, também será submetida para sempre à mesma pena e passaria a ser alvo da inimizade de todas as mulheres de bem.100
Além de se preocuparem com o que as fontes dizem (como, para que, para quem, por que) os historiadores devem sempre atentar para os silêncios do texto, o que ele oculta, o que não diz, porque não diz, etc. Ora, esta passagem mostra bem o problema do tema do amor: trata-se de investigar a intimidade das pessoas! Portanto, é bastante natural que os textos medievais não digam tudo, ainda mais porque se referem a amores ilícitos. O tribunal feminino de Gasconha expõe aos leitores de André Capelão o silêncio dos amantes: eles nunca devem contar o que fazem.
Como não perceber essa nova e elevada condição feminina nos séculos XII-XIII? Erroneamente, muitos historiadores centram sua análise sobre a condição feminina medieval no discurso misógino clerical – o próprio André Capelão, no fim de sua carta, repete a ladainha contra as mulheres101 – ampliando a opinião dos clérigos para toda a sociedade, como se todos pensassem assim.
Ora, isso é distorcer a realidade. As sentenças dos tribunais são muito esclarecedoras da nova condição feminina. Senão vejamos: as mulheres deveriam amar homens pobres para socorrê-los em caso de necessidade; uma dama usufruía todas as carícias de seu amante sem dar-lhe o mesmo em troca; uma mulher grávida tinha um amante, outra deixou seu amante para se casar mas foi censurada por isso; as mulheres tinham sempre preferência por amantes jovens (“serão causas físicas que poderão explicar melhor esse fenômeno”, diz a juíza do amor102), e por aí vai.
Gostaríamos de destacar apenas mais uma sentença dos tribunais femininos para mostrar que definitivamente o amor cortês não era platônico, como muitos equivocadamente afirmam. Um cavaleiro padecia de amor por uma dama e não tinha oportunidade de falar-lhe. Com o consentimento dela, recorreu a um confidente, que levava as mensagens amorosas para os dois. Com o passar do tempo,
O confidente que aceitara o papel de intermediário, rompeu o voto de fidelidade que devia aos dois e começou a obrar em favor próprio. A dama teve a indelicadeza de consentir em suas perfídias e finalmente entregou-se a ele, atendendo a todos os seus desejos.103
O “amante traído” denunciou o caso à condessa de Champagne, pedindo sua arbitragem. A condessa, após consultar sua corte de damas – sessenta! – proferiu a seguinte (e furiosa) sentença:
Esse amante trapaceiro, que encontrou uma mulher digna de seus méritos, pois que não hesitou em consentir com tão grave delito, deve comprazer-se, caso assim queira, nesse amor fraudulento, e a ela caberá ficar com o amante de que é digna. Mas os dois deverão permanecer para sempre privados do amor de qualquer outra pessoa; que nem um nem outro sejam mais convidados para as assembléias de damas ou para competições de cavaleiros; pois ele pecou contra a fé da cavalaria, e ela agiu vergonhosamente e atentou contra o pudor das damas, ao aceitar o amor de um confidente.104
Ou seja, a dama, mulher mais velha e casada, tem um amante mais jovem, solteiro e que lhe é fiel, trai o marido com um amante, depois o amante com outro amante, e o tribunal feminino julga a segunda traição. E o marido – provavelmente nunca soube do que aconteceu, nem do chifre, nem da curiosa sentença do tribunal feminino...
VI. Duas iluminuras do Codex Manesse (1305-1340)
Após essa breve análise dos textos da época, passamos agora a um maior detalhamento das iluminuras selecionadas. Da poesia para a pintura.
O Codex Manesse é um livro de canções de trovadores alemães do século XIII preservadas num corpus do século XIV por dois irmãos chamados Rüdiger (†1304) e Johannes (†1298), senhores de Manesse (em Zurique). No Codex, ao lado de cada letra de canção, há a imagem do poeta autor da trova. As iluminuras foram pintadas por quatro artistas; o primeiro, por volta dos anos 1300-1315 e os outros três, que completaram o trabalho iniciado pelo primeiro, por volta de 1330. Selecionamos apenas duas cenas para abordar o tema do amor.105
O cantor no detalhe dessa primeira miniatura chama-se Conrado de Altstetten. Era um conde. Suas canções pertencem ao período tardio dos Minnesangers (final do século XIII). A iluminura mostra uma dama abraçando seu cavaleiro de uma maneira muito envolvente. O abraço amoroso é um tema comum nas pinturas dos cantores alemães. Sentado a seus pés, reclinado, fascinado por sua beleza e pelo contato físico de seu amor, o cavaleiro se entrega passivamente aos seus carinhos, com seus olhos nos olhos dela.
Para aumentar a sensação de ternura da pintura, o iluminista colocou a dama debruçada suavemente sobre seu amado, com seu rosto tocando o dele. Repare, sua atitude é a de quem está tomando a iniciativa, especialmente pela posição de seu braço esquerdo, envolvendo Conrado.
Imagem 3
Konrad von Altstetten. Cod. Pal. germ. 848. Große Heidelberger Liederhandschrift (Codex Manesse). Zürich (1305-1340). 249v. Detalhe. A linhagem dos von Altstetten, documentada desde 1166, tinha sua residência em Oberrheintal, no Vale do Alto Reno. Estavam a serviço do abade de Saint Gallen.
Por sua vez, o cavaleiro está com seu corpo estendido como se estivesse em um divã. Essa postura é semelhante ao amante romano, embora invertida: em Roma, a atitude emblemática do amante é rolar sobre sua serva “como sobre um divã”106; aqui, pelo contrário, o homem está inerte, embevecido, ele é o divã, ela é quem o envolve. Sinal dos novos tempos de elevação da condição feminina. Enquanto recebe as carícias de sua amada, Conrado protege sua mão esquerda com uma luva branca para acolher um falcão, o que confere à cena um equilíbrio harmonioso. Ele a apóia sobre sua perna esquerda para melhor suportar o peso da ave.
Símbolo de sua nobre coragem e de seu prestígio107, o falcão parece também estar envolvido pelo ambiente amoroso, pois bica suavemente algo que se assemelha a uma pequena fruta na mão do cavaleiro, que tem dois longos e finos caules também vermelhos – nas imagens medievais, como nos Bestiários, muitas vezes os animais são retratados incorporando os sentimentos de seus donos, como se fossem uma extensão natural deles.
O ambiente que cerca o casal apaixonado está ornamentado com um roseiral – a rosa simboliza o Minne e sua amada (frouwe)108. Um jardim de rosas: este é o locus típico dos amantes, pois o roseiral também pode simbolizar os pensamentos carinhosos que os dois compartilham no momento – um cenário muito semelhante à iluminura do Conde Rudolf von Neuenburg, embora nesta última o cantor esteja sozinho escrevendo uma canção e pensando em sua amada.109
Por fim, esta miniatura pode ser uma ilustração da última canção de Conrado: “Seu beijo seria um penhor que eu aceitaria na hora por mil marcos. Um abraço destes braços brancos é o que deseja este cantor de rimas”.110
A iluminura seguinte retrata Hugo de Werbenwag (1258-1279). Hugo pertenceu a uma linhagem suábia que residia no Alto Danúbio, a sudeste de Sigmaringen. A família estava a serviço do Conde de Hohenberg-Haigerloch. Provavelmente no final de sua vida ingressou no mosteiro de Salem, pois em 1292, um monge do mesmo nome aparece como testemunha em um documento.111 Suas canções também datam do século XIII.
Esta imagem é uma das mais famosas pinturas do Codex com o tema do abraço amoroso. No entanto, o cenário é distinto da iluminura do conde Conrado de Altstetten. Trata-se de um interior: os dois amantes sentam-se à beira de uma grande cama, provavelmente em um aposento íntimo de um castelo. A cama é ricamente ornada com uma coberta colorida e forrada com peles.
Como adorno decorativo, dois travesseiros com círculos dourados, nas mesmas cores dos mantos do casal (azul e vermelho), o que indica que a cama é regularmente compartilhada pelos dois. Será a cama dele ou a dela? As cores da coberta, vermelho e verde, as mesmas da vestimenta da frouwe, sugerem que o quarto é seu, que ela é quem trouxe seu amado para seu aposento.
Por fim, completando o cenário, uma cortina amarela franzida emoldura o ambiente íntimo e propício àquela troca de carícias. Abaixo, à direita e à esquerda, dois tipos diferentes de rosáceas enfeitam a lateral da cama onde eles estão sentados. Pelas coroas e pelo tipo de tecido que guarnecem o leito e com o qual estão vestidos, podemos facilmente perceber a fina flor da realeza os cobrindo.
Imagem 4
Hugo von Werbenwag (1258-1279). Cod. Pal. germ. 848. Große Heidelberger Liederhandschrift (Codex Manesse). Zürich (1305-1340). 252r. Detalhe.
A postura dos personagens é ainda mais envolvente que a iluminura de Conrado de Altstetten, pois enquanto naquele retrato somente a mulher toma a iniciativa da investida amorosa envolvendo o conde em seus braços, neste os dois apaixonados tocam-se com as mãos; os longos dedos percorrem seus pescoços enquanto os rostos se encostam suavemente.
As mãos – como já dissemos, nas iluminuras medievais as mãos sempre sugerem o movimento e explicam o motivo da cena e, no caso, o movimento carinhoso – são de uma delicadeza incomparável. Os pés da dama nem chegam a aparecer, provavelmente como sinal de respeito à privacidade da jovem, apesar de tudo indicar que se trata de um prelúdio para uma noite de amor. Como retoque final, um leve sorriso adorna o rosto da dama.
A mulher, nos dois casos, participa, nunca é passiva. Retribui os carinhos que recebe, toma a iniciativa. Uma imagem muito diferente daquela difundida pelos clérigos. Nesta cultura profana, cultura do amor, ela é a senhora, ela é a dama, ela domina.112
VII. Anna e o poder das mulheres
Imagem 5
Maltererteppich (1320/1330) Augustinermuseum, Freiburg im Breisgau, Alemanha. Detalhe.
Além do Codex Manesse, selecionamos parte de uma tapeçaria, também alemã, chamada Maltererteppich, datada do início do século XIV113. Nela há uma narrativa imagética fantástica, com duas histórias em seqüência, aparentemente desconexas, após a apresentação de um brasão nobre feminino no centro do nome Anna.
Nesta tapeçaria, as imagens devem ser “lidas” da esquerda para a direita (cortamos a seqüência por motivos de espaço). Assim, a imagem 6 é a continuação da 5. Nesta primeira, há a apresentação do brasão de Ana, um belo escudo inclinado para a esquerda, de tipo francês pela sua forma. Seu campo é cortado, em chefe de azul com duas vieiras (conchas) de ouro, e em campanha com asnas (ou chaveirão, bandas em ângulo no escudo) em 4 peças alternadas de prata e goles (esmalte vermelho).
O elmo é de cavaleiro, com lambrequins como o desenho do campo do escudo (lambrequim era o pano que cobria o elmo e protegia o cavaleiro do sol nas batalhas); um crucifixo ornamenta o metal que circunda o queixo do cavaleiro, detalhe que mostra a preciosa arte do ferreiro; completando o cenário, no timbre, plumas de avestruz de prata – o timbre era qualquer insígnia apensa exterior ao escudo e que designava a nobreza do proprietário –, sem nenhuma coroa correspondente a um título.114
Antes de passarmos à análise dos quatro octógonos posteriores, detenhamo-nos um pouco mais no brasão de Anna. Três coisas chamaram nossa atenção e que dizem respeito ao amor e ao poder feminino: as duas vieiras (conchas), as penas de avestruz acima do elmo e o chaveirão.
Na heráldica, a concha é um símbolo muito recorrente. Ela representa a peregrinação115, pois os cavaleiros viajantes ao longo do litoral bebiam água nela.
Assim, é possível que algum antepassado da linhagem de Anna tenha ido à cruzada na Terra Santa. Mas a concha também representa a fertilidade (e o mar). Sua forma e profundidade lembram o órgão sexual feminino, tendo, portanto, um duplo aspecto simbólico, erótico e fecundante.116 Isso interessa sobremaneira à nossa análise: as duas conchas no brasão de Anna podem simbolizar as duas cenas com as mulheres de Sansão e de Aristóteles que analisaremos a seguir. Caso tenha sido essa a intenção do artista que bordou a tapeçaria, as vieiras marcariam no brasão o erotismo sedutor e subversivo das mulheres da linhagem do tapete...
Imagem 6
Maltererteppich (1320/1330) Augustinermuseum, Freiburg im Breisgau, Alemanha. Detalhe.
Da mesma forma, o chaveirão que aparece na parte inferior do escudo, lembra a primeira letra do alfabeto, a. A de amor (amore), A de Anna, letra iniciadora de toda escrita. O chaveirão também representa o movimento alternado das águas, água que fecunda a terra, e o vaivém constante das marés e das ondas, o vaivém do amor.
Por fim, as plumas de avestruz que ornamentam o elmo. Na heráldica medieval, o avestruz é um animal muito comum nos timbres de escudos.117 Em um bestiário do século XII (De bestiis et aliis rebus) encontramos uma interessante analogia entre as plumas do avestruz e o hipócrita:
A pluma do avestruz é semelhante à pluma da garça e do gavião. Quem ignora que a garça e o gavião têm vantagem sobre todas as aves na rapidez de seu vôo- Contudo, o avestruz, que tem o mesmo tipo de plumas, não tem idêntica rapidez de vôo, nem sequer pode alçar-se do solo, e embora em aparência levante as asas como se estivesse preparado para voar, jamais pode sustentar-se no ar.
Assim fazem todos os hipócritas que, simulando viver como os justos, imitam sua santa conversação, mas não suas santas ações (...) Quando o Senhor reprova a hipocrisia dos fariseus, é como se fossem a pluma do avestruz, que mostra uma coisa por sua cor e outra pelo que faz. (De bestiis, 212-214)118
Ora, para os moralistas medievais, as mulheres são hipócritas, pois têm um sentimento no coração e outras palavras na língua!119 Elas estão constantemente a fazer artimanhas120, são como o avestruz, que mostra uma coisa com suas belas plumas e faz outra, pois não sabe voar. Assim, parece que existe uma teia de intenções na concepção do artista em relação à linhagem de Anna expressa em seu brasão: o erotismo e a sexualidade nas vieiras e a alternância e a fecundidade das linhas cortadas do chaveirão. Para completar a simbologia do brasão, a mentirosa hipocrisia das plumas douradas do avestruz.
Feita esta apresentação, o artista passa então para duas narrativas, que são paralelas mas ao mesmo tempo se completam. São quatro cenas entrelaçadas no interior de octógonos amarelos e que simbolizam o poder de Anna, o poder feminino – na Idade Média a cor amarela simbolizava a presença do mal, era a cor por excelência da falsidade e dos personagens maldosos121, aqui, no caso, a mulher.
Nas duas primeiras, a famosa história de Sansão: o herói doma o leão (Jz 14, 5-6) e depois é domado por Dalila, que corta seus cabelos (Jz 16, 19). Observe que a atitude de Sansão é completamente subserviente, pois ele chega a apoiar seu rosto com a mão esquerda – curiosamente, não foi Dalila quem cortou as sete tranças da cabeleira de Sansão, como mostra a iluminura, e sim um homem.122 Além disso, ele não está dormindo, como conta a passagem bíblica, pelo contrário, parece satisfeito e sorridente com o corte de sua cabeleira.
Nas duas últimas cenas, o artista da tapeçaria relaciona e complementa os dois octógonos da passagem bíblica de Sansão e Dalila com uma famosa história medieval, a Queda de Aristóteles (Lai de Aristóteles, c. 1223), poema composto pelo clérigo e trovador normando Henri de Andeli (c. 1220-1240).123 Nele, o filósofo é seduzido pelo amor, abandonando seus estudos e a filosofia.
A primeira iluminura se refere a uma versão elaborada entre 1229 e 1240 por Jacques de Vitry (†1240) – bispo de Acre e orador de grande reputação em seu tempo. Em uma pregação feita entre 1229 e 1240, ele relaciona aquela história com uma passagem de Coríntios (1Cor 6)124: “Não é digno o vosso motivo de vanglória! Não sabeis que um pouco de fermento leveda toda a massa?125” E continua:
O que foi comprovado (que o fermento leveda a massa), como se diz, por Aristóteles. Ao instruir Alexandre (o Grande), ainda adolescente, aconselhou-o, entre outras coisas, a não procurar sua mulher em demasia, já que a amava muito, pois era muito bonita. Então, quando Alexandre passou a recusar seus freqüentes abraços, ela começou a investigar com afinco e com dor, a origem de uma mudança tão grande e de forma tão repentina em seu marido.
Quando compreendeu com certeza que foi seu mestre Aristóteles que propôs isso, depois de muito pensar e com ansiedade em seu coração, ela concebeu um caminho e uma maneira de se vingar de Aristóteles. Assim, perambulando pelo jardim, ela começou a olhar com freqüência para ele; e olhando pela janela do seu quarto de estudos, ela desfilava sorrindo diante dele, pronunciando palavras lascivas e desnudando seus tornozelos.
Desta forma, ela induziu de tal maneira a já nervosa mente de Aristóteles ao amor e à concupiscência que ele começou a suplicar à rainha que consentisse com sua vontade. Então ela lhe respondeu: “- Creio que queres me tentar e seduzir. Mas não posso acreditar que um homem de tanta sabedoria queira tentar tais coisas.”126
Esta primeira iluminura complementa a história, pois mostra Aristóteles, já seduzido e desviando sua atenção dos estudos, acariciando com sua mão esquerda o queixo da rainha, esposa de Alexandre, o Grande. Por sua vez, generosa, ela estende as duas mãos em direção a ele, demonstrando explicitamente que corresponde àquelas carícias.
Na segunda e última iluminura, encontra-se por fim a famosa imagem da Queda de Aristóteles: o filósofo está de quatro, como um cavalo (repare na sela dourada e no freio): ele é escravo daquela mulher – na estória, ela é uma das concubinas de Alexandre. Ela então o chicoteia, satisfeita.127
Qual a moral da Queda de Aristóteles? Na Idade Média, Henri de Andeli e Jacques de Vitry tiveram opiniões diferentes. Para o primeiro, a história mostrava a onipotência do amor; para o segundo, pregador e moralista, a história era um alerta contra a imoralidade.128
E o que a Queda de Aristóteles têm em comum com a história de Sansão para estarem na narrativa da linhagem de Anna da tapeçaria? A moral parece clara: todos os homens estão sempre sujeitos aos encantos femininos, mesmo os mais fortes e sábios, como Sansão e Aristóteles.
Além disso, todas as mulheres, astutamente, através do poder de seu erotismo e sexualidade, sempre desejam dominar seus homens, mesmo que não o digam, como as sedutoras plumas douradas do avestruz. Assim, como não atribuir aos artistas e poetas do século XIII a criação dessa nova e elevada condição feminina, se há espaço para se imaginar Aristóteles, na Idade Média, o filósofo, de quatro e sendo montado por uma mulher?
Finalizando a análise da tapeçaria, desejamos ressaltar um último detalhe a respeito da cor amarela, cor das vieiras: os octógonos (amarelos) entrelaçados estão, por sua vez, inseridos em duas faixas (também amarelas), preenchidas por margaridas (que têm seu miolo amarelo). A jovem rainha que seduziu o filósofo, no momento de sua conquista, trajava um recatado vestido branco, cor da pureza; já a concubina de Alexandre que “cavalga” Aristóteles, usa um vestido decotado de um ambíguo azul-acizentado, cor indefinida, mostrando sua verdadeira face. Contudo, ambas têm sempre uma touca amarela, duplo sinal: em primeiro lugar, elas não são solteiras129; em segundo, são falsas – como dissemos, para os moralistas medievais, o amarelo simbolizava a falsidade, sendo a cor das (poderosas) mulheres!
Conclusão
Georges Duby já disse que, apesar de a “literatura de evasão” sobre o amor cortês deformar a realidade e o imaginário desempenhar ali um importante papel, aqueles textos não poderiam se afastar muito da realidade.130 Bem dito. Por isso, Jacques Lacan se enganou: o amor cortês não foi uma “escolástica do amor infeliz”131, pelo contrário, preencheu o espaço da literatura de então com um tema que colocou a mulher em uma posição superior.
Apesar disso, boa parte dos historiadores medievalistas consultados, inclusive Georges Duby, parece ter a mesma opinião: a mulher não foi elevada com o surgimento do amor, pois a distância dos homens permaneceu a mesma, pois ele também foi elevado.132
Seguindo a mesma linha de Duby, o medievalista brasileiro Rivair Macedo ainda afirma que não houve valorização feminina basicamente por dois motivos: porque esta suposta “elevação” atingiu apenas um grupo específico (a nobreza) e porque a evocação enfatizava a imagem e não a mulher em si.133
Naturalmente, nossa pretensão foi provar exatamente o contrário desses notáveis medievalistas. Ao mesclarmos poesia e pintura, oferecendo as iluminuras como uma espécie de espelho, um pouco distorcido mas sempre próximo das reais atitudes humanas134, quisemos oferecer um painel mais amplo, e sobretudo laico. A intenção foi mostrar que, com o gradativo surgimento da literatura cortês, um espectro social maior pôde ser observado pelo historiador. E nele, a monocórdia imagem misógina da mulher feita pelos clérigos medievais contrasta com a vivacidade e liberalidade do mundo leigo, do mundo das cortes e dos nobres dos séculos XII-XIII. E mesmo que essa elevação da condição feminina tenha ocorrido numa parcela ínfima do corpo social – e definitivamente o foi, como afirma Rivair Macedo – não medimos a importância de um evento por seu alcance e sim por sua profundidade, até porque ele pode ocorrer gradativamente – e parece ter sido este o caso em questão.
Não devemos confundir o discurso dos moralizantes como Jacques de Vitry e outros, com o restante da sociedade medieval. Em outras palavras: é um grave erro de interpretação estender a misoginia clerical a todo o corpo social! Pelo contrário, se os moralistas estavam o tempo todo discursando contra o poder das mulheres, contra sua tagarelice, contra a falsidade expressa através de seus cosméticos e pinturas135, é porque acontecia exatamente o contrário disso na vida real: as mulheres falavam, se pintavam e tinham poder, especialmente o poder do amor! Isso fica muito evidente nesses séculos XII-XIV, quando a literatura laica começou a mostrar sua própria identidade, muitas vezes libertina e anticlerical, como vimos nos textos e imagens aqui apresentados sucintamente.
Entre a pintura e a poesia, as mulheres nobres feudais conseguiram um importante destaque na sociedade de corte. Graças à revolução amorosa, os homens refinaram-se, poliram-se, tornaram-se um pouco mais civilizados, corteses, aprendendo a cortejar a dama até onde ela o permitisse. Elas então passaram a dar a palavra final. Hoje, graças a isso, sem o sim feminino, sem o seu consentimento, não há amor, não há romance, não há paixão. Poder dizer sim, poder não: esse foi a mais notável contribuição medieval aos tempos vindouros. E se hoje, no mundo ocidental, elas ainda estão galgando posições em busca de igualdade de condições, devemos precisar o primeiro passo em direção à essa emancipação: o amor cortês, carinhoso e gentil, criado pelos medievais.
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Notas
- 1. Os trabalhos não são possíveis sem o (às vezes luxuoso) auxílio dos amigos. Assim, agradecemos à Simone Valim Druffner pelas traduções do alemão do Codex Manesse, aos professores Francisco José Pereira das Neves Vieira, pela descrição heráldica do brasão de Anna e sugestões interpretativas, Alexander Fidora (J. W. Goethe-Universität, Frankfurt am Main, Alemanha) e Pedro Paulo Funari (UNICAMP), pelas leituras críticas, Ian Gerard Joseph Ter Reegen (Universidade Estadual do Ceará), que gentilmente ajudou-nos a desvendar o “mistério” da “Queda de Aristóteles”, à Profa. Eni de Mesquita Samara (USP) pelas indicações bibliográficas, e à Profa. Patricia Grau-Dieckmann (Universidad de Buenos Aires), querida amiga e uma das maiores especialistas em análise de imagens medievais, pela leitura atenta e principalmente pela revisão de nossas interpretações iconográficas.
- 2. GURIÉVICH, Arón. Las categorias de la cultura medieval. Madrid: Taurus Humanidades, 1990, p. 89.
- 3. GURIÉVICH, Arón. Las categorias de la cultura medieval, op. cit., p. 110.
- 4. LE GOFF, Jacques. A civilização do Ocidente Medieval. Lisboa: Editorial Estampa, 1984, vol. II, p. 123.
- 5. Zantedeschia aethiopica, da família das Aráceas. Nomes populares: Copo-de-leite; Calas-brancas; Lírio-do-nilo.
- 6. Agradecemos à Profa. Da. Patricia Grau-Dieckmann (Universidad de Buenos Aires) sua preciosa observação das flores, do cenário e sua relação com os personagens da cena.
- 7. Todas as análises das iluminuras medievais tal qual estão expostas neste trabalho tiveram como base metodológica a “descrição pré-iconográfica de uma obra de arte”, sendo consideradas temas primários ou naturais, dentro da proposição de análise feita pelo crítico de arte Erwin Panofsky (“...identificação das formas puras e suas relações mútuas [...] o mundo das formas puras assim reconhecidas como portadoras de significados primários ou naturais pode ser chamado de mundo dos motivos artísticos”). O equipamento para nossa interpretação, de acordo com a teoria de Panofsky, é a experiência prática das condições históricas relativas ao momento da criação artística, compreendendo também a forma que o objeto analisado foi expresso pelas formas do estilo então em voga. Ver PANOFSKY, Erwin. Significado nas Artes Visuais. São Paulo: Editora Perspectiva, 1991, p. 50 e 64-65. Por fim, sempre que possível, relacionamos as imagens com os textos da época. Para a questão da importância da análise de imagens em História, ver FUNARI, Pedro Paulo & ZARANKIN, André. “Algunas consideraciones arqueológicas sobre la vivienda en Pompeya”. In: Gerión 19 (2001). Revista de Historia Antigua de la Universidad Complutense de Madrid, p. 493-512.
- 8. SPINA, Segismundo. A Lírica Trovadoresca. São Paulo: Edusp, 1996, p. 148.
- 9. No Brasil, o amor é um tema preferencial de literatos e psicanalistas (ver, por exemplo, NOVAES, Adauto [coord.]. Os Sentidos da Paixão. São Paulo: Companhia das Letras, 1995, e JABLONSKI, Bernardo. “Amor na Contemporaneidade”. In: Revista Eletrônica Polêmica n.º 8, além, é claro, dos medievalistas (que serão citados ao longo desse trabalho). Os historiadores brasileiros, pelo contrário, têm optado pela questão da sexualidade - tradição desde Gilberto Freyre e seu Casa Grande & Senzala (Rio de Janeiro, Editora Record, 1999). Ver, por exemplo, os artigos de Ronaldo Vainfas e Luiz Mott em NOVAIS, Fernando A. (dir.). História da Vida Privada no Brasil 1. São Paulo: Companhia das Letras, 1997. Até o momento, os trabalhos sobre o amor que tivemos notícia foram: VAINFAS, Ronaldo, Casamento, amor e desejo no ocidente cristão (São Paulo: Editora Ática, 1986), um interessante capítulo sobre o amor no Brasil colônia na obra de Pedro Calmon - História Social do Brasil - Volume 1 - Espírito da Sociedade Colonial (São Paulo: Martins Fontes, 2002, “Criminalidade e amor”, p. 85-93), os artigos de Maria Helena Bueno Trigo (“Amor e casamento no Século XX”) e Ivete Ribeiro (“O amor dos cônjuges: uma análise do discurso católico [século XX]), ambos publicados em D'INCAO, Maria Angela (org.). Amor e família no Brasil. São Paulo: Contexto, 1991, p. 88-94 e 129-150, respectivamente, e dois livros de SAMARA, Eni de Mesquita (A Família Brasileira. São Paulo: Brasiliense, 1986 (Coleção Tudo é História) e As Mulheres, o Poder e a Família. São Paulo, Século XIX. São Paulo: Secretaria de Estado da Cultura, 1989) - agradecemos a atenção dispensada pela Profa. Eni de Mesquita Samara.
- 10. O Banquete, 200a, 205e.
- 11. Ética a Nicômano, VIII, 3, 1156b.
- 12. Ética a Nicômano, IX, 5, 1167; ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 38-40.
- 13. “Não esperava sem casamento nem vantagens materiais, não pensava nem em meu prazer nem nas minhas vontades; buscava apenas, bem o sabes, satisfazer teus desejos. O nome de esposa parece mais sagrado e mais forte, entretanto o de amiga sempre me pareceu mais doce. Teria apreciado, permiti-me dizê-lo, o de concubina ou de mulher de vida fácil, tanto me parecia que, em me humilhando ainda mais, aumentaria meus títulos a teu reconhecimento e menos prejudicaria a glória de teu gênio.” - “Carta de Heloísa a Abelardo”. In: Correspondência de Abelardo e Heloísa. São Paulo: Martins Fontes, 1989, p. 95.
- 14. “Vi-a, pois, quando eu quase acabava os nove anos de idade (...) Tremendo, disse estas palavras: 'Eis um deus mais forte do que eu que vem para me dominar' (...) Desde então, o Amor assenhoreou-se, de facto, da minha alma, que logo a ele se uniu” - DANTE ALIGHIERI. Vida Nova. Lisboa: Guimarães Editores, 1993, II, p. 07-08.
- 15. “Se não é amor, o que é isso que sinto- / Mas se é amor, por Deus, que coisa é tal qual- / Se é bom, por que é áspero e mortal- / Se é mau, por que é doce seu tormento- / Se ardo por gosto, por que me lamento / Se a meu pesar que vale tal pranto- / Oh, viva a morte, ou o deleitoso mal / Por que podes em mim se não o consinto- / E se consinto, é erro queixar-me / Entre contrários ventos vai minha nave / Que em alto-mar me encontro sem governo / Tão leve de saber, tão grave de erro / Que não sei o que quero aconselhar-me / E se temo o verão ardo no inverno.” - PETRARCA. “Se não é amor, o que é isso que sinto”. (acesso em 01/05/2003)
- 16. NIEVES, Luis López. “Amor medieval”. Publicado em Punto y Coma. San Juan, Vol. 2, 1 y 2, 1990, p. 165-166. (acesso em 24/04/2003).
- 17. Ver MACFARLANE, Alan. A Cultura do Capitalismo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1989, p. 158-179.
- 18. “Como afirmou, cinicamente, André Maurois (1885-1967), devemos à Idade Média duas das piores invenções da Humanidade: a pólvora e a idéia do amor romântico.” - JABLONSKI, Bernardo. “Amor na Contemporaneidade”. In: Revista Eletrônica Polêmica n.º 8. Definitivamente, consideramos esta afirmação completamente absurda!
- 19. HOBSBAWM, Eric. Tempos Interessantes. Uma vida no século XX. São Paulo: Companhia das Letras, 2002, p. 140-141.
- 20. HOBSBAWM, Eric. Tempos Interessantes. Uma vida no século XX, op. cit., p. 161.
- 21. HOBSBAWM, Eric. Tempos Interessantes. Uma vida no século XX, op. cit., p. 157.
- 22. Há pouco tempo, um dos redatores deste artigo teve a oportunidade de escutar, com estupefação, um colega afirmar que nunca teria um relacionamento íntimo com alguém que pertencesse ao PFL... Ou seja, para muitos, as opções ideológicas ainda determinam suas vidas íntimas, exatamente como a linha de conduta pessoal traçada e determinada pelo Partido Comunista há mais de sessenta anos! Esse comportamento autômato explica boa parte da reação espantosa de vários alunos da UFES, graduandos de História: quando souberam que estava sendo redigido um artigo sobre o nascimento do amor na Idade Média, muitos disseram, rindo, que isso não era um tema histórico! Uma última história: ao apresentar uma palestra sobre as diferenças entre o príncipe maquiavélico e os Espelhos de príncipes medievais através da relação amor/temor, uma aluna disse que não acreditava que o amor existisse, que nunca tinha amado ninguém e que nunca foi amada! Para ela, portanto, os textos sobre o amor (de qualquer época) tratavam de uma invenção literária! Maus tempos os nossos...
- 23. Ao contrário do que se costuma pensar, Gaston Paris não foi o criador do conceito (em seu artigo datado de 1883 sobre Chrétien de Troyes [“Etudes sur les romans de la table ronde: Lancelot du Lac”, Romania 12, 1883, p. 459-534]). Segundo Raúl César Gouveia Fernandes (“Amor e Cortesia na Literatura Medieval”. In: LAUAND, Jean (coord.). NOTANDUM 7. Editora Mandruvá, p. 02, o trovador Peire d’Alvernh já empregava a expressão cortez amors em seus poemas.
- 24. BLOCH, Marc. A Sociedade Feudal. Lisboa: Edições 70, 1987, p. 319.
- 25. ELIAS, Norbert. O Processo Civilizador. Volume II. Formação do Estado e Civilização. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1994, p. 111.
- 26. DE CANDÉ, Roland. História Universal da Música - volume 1. São Paulo: Martins Fontes, 1994, p. 257.
- 27. ELIAS, Norbert. O Processo Civilizador. Volume II. Formação do Estado e Civilização, op. cit., p. 74. São pulsões como aquelas de que nos fala Freud quando se refere ao amor e a outras pulsões internas, inevitáveis e permanentes. Ver SANTOS, Taisa Barboza. “Os (des)caminhos do amor: um enfoque pulsional”. In: LEMOS, Paulo (dir.). Insight. São Paulo: Lemos Editorial, n. 117, maio de 2001, p. 09, e HANNS, Luiz. Verbete “Pulsão, Instinto: Trieb”. In: Dicionário Comentado do Alemão de Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996, p. 338-354.
- 28. RÉGNIER-BOHLER, Danielle. “Amor cortesão”. In: LE GOFF, Jacques & SCHMITT, Jean-Claude (coord.). Dicionário Temático do Ocidente Medieval I. São Paulo: EDUSC / Imprensa Oficial do Estado, 2002, p. 48.
- 29. ELIAS, Norbert. O Processo Civilizador. Volume II. Formação do Estado e Civilização, op. cit., p. 284, nota 72.
- 30. A tática do “capacho-pedestal” - tese de Gisèle Halimi que Bloch assina embaixo - busca “enaltecer a mulher para rebaixá-la.” - BLOCH, R. Howard. Misoginia Medieval e a invenção do amor romântico ocidental. Rio de Janeiro: Editora 34, 1995, p. 238.
- 31. BLOCH, R. Howard. Misoginia Medieval e a invenção do amor romântico ocidental, op. cit., p. 16.
- 32. BONNASSIE, Pierre. “Amor cortês”. In: Dicionário de História Medieval. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1985, p. 32.
- 33. ANDRÉ CAPELÃO. Tratado do Amor Cortês. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
- 34. Lais de Maria de França (trad. e introd. de Antonio L. Furtado). Petrópolis: Vozes, 2001.
- 35. Cod. Pal. germ. 848. Große Heidelberger Liederhandschrift (Codex Manesse). Zürich (1305-1340). Digitalisiert nach: Codex Manesse - die große Heidelberger Liederhandschrift. Vollständiges Faksimile des Codex Palatinus Germanicus 848 der Universitätsbibliothek Heidelberg. Frankfurt a. M., 1975-1981. Ruprecht-Karls-Universität Heidelberg. E-mail: [email protected]
- 36. BLOCH, Marc. A Sociedade Feudal, op. cit., p. 323.
- 37. “Mas a literatura também tem as suas ciladas: a ficção pode, evidentemente, enganar, e tem sido feita grande propaganda contra ela por aqueles que buscam factos. Acho que isso é inoportuno: como todas as provas desse campo fascinante e traiçoeiro, tem de ser manejada com cuidado; e quando nos servem estatísticas deliciosamente cozinhadas, é prudente polvilhá-las com as ervas e os temperos da literatura de ficção muito bem picados e peneirados.” - BROOKE, Christopher. O casamento na Idade Média. Lisboa: Publicações Europa-América, s/d, p. 32.
- 38. “O sentimento amoroso assume, portanto, um caráter educativo, segundo o qual o amante se aperfeiçoa moralmente através da paciente e humilde servidão em que se vê posto, pois somente o amor pode conduzir o homem à plenitude e à perfeição.” - FERNANDES, Raúl Cesar Gouveia. “Amor e Cortesia na Literatura Medieval”, op. cit., p. 07.
- 39. O rapto e o estupro eram muito comuns (além da violência do marido para com a esposa, como veremos adiante.
- 40. Ver especialmente DUBY, Georges. Eva e os padres. Damas do século XII. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.
- 41. “...os bispos carolíngios do século IX tentaram regulamentar o casamento cristão, redigindo uma série de tratados (espelhos). Neles, o casamento era valorizado, a mulher reconhecida como pessoa com pleno direito familiar e em pé de igualdade com o marido e a violência sexual denunciada como crime grave e do âmbito da justiça pública.” - COSTA, Ricardo da. “A Educação Infantil na Idade Média”. In: LAUAND, Luiz Jean (coord.). Revista VIDETUR 17. Porto: Editora Mandruvá / Faculdade de Educação da USP, 2002, p. 19.
- 42. ROUCHE, Michel. “Alta Idade Média Ocidental”. In: ARIÈS, Philippe e DUBY, Georges (dir.). História da vida privada I. Do Império Romano ao ano mil. São Paulo: Companhia das Letras, 1991, p. 464-465.
- 43. ELIAS, Norbert. O Processo Civilizador. Volume II. Formação do Estado e Civilização, op. cit., p. 76.
- 44. BLOCH, Marc. A Sociedade Feudal, op. cit., p. 319.
- 45. GILISSEN, John. Introdução Histórica ao Direito. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001, p. 607.
- 46. GILISSEN, John. Introdução Histórica ao Direito, op. cit., p. 604.
- 47. LE ROY LADURIE, Emmanuel. Montaillou. Cátaros e Católicos numa aldeia francesa (1294-1324). Lisboa: Edições 70, s/d, p. 247.
- 48. ZEMON DAVIS, Natalie. Histórias de perdão e seus narradores na França do século XVI. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.
- 49. LE ROY LADURIE, Emmanuel. Montaillou. Cátaros e Católicos numa aldeia francesa (1294-1324), op. cit., p. 242.
- 50. BONNASSIE, Pierre. “Amor cortês”. In: Dicionário de História Medieval, op. cit., p. 29.
- 51. DUBY, Georges. A Idade Média na França (987-1460). De Hugo Capeto a Joana D'Arc. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1992, p. 46.
- 52. BLOCH, Marc. A Sociedade Feudal, op. cit., p. 324.
- 53. PERNOUD, Régine. A Mulher nos tempos das cruzadas. Campinas: Papirus, 1993, p. 156, imagem 20. Esta miniatura, que mostra mulheres defendendo seu feudo, pertence ao manuscrito De Nobilitatibus sapientiis et prudentiis regum (Inglaterra, v. 1326, Oxford, Christ Church College, ms Ch Ch 92, t. 4).
- 54. “Assim, o condado de Hainaut foi enfeudado, em 1071, à condessa Richilde. Numerosas foram, desde então, as mulheres que detiveram grandes feudos e exerceram o poder político que daí decorre; citemos as condessas de Flandres, Joana e Margarida de Constantinopla (1205-1244 e 1244-1280), a duquesa de Brabante, Joana (1355-1406), Margarida da Baviera, em Hainaut (1345-1356), Maria de Borgonha para o conjunto dos pays de par deçà (1477-1482). Em França e Alemanha mesmo os maiores feudos transmitem-se às mulheres que, então, desempenham em pessoa os seus serviços feudais, salvo a hoste.” - GILISSEN, John. Introdução Histórica ao Direito, op. cit., p. 602.
- 55. BLOCH, Marc. A Sociedade Feudal, op. cit., p. 320.
- 56. Por exemplo, “...(Inês de Amboise) é uma dessas raras mulheres de brio que os homens da época respeitavam, quando, apeadas da sua feminilidade, se haviam tornado como que suas iguais.” - DUBY, Georges. O cavaleiro, a mulher e o padre. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1988, p. 165.
- 57. DUBY, Georges. O cavaleiro, a mulher e o padre, op. cit., p. 156 e 183.
- 58. NUNES, Rui. “Da Alegria de Amor ao Deus de Amor”. In: LAUAND, Jean (coord.). Revista Internacional d'Humanitats 1 - revista anual binacional. Editora Mandruvá, 1998, p. 03. Ver também MEADE, Marion. Eleonor de Aquitânia. São Paulo: Editora Brasiliense, 1991.
- 59. O surgimento e a propagação dos castelos, a partir do século XI-XII, certamente influíram no desenvolvimento do processo civilizador e da valorização feminina. Ver OLIVEIRA, Terezinha. “O feudalismo e a educação nos castelos medievais”. In: OLIVEIRA, Terezinha (org.). II Ciclo de Estudos Medievais: Saber e Poder na Idade Média. Anais Completos. Maringá: Universidade Estadual de Maringá, 2000, p. 148-155.
- 60. O surgimento e a propagação dos castelos, a partir do século XI-XII, certamente influíram no desenvolvimento do processo civilizador e da valorização feminina. Ver OLIVEIRA, Terezinha. “O feudalismo e a educação nos castelos medievais”. In: OLIVEIRA, Terezinha (org.). II Ciclo de Estudos Medievais: Saber e Poder na Idade Média. Anais Completos. Maringá: Universidade Estadual de Maringá, 2000, p. 148-155.
- 61. BLOCH, R. Howard. Misoginia Medieval e a invenção do amor romântico ocidental, op. cit., p. 195-196.
- 62. O texto completo é esse: “Farai un vers, pos mi somelh / e.m vauc e m'estauc al solelh. / Domnas i a de mal conselh, / e sai dir cals: / cellas c'amor de cavalier / tornon a mals. / Domna fai gran pechat mortal / qe no ama cavalier leal; / mas si es monge o clergal, / non a raizo: / per dreg la deuri'hom cremar / ab un tezo. / En Alvernhe, part Lemozi, / m'en aniey totz sols a tapi: / trobei la moller d'en Guari / e d'en Bernart; / saluderon mi simplamentz / per sant Launart. / La una.m diz en son latin: / "E Dieus vos salf, don pelerin; / mout mi semblatz de belh aizin, / mon escient; / mas trop vezem anar pel mon / de folla gent." / Ar auzires qu'ai respondut; / anc no li diz ni bat ni but, / ni fer ni fust no ai mentaugut, / mas sol aitan: / "Babariol, babariol, / babarian." / So diz n'Agnes a n'Ermessen: / "Trobat avem que anam queren. / Sor, per amor Deu, l'alberguem, / qe ben es mutz, / e ja per lui nostre conselh / non er saubutz." / La una.m pres sotz son mantel, / e mes m'en sa cambra, al fornel. / Sapchatz qu'a mi fo bon e bel, / e.l focs fo bos, / et eu calfei me volontiers / als gros carbos. / A manjar mi deron capos, / e sapchatz agui mais de dos, / e no.i ac cog ni cogastros, / mas sol nos tres, / e.l pans fo blancs e.l vin fo bos / e.l pebr' espes. / "Sor, aquest hom es enginhos, / e laissa lo parlar per nos: / non aportem nostre gat ros / de mantenent, / qe.l fara parlar az estros, / si de re.nz ment." / N'Agnes anet per l'enujos, / e fo granz et ac loncz guinhos: / e eu, can lo vi entre nos, / aig n'espavent, / q'a pauc non perdei la valor / e l'ardiment. / Qant aguem begut e manjat, / eu mi despoillei a lor grat. / Detras m'aporteron lo gat / mal e felon: / la una.l tira del costat / tro al tallon. / Per la coa de mantenen / tira.l gat et el escoissen: / plajas mi feron mais de cen / aquella ves; / mas eu no.m mogra ges enguers, / qui m'ausizes. / "Sor," diz n'Agnes a n'Ermessen, / "mutz es, qe ben es conoissen; / sor, del banh nos apareillem / e del sojorn." / Ueit jorns ez encar mais estei / en aquel forn. / Tant les fotei com auzirets: / cen e quatre vint et ueit vetz, / q'a pauc no.i rompei mos coretz / e mos arnes; / e no.us puesc dir lo malaveg, / tan gran m'en pres. / Ges no.us sai dir lo malaveg, / tan gran m'en pres.” Publicado na Internet (traduzido para o inglês por Leonard Cottrell) (acesso no dia 25.01.2003).
- 63. NICHOLAS, David. A Evolução do Mundo Medieval. Sociedade, Governo e Pensamento na Europa: 312-1500. Lisboa: Publicações Europa-América, 1999, p. 365.
- 64. A estória do poema encontra-se muito bem narrada em MEADE, Marion. Eleonor de Aquitânia, op. cit., p. 32.
- 65. Guillermo IX Duque de Aquitania y Jaufré Rudel. Canciones Completas (edición bilingue preparada por Luis Alberto de Cuenca y Miguel Angel Elvira). Madrid, Editora Nacional, 1978, p. 48-49
- 66. HAUSER, Arnold. História Social da Literatura e da Arte. São Paulo: Editora Mestre Jou, 1982, vol. I, p. 297.
- 67. Publicada integralmente na Bibliotheca Augustana (acesso no dia 24.04.2003)
- 68. WOLFRAM VON ESCHENBACH. Parsifal (trad. de A S. Schmidt Patier). São Paulo: Antroposófica, 1995, Livro I, p. 52.
- 69. Um bom resumo e análise de Parzifal pode ser encontrado em BROOKE, Christopher. O casamento na Idade Média, op. cit., p. 162-174.
- 70. El Cuento del grial de Chrétien de Troyes y sus Continuaciones (introd. y trad. de Martín de Riquer). Madrid: Ediciones Siruela, 2000.
- 71. A edição principal de trabalhos de Wolfram é a de K. Lachmann (Berlim, 1833; edição, 1891); uma edição com introdução e comentários é a de K. Bartsch, de “Und Titurel Parzifal” de “Des Mittelalters Deutsche Klassiker”, IX-XI, 3 partes (Leipzig, 1875-77); editado também por Paul Piper Deutsche de Kürschner em “Nacional-Litteratur”, V, e por E. Martin, “U. Titurel Parzival” (Halle, 1900-03), comentada. Ver REMY, ARTHUR F. J. “Wolfram von Eschenbach”. In: The Catholic Encyclopedia, Volume XV, Online Edition (acesso no dia 24.04.2003).
- 72. Guilherme IX, duque da Aquitânia, para escândalo de Orderic Vital, “...ultrapassava mesmo em bufonaria os histriões mais bufões (facetos etiam histriones facetiis superans).” - ZUMTHOR, Paul. A Letra e a Voz. A “Literatura” Medieval. São Paulo: Companhia das Letras, 1993, p. 59.
- 73. DUBY, Georges. Heloísa, Isolda e outras damas do século XII. São Paulo: Companhia das Letras, 1995, p. 16.
- 74. “As aventuras cavalheirescas dos romances corteses situam-se num mundo de fantasia (...) Todavia, não podemos fugir ao poder dos sentimentos que expressam, ou imaginar que eles eram totalmente destituídos de influência. A vida real está cheia de paradoxos; os romances revelam alguns dos paradoxos da sociedade medieval, com bastante força.” - BROOKE, Christopher. O casamento na Idade Média, op. cit., p. 157.
- 75. DE RIQUER, Martin. “Introducción”. In: El Cuento del grial de Chrétien de Troyes y sus Continuaciones, op. cit., p. 23.
- 76. DE RIQUER, Martin. “Introducción”. In: El Cuento del grial de Chrétien de Troyes y sus Continuaciones, op. cit., p. 23.
- 77. Georges Duby, em seu livro Idade Média, Idade do Homens: do amor e outros ensaios (São Paulo: Companhia das Letras, 1989, p. 63-65), fala-nos do amor cortês, que ele chama de “amor delicado”, justificando sua existência nas cortes como forma de contenção da cavalaria. No entanto, Duby afirma que a dama era a peça menos importante no jogo, pois o verdadeiro objetivo do jovem cavaleiro seria chegar até seu senhor, prestando-lhe as mais sinceras homenagens através de sua esposa. Sua opinião a respeito é a que vigora atualmente em boa parte dos medievalistas, opinião que naturalmente não compartilhamos.
- 78. SPINA, Segismundo. A Lírica Trovadoresca. São Paulo: EDUSP, 1990, p. 24-25.
- 79. Guillermo IX Duque de Aquitania y Jaufré Rudel. Canciones Completas (edición bilingue preparada por Luis Alberto de Cuenca y Miguel Angel Elvira), op. cit., 58-59.
- 80. BROOKE, Christopher. O casamento na Idade Média, op. cit., p. 159.
- 81. ANDRÉ CAPELÃO. Tratado do Amor Cortês, op. cit., p. 211.
- 82. ROUGEMONT, Denis de. O Amor e o Ocidente. Rio de Janeiro: Editora Guanabara, 1988, p. 18. Para a questão da beatitude do amor, ver especialmente DANTE ALIGHIERI. Vida Nova. Lisboa: Guimarães Editores, 1993.
- 83. JOHNSON, Robert A. We: a chave da psicologia do Amor Romântico. São Paulo: Ed. Mercúryo, 1987, p. 78-79.
- 84. PAZ, Octavio. A dupla chama: amor e erotismo. São Paulo: Siciliano, 1994, p. 70-71. Para a questão do instrumental medieval, ver DE CANDÉ, Roland. História Universal da Música - volume 1. São Paulo: Martins Fontes, 1994, p. 222-233, e a excelente Home-page do grupo (brasileiro) de música medieval ATEMPO, onde há um link para cada instrumento medieval (e seu som).
- 85. OVÍDIO. A Arte de Amar. Porto Alegre: L&PM, 2001, p. 58-63.
- 86. FERREIRA, Nadiá Paulo. “Do Amor Cortês ao Amor sob o Signo da Paixão”. In: MALEVAL, Maria do Amparo Tavares (org.). Atualizações da Idade Média. Rio de Janeiro: Ed. Ágora da Ilha, 2000, p. 297-299.
- 87. Lais de Maria de França (trad. e introd. de Antonio L. Furtado). Petrópolis: Vozes, 2001, p. 44-49.
- 88. OVÍDIO. A Arte de Amar, op. cit., 2001, p. 66. “...seu livro A Arte de Amar, é considerado matéria de Ética (...) fora das escolas clericais e monásticas, a obra podia ser lida em traduções como a do poeta Chrétien de Troyes, versão hoje perdida.” - NUNES, Rui. “Da Alegria de Amor ao Deus de Amor”, op. cit., p. 02.
- 89. ANDRÉ CAPELÃO. Tratado do Amor Cortês, op. cit., p. 14-15.
- 90. LÉVY, Ann-Deborah. “Eros”. In: BRUNEL, Pierre. Dicionário de Mitos Literários. Rio de Janeiro: José Olympio, 1998, p. 322-323.
- 91. ANDRÉ CAPELÃO. Tratado do Amor Cortês, op. cit., p. 9.
- 92. Bel m'es quant ilh m'enfolhetis / e.m fai badar e.n vau muzan; / de leis m'es bel si m'escarnis / on gaba dereir'o denan, / qu'apres lo mal me venra bes / be leu, s'a lieys vem a plazer.” - SPINA, Segismundo. A Lírica Trovadoresca, op. cit., p. 113.
- 93. GIOVANNI BOCCACCIO. Decamerão. São Paulo: Nova Cultural, 1996, p. 361.
- 94. MACEDO, José Rivair. “Transgressão Conjugal e Mutilação Ritual nos Fabliaux (séc. XIII)”. In: MALEVAL, Maria do Amparo Tavares (org.). Atualizações da Idade Média. Rio de Janeiro: Ed. Ágora da Ilha, 2000, p. 187-190; NUNES, Rui. “Da Alegria de Amor ao Deus de Amor”, op. cit., p. 03.
- 95. ANDRÉ CAPELÃO. Tratado do Amor Cortês, op. cit., p. 16.
- 96. Lais de Maria de França, op. cit., p. 50.
- 97. “...tais reuniões não passariam, portanto, de divertimentos da sociedade, em que damas ilustres, admitidas como suseranas pelos cavaleiros galantes, deliberavam sobre questões da vida sentimental.” - SPINA, Segismundo. A Lírica Trovadoresca, op. cit., p. 74.
- 98. Filha do conde Teobaldo II de Champanha. Morreu em 1206. Em algumas genealogias aparece como Alix. Foi mãe do rei Felipe Augusto da França.
- 99. NUNES, Rui. “Da Alegria de Amor ao Deus de Amor”, op. cit., p. 06.
- 100. ANDRÉ CAPELÃO. Tratado do Amor Cortês, op. cit., p. 245.
- 101. ANDRÉ CAPELÃO. Tratado do Amor Cortês, Livro III (Da Condenação do Amor), op. cit., p. 267-306.
- 102. ANDRÉ CAPELÃO. Tratado do Amor Cortês, op. cit., p. 246.
- 103. ANDRÉ CAPELÃO. Tratado do Amor Cortês, op. cit., p. 243-244.
- 104. ANDRÉ CAPELÃO. Tratado do Amor Cortês, op. cit., p. 244.
- 105. Para maiores informações sobre o Codex Manesse, ver COSTA, Ricardo da e GONÇALVES, Alyne dos Santos. “Codex Manesse: quatro iluminuras do Grande Livro de Canções manuscritas de Heidelberg (século XIII) - análise iconográfica. Primeira parte”. In: Revista Brathair 1 (1), 2001, p. 03-13 (ISSN 1519-9053) e COSTA, Ricardo da. “Codex Manesse: quatro iluminuras do Grande Livro de Canções manuscritas de Heidelberg (século XIII) - análise iconográfica. Segunda parte”. In: Revista Brathair 4 (2), 2002, p. 02-07.
- 106. VEYNE, Paul. “O Império Romano”. In: ARIÈS, Philippe e DUBY, Georges. História da vida privada I. Do Império Romano ao ano mil. São Paulo: Companhia das Letras, 1991, p. 197. Agradecemos à lembrança desta passagem do texto de Paul Veyne por parte do graduando Diogo Francisco da Silva (UFES).
- 107. DELORT, Robert. “Animais”. In: LE GOFF, Jacques & SCHMITT, Jean-Claude (coord.). Dicionário Temático do Ocidente Medieval I. São Paulo: EDUSC / Imprensa Oficial do Estado, 2002, p. 64.
- 108. O Codex Manesse possui seis iluminuras tendo o roseiral como cenário - Rudolf von Neuenburg (10), Bernger von Horheim (55), Brunwart von Augheim (87), von Bucheim (91), Herr Alram von Gresten (103) e von Obernburg (114), quase sempre para demonstrar o pensamento amoroso. CODEX MANESSE. Die Miniaturen der Großen Heidelberger. Liederhandschrift Insel. Herausgegeben und erläutert von INGO F. WALTHER unter Mitarbeit von GISELA SIEBERT. Frankfurt am Main, Insel Verlag, 1988, p. 21, 113, 178, 187, 211 e 232.
- 109. Ver COSTA, Ricardo da. "Codex Manesse: quatro iluminuras do Grande Livro de Canções manuscritas de Heidelberg (século XIII) - análise iconográfica. Terceira parte".
- 110. “Ir kus der waere ein pfant, / den ich vür tûsent marke naeme sâ zehant. / ein umbevanc / mit armen blanc, / des wünscht dem der den reigen sanc.” (tradução de Simone Valim Druffner) - CODEX MANESSE. Die Miniaturen der Großen Heidelberger, op. cit., p. 165.
- 111. CODEX MANESSE. Die Miniaturen der Großen Heidelberger, op. cit., p. 168.
- 112. “O termo, derivado do latim domina, significa que esta mulher está em posição dominante, ao mesmo tempo que define sua situação: é casada.” - DUBY, Georges. “O modelo cortês”. In: DUBY, Georges e PERROT, Michele (dir.). História das Mulheres no Ocidente. Volume 2 - A Idade Média. Porto: Edições Afrontamento / São Paulo: Ebradil, s/d, p. 331.
- 113. Hoje exposta no Museu dos Agostinhos (Augustinermuseum) na cidade de Freiburg im Breisgau, Alemanha.
- 114. Descrição heráldica gentilmente feita pelo Prof. Dr. Francisco José Pereira das Neves Vieira.
- 115. WOODWARD, John & BURNETT, George. A treatise on heraldry british and foreign. London: David and Charles Reprints, 1969, p. 273. Agradecemos a aula de heráldica via INTERNET do grande amigo e especialista Prof. Dr. Francisco José Pereira das Neves Vieira.
- 116. CHEVALIER, Jean e GHEERBRANT, Alain. Dicionário de Símbolos - mitos, sonhos, costumes, gestos, formas, figuras, cores, números. Rio de Janeiro: José Olympio, 1995, p. 269-270.
- 117. “O avestruz aparece na heráldica primitiva geralmente com uma ferradura, chave ou anel em seu bico. Isso surge da idéia medieval, ainda não extinta hoje, de que este pássaro tem a capacidade de digerir qualquer substância apesar de dura, especialmente ferro.” - WOODWARD, John & BURNETT, George. A treatise on heraldry british and foreign., op. cit., p. 263. “Por exemplo, o Príncipe Negro, filho de Eduardo III da Inglaterra, e herdeiro do trono, foi o primeiro príncipe de Gales a usar as três plumas de avestruz como “moto” heráldico, por volta de 1370.” - VIEIRA, Francisco José Pereira das Neves. Entrevista concedida via INTERNET no dia 30 de abril de 2003.
- 118. Publicado em MALAXECHEVERRÍA, Ignacio. Bestiario medieval. Madrid: Ediciones Siruela, 2000, p. 163.
- 119. ANDRÉ CAPELÃO. Tratado do Amor Cortês, op. cit.
- 120. Ver especialmente uma interessantíssima obra islâmica do século XIV: ABD AL-RAHIM AL-HAWRANI. As Artimanhas das Mulheres. São Paulo: Martins Fontes, 1996.
- 121. LE GOFF, Jacques (dir.). O Homem Medieval. Lisboa: Editorial Presença, 1989, p. 28.
- 122. LE GOFF, Jacques (dir.). O Homem Medieval. Lisboa: Editorial Presença, 1989, p. 28.
- 123. Ver a excelente Home-page do Prof. Ayers Bagley (Universidade de Minnesota) sobre o tema da “queda de Aristóteles” (inclusive com uma rica pesquisa iconográfica sobre o tema): Study & Love: Aristotle's fall (acesso no dia 24.04.2003)
- 124. Passagem também de Coríntios 5, 9: “Um pouco de fermento leveda toda a massa.”
- 125. Paulo se refere aos casos que aconteciam em Corinto de incesto com madrastas. E continua: “Purificai-vos do velho fermento para serdes nova massa, já que sois sem fermento. Pois nossa Páscoa, Cristo, foi imolada. Celebremos, portanto, a festa, não com o velho fermento, nem com fermento de malícia e perversidade, mas com pães ázimos: na pureza e na verdade.”
- 126. JACQUES DE VITRY. Die Exempla aus den Sermones feriales et communes, Heideberg, 1914. Tradução de Ian Gerard Joseph Ter Reegen (Universidade Estadual do Ceará). Jacques de Vitry foi o primeiro a utilizar o exemplo do Aristóteles montado num sermão. Agradecemos ao Prof. Ter Reegen a gentileza de ter feito a tradução da passagem de Jacques de Vitry, além de suas explicações sobre o tema via INTERNET.
- 127. “Maistres, ainçois qu'a vos foli, / Fait la dame, vos convient faire / pour moi um molt divers afaire / se tant estes d'amors sorpris; / quar molt tres grant talent m'est pris / de vos un petit chevaucier / desor cle herbe, en cel vergier.” - Citado por IMBACH, Rudi. “Aristoteles in der Hölle”. In: Peregrina Curiositas, eine Reise durch den orbis antiquus. Universitätssverlag Freiburg Schweiz/Vandenhoeck & Ruprecht Göttingen, 1994.
- 128. “Vale ressaltar que, no contexto medieval, essa história sublinha a questão (polêmica) da aceitação de Aristóteles por parte do mundo cristão, polêmica cristalizada na célebre pergunta: Aristóteles foi para o Céu ou para o Inferno.” - Ian Gerard Joseph Ter Reegen (Universidade Estadual do Ceará). Entrevista concedida via INTERNET no dia 28.04.2003.
- 129. “Dentro dos sistemas simbólicos da Idade Média, o tamanho e a forma da cabeleira podiam indicar aspectos das convenções sociais (...) O modo pelo qual as mulheres dispunham-na revelava seu lugar na família e na sociedade. Com freqüência, às jovens solteiras era permitido mantê-la exposta e ligada por uma trança (...) as mulheres casadas deveriam mantê-la escondida, discreta, ou então amarrada em duas tranças e coberta por touca ou chapéu, evidenciando desse modo seu compromisso conjugal.” - MACEDO, José Rivair. “A face das filhas de Eva: os cuidados com a aparência num manual de beleza do século XIII”. In: História. São Paulo: Universidade Estadual Paulista, 1998/1999, p. 306.
- 130. DUBY, Georges. O cavaleiro, a mulher e o padre, op. cit., p. 159.
- 131. LACAN, Jacques. “O amor cortês em anamorfose”. In: A ética da psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1991, p. 173-190.
- 132. DUBY, Georges. “O modelo cortês”. In: DUBY, Georges e PERROT, Michele (dir.). História das Mulheres no Ocidente. Volume 2 - A Idade Média. Porto: Edições Afrontamento / São Paulo: Ebradil, s/d, p. 330-351.
- 133. MACEDO, José Rivair. A mulher na Idade Média. São Paulo: Contexto, 2002, p. 75.
- 134. BROOKE, Christopher. O casamento na Idade Média, op. cit., p. 32.
- 135. MACEDO, José Rivair. “A face das filhas de Eva: os cuidados com a aparência num manual de beleza do século XIII”, op. cit., p. 292-313.