Os Epistolários Medievais como espaço narrativo fundante

O universo do eu amoroso nas cartas de Bernardo de Claraval

Abstract: The letters of St. Bernard of Clairvaux reveal the most beautiful expression of interiority. Through their reading, the historian can discern the literary assertion of the “self”, especially the ability to love one's neighbour. In fact, during the 12th- century, and within the context of Medieval Christianity, the “self” was consolidated as the greatest psychological process of affirmation of individuality. In this paper, I will analyze some passages from some of St. Bernard's letters in order to show that medieval literary correspondence was the principal founder of “interior spaces,” in which the psyche was revealed, stated, and consolidated.

Keywords: Middle Ages – Letter's of Saint Bernard – Love – Self – Individuality.

Resumo: As cartas de São Bernardo de Clairvaux revelam a mais bela expressão da interioridade. Através de sua leitura, o historiador pode discernir a afirmação literária do “eu”, especialmente a capacidade de amar o próximo. Na verdade, durante o século XII, no contexto do cristianismo medieval, o “eu” se consolidou como o maior processo psicológico de afirmação da individualidade. Neste artigo, analiso algumas passagens das cartas de São Bernardo, a fim de mostrar que a correspondência literária medieval foi o principal espaço dos “espaços interiores” em que a psique foi revelada, afirmada e consolidada.

Palavras-chave: Idade Média – Cartas de São Bernardo – Amor – Eu – Individualidade.

A história do “Eu” – do ponto de vista filosófico, a pessoa, a própria consciência, a identidade pessoal essencial à vida interior – tem uma longa trajetória no pensamento humano. Mais fundamental do que qualquer outra realidade existente, psicológica ou epistemológica, o “Eu” foi concebido na tradição ocidental como a alma, cerne de todas as preocupações filosóficas desde Sócrates (469-399 a. C.), que se considerava ele próprio um servidor da divindade.1 Os pensadores cristãos medievais, eterno objeto de minhas considerações histórico-filosóficas, eram obrigados a refletir o “Eu”, porque a própria divindade, em sua teofania filosófica fundamental, ao ser indagada qual o Seu nome por Moisés no Monte Sinai, respondeu: “Eu sou aquele que é” (Ex 3, 14).

Desde cedo, portanto, meditar o “Eu” significa estar em contato com o próprio Criador, pois a alma, aquilo que realmente é, era a consideração mais sublime dos primórdios da Filosofia e da Teologia, categorias de pensamento que se imbricavam e se retroalimentavam, em Platão (427-347 a. C.), em Aristóteles (384-322 a. C.), nos estoicos, em Sêneca (4 a. C. - 65 a. C.), nos medievais.2 É essa tradição clássica ocidental judaico-cristã que permitiu ao crítico literário George Steiner (1929- ) recentemente afirmar, sem qualquer hesitação, que era um privilégio não ser como os outros, ser diferente, ou, simplesmente, ser.3

Por sua vez, o historiador Johan Huizinga (1872-1945) afirmou que o século XV conferiu ao indivíduo uma identidade pessoal inalienável.4 A própria noção de “indivíduo”, esse eu consciente, construído sempre no plano da afetividade, da emoção, da sensibilidade, mas, sobretudo, na capacidade de se reconhecer como um ser em si, uma alma que deve prestar contas por seus atos – e por isso se comportar à altura de sua dignidade essencial – embora gestada na Antiguidade grega, foi um legítimo e original produto que desabrochou na Idade Média Central (sécs. XI-XIII).

Não obstante, é um fato que, durante a Alta Idade Média (sécs. V-X), notadamente pelas rudes influências dos povos bárbaros, noções abstratas como, por exemplo, a ideia de res publica, decaíram sensivelmente5, e não é difícil imaginar o brusco recuo de um conceito filosoficamente tão elevado como o do ser. Além disso, a autobiografia, o relato par excellence do “Eu”, uma das provas documentais mais sólidas que os historiadores se valem para a percepção da “individualidade”, só ressurgiu no Ocidente no século XI, com o monge Raoul Glaber (c. 985-1047)6 e, especialmente, com o abade Guiberto de Nogent (1053-1121) e sua obra De vita sua.7 Até então, o último texto dessa natureza havia sido as Confissões de Santo Agostinho (354-430).8

Por fim, que se matizem minhas considerações: a vida cotidiana nos séculos XI-XIII sempre transcorria em grupos, nunca individualmente, isto é, toda a existência se passava de um grupo a outro – a família, a escola, a cavalaria, enfim, nas ordens sociais, costumeiramente pensadas como um corpo orgânico e hierárquico.9 Contudo, a força da célula familiar (pai, mãe, três filhos) já se fazia muito presente nos polípticos carolíngios por volta do ano 820, e a antropologia histórica já reconheceu que a família nuclear foi a mais sólida raiz do desabrochar das individualidades na Idade Média.10 O conceito de homem interior para tratar da irrupção dessas “individualidades” no século XIII (que correspondia naquele período, como disse, aos termos alma [anima] e si [seipsum]) em oposição ao conceito de indivíduo11), foi desenvolvido pela historiadora norte-americana Caroline Bynum (1941-)12, e posteriormente adotado por Jacques Le Goff (1924-2014) em seu São Luís.13

Contudo, não é meu desejo entrar nessa estéril e infinda discussão teórica, muitas vezes baseada em premissas que desconsideram as categorias religiosas medievais e cristãs mais básicas – afinal, desde muito cedo, além de destacar o caráter individual do Juízo particular14 e do Juízo Final15, o Cristianismo enfatizou o Pecado Original da Humanidade proveniente de dois indivíduos, os primeiros seres humanos, isto é, Adão e Eva!16 Isso sem contar o Oriente: desde o século IV, a Igreja em Bizâncio – com a ratificação do legislador imperial – determinava que não se deveria confundir os nomes próprios das pessoas.17 É um fato que, por onde quer que se adentre a Idade Média Central, são evidentes as marcas, tanto na Literatura quanto na Arte, das conquistas de uma autonomia pessoal.18 Seja como for, basta-nos ressaltar que o “Eu” – o indivíduo, o homem interior, a alma, o ser – com matizações históricas, naturalmente, sempre existiu, e que seu caráter moral foi enfatizado desde a filosofia estoica romana até a ascensão do Cristianismo no Ocidente, ou seja, na passagem do mundo antigo para o medieval. Por exemplo, já com as Epístolas de São Paulo (c. 5-67 d. C.), era corrente o cristão converso dar o testemunho de sua fé (“Paulo, servo de Cristo Jesus...”19; “Paulo, chamado a ser apóstolo de Cristo”20, etc.); mesmo entre os estoicos, como, por exemplo, em Sêneca (4 a. C. - 65 d. C.), a necessidade de se cuidar de seu “Eu”, de sua alma, era muito recorrente, como podemos observar nestes extratos das Cartas a Lucílio:

Dentro de nós reside um espírito divino que observa e rege os nossos actos, bons e maus; e conforme for por nós tratado assim ele próprio nos trata. Sem a divindade ninguém pode ser um homem de bem. Ou será que alguém pode elevar-se acima da fortuna sem auxílio divino? As decisões grandiosas e justas, é a divindade que as inspira. Em todo o homem de bem. (Carta 41)

A alma é que nos dá a nobreza, uma nobreza a que qualquer um pode aceder, independentemente da sua condição social. (Carta 44)

Devemos evitar o mais possível tudo o que possa excitar os nossos vícios. Devemos endurecer a alma, mantendo-a afastada de todas as seduções de prazer. (Carta 51)

A alma é que confere a cada coisa o seu valor respectivo. Já conheci gente triste que vivia em vilas risonhas e aprazíveis; já encontrei pessoas que, vivendo em completo isolamento, pareciam sempre atarefadíssimas (...) É que dentro da alma que temos os amigos, e a alma nunca se separa de nós. (Carta 55)

Sócrates, que reduziu toda a filosofia à ética, dizia que a suprema sabedoria consistia em distinguir o bem e o mal. “Se a minha autoridade tem para ti algum valor” – dizia ele – “pratica a moral para poderes ser feliz, e não te importes que fulano ou cicrano te ache estúpido. Deixa que os outros te ofendam e te injuriem; desde que possuas a virtude em nada serás lesado por isso. Se queres ser feliz, se queres ser um homem de bem e digno de confiança, não te importes que os outros te desprezem!” (Carta 71)21

Houve, portanto, muitos caminhos pelos quais o mundo interior do “Eu” foi transmitido ao Ocidente Medieval. E uma de suas rotas principais foi percorrida pelas epístolas. As de Sêneca foram muito apreciadas no medievo.22 As de São Paulo, inquestionavelmente. Mas ainda houve as de São Patrício (c. 387-460)23, as de São Jerônimo (c. 340-420), que exerceram notável influência no pensamento cristão, além das considerações de São Gregório Magno (c. 540-604), nas palavras do historiador da tradição beneditina García M. Colombás, o “mestre da vida interior”24, sem contar as obras do Pseudo-Dionísio Areopagita (sécs. V-VI), todas compostas em forma de epístolas.25

Outro bom exemplo da afirmação (precoce ou não) do “eu” é a obra da dama carolíngia Dhuoda (c. 803-843), o Manual para a educação cristã de meu filho (Liber manualis Dhuodane):

Eu, Dhuoda, a ti, Guilherme, filho meu, vendo-me muito distante de ti, e por isso angustiada e totalmente desejosa de te ajudar, te dirijo este opúsculo escrito em meu nome para que seja lido como modelo para a tua formação, e estarei alegre porque, ainda que esteja faltosa corporalmente, este pequeno livro te recordará, quando o leres, o que deves fazer segundo minhas instruções.26

Nem sempre estimado pelos historiadores, o gênero epistolar é um tipo de documento com características muito peculiares e reveladoras. Seu tom intimista e confessional, por exemplo, pode sugerir a abertura para o recôndito mais profundo do escritor, para seu âmago existencial.

De fato, é na epístola que o autor se revela, se desnuda, se expõe por inteiro, sem amarras. No caso dos medievais, é notável a completa liberdade de mostrar-se sem pudor – hoje diríamos em termos “politicamente incorretos”. Tanto em suas Cartas a Heloísa quanto em sua História de minhas calamidades (na verdade, a primeira de suas epístolas), o filósofo Abelardo (1079-1142) revolve seus segredos e se mostra por inteiro, em seus mais despudorados pecados, quando, por exemplo, relata a ingenuidade do tio de Heloísa ao confiar-lhe a educação de sua sobrinha, além de como se desenvolveram as supostas “aulas” com a moça:

Profundamente admirado de que, em semelhante assunto, tamanha fosse sua ingenuidade, meu espanto não foi menor do que se ele entregasse uma tenra ovelha a um lobo faminto. Pois, quando a confiou à minha pessoa para que não só a instruisse mas também severamente a castigasse, que outra coisa fazia senão realizar plenamente meus desejos e oferecer-me uma ocasião – mesmo que eu não quisesse – para com ameaças e punições mais facilmente subjugar quem eu não pudesse conquistar com carícias?

O que mais direi? Primeiramente, unimo-nos em uma só casa, depois em um só coração. Assim, sob o pretexto do estudo, entregávamos inteiramente ao amor, e o estudo da lição oferecia as secretas intimidades que o amor desejava.

Desta maneira, com os livros abertos, falávamos muito mais sobre o amor do que sobre a lição. E os beijos eram muito mais numerosos que as sentenças. As mãos dirigiam-se mais freqüentemente aos seios do que aos livros. (...) Nenhum grau do amor foi omitido pelos apaixonados, e o que o amor pôde imaginar de insólito, foi acrescentado. Quanto menos éramos experientes nesses prazeres, com mais ardor neles insistíamos e tanto menos eles se tornavam fastidiosos.27

Naturalmente o epistolário de Bernardo de Claraval (1091-1153) é bastante distinto do de Abelardo, seu oponente teológico28, embora a salvação passasse a ser entendida para ambos como uma conquista: a plena transformação de si mesmo. Georges Duby (1919-1996) já disse que o tempo de Bernardo e de Abelardo foi o de um convite à introspecção, à exploração da própria consciência que se refugiava, a partir de então, inteira e definitivamente na intimidade da alma, no interior do ser.29 Para o luxurioso mestre da dialética, o “conhece-te a ti mesmo” do Oráculo de Delfos deveria ser um movimento racional; para o ascético abade de Claraval, em contrapartida, só o amor poderia verdadeiramente levar a alma até suas profundezas existenciais.30 O amor foi a virtude da alma que impulsionou o socratismo cristão-medieval, corrente filosófica da qual Bernardo foi seu maior representante.31

São mais de 500 cartas, escritas ao longo de sua fulgurante existência, para todos aqueles que “necessitam dos planos de Deus”:

Disse muitas coisas, caríssimo, embora não necessites, já que possuis um engenho veloz e inteligente para compreender o que te disse e uma vontade ágil para escolher o que se te recomenda para o teu bem. Ainda que tenha me dirigido especialmente a ti, não escrevi essa carta tão longa somente por ti, mas por aqueles que a necessitarão, conforme os desígnios de Deus. Mas a ti te admoesto com toda a confiança, com poucas palavras, por nossa intimidade anterior... (Carta 7, 20).32

Nessa passagem dessa missiva escrita por volta de 1125 a um monge, Bernardo demonstra ter consciência de que suas cartas não eram privadas. Tanto melhor. Nem poderiam sê-las, pois seu conteúdo deveria ser difundido a todos, como bom apologista cristão.33 Essa forma aberta de redação estava de acordo com seu tempo: as cartas, então, eram escritas segundo a preceptiva epistolar da época – a ars dictaminis.34 Suas normas de redação estabeleciam a saudação, o exortium, a disposição e a conclusão: a prosa não era inteiramente livre, já que seu conteúdo deveria ser exposto com certos ritmos vocálicos (cursus).

Por isso, eram compostas para uma audiência, para reuniões ou como exemplos de bela escrita para estudantes iniciantes nas artes liberais.35 Elas expressavam opiniões pessoais dirigidas não apenas ao receptor, pois o autor possuía a consciência de que seriam lidas em voz alta e circulariam livremente em ambientes diversos – e que poderiam, inclusive, ser publicadas.36epistolário bernardiano tem alguns blocos temáticos nos quais se desenvolvem os seguintes conteúdos37:

Cartas

Temas e destinatários

1-7

Para monges em crises com seus votos

37-47

Para o conde Teobaldo II de Champagne (1125-1151), pedindo justiça em favor de um deserdado, além de outros temas

124-139

Para cardeais, bispos, abades, reis e ao papa Inocêncio II (1130-1143), sobre o cisma de Pedro de Leone

164-170

Sobre a disputada eleição do bispo de Langres, bispado ao qual Bernardo pertencia

113-121

Para monjas e diversas senhoras

158-163

Sobre o assassinato de mestre Tomás, prior de São Vítor (Paris)

330-339

Sobre o affaire Pedro Abelardo

Para tamanho volume de trabalho, Bernardo organizou uma espécie de chancelaria em Claraval, com monges ao seu serviço como secretários. Bernardo ditava as cartas, por vezes mais de uma ao mesmo tempo. Esse comprometimento com a história de seu tempo causou-lhe grande sofrimento, e mais de uma vez lamentou sua falta de tempo para a meditação, para os afazeres em sua abadia, e a pouca recepção de suas palavras, tema que lhe proporcionou expor a um irmão de fé, o abade João de Buzay, a natureza do espaço narrativo fundante de suas cartas, o eu amoroso:

O irmão Bernardo deseja que seu caríssimo filho João viva de acordo com o Espírito38 e não abandone o temor do Senhor.39

É impossível expressar a amargura de minha alma40 e a tristeza de meu coração41, caríssimo João, ao ver que nada consigo com minhas cartas, porque meus sermões não entram na tua cabeça.42

Creio ter escrito duas cartas e, por culpa de meus pecados, meu labor não mereceu ainda resposta. Vou jogar pela terceira vez a semente, suplicando ao Deus onipotente que não retorne vazia para mim, mas que prospere e cumpra meu encargo43, finalmente alegrando-se com a colheita de tua obediência e de tua salvação.

Caso me escutes, ou melhor, caso Deus me escute, terei recuperado meu filho44; caso contrário, empunharei novamente as minhas costumeiras armas, isto é, as orações e as lágrimas, não contra ti, mas a teu favor. Chorei e continuarei chorando, e brotarão profundos suspiros do mais íntimo de meu ser, os quais são minhas próprias entranhas. Quem te devolverá a mim, irmão meu, criado no seio de minha mãe?45 Quem te retornará a mim com aquela paz de alma, aquela harmonia de costumes, união de espírito46 e tranquilidade de consciência com os quais te conservei e desfrutei? (Carta 233, 1)

A narrativa da conversão íntima, da consciência, ou melhor, do apelo à consciência, é evocada pelo eu amoroso, “Eu” que só se reconhece à medida que ama. Sem amor, o “Eu” nada é, nada consegue, pois suas palavras não frutificam, suas lágrimas são inutilmente vertidas. Recorde-se que, pela primeira vez na história, as lágrimas passaram a ser consideradas a mais pura expressão do valor, da dignidade humanas.

Nesse belo tema das lágrimas, Jacques Le Goff – não sem a costumeira malícia em tudo o que se refere à Igreja Medieval – não tergiversa: a manifestação mais ostensiva da dor e da tristeza humanas tornou-se um dom graças ao Cristianismo.47 Por isso, trata-se hoje de um belo valor particular da sensibilidade masculina, ideia inexistente no mundo antigo.

Em Bernardo, a alma se reconhece quando sofre, quando chora, quando sente o amargor de sua miséria. Isso está muito bem expresso – com a Retórica clássica exercitada na educação monástica, mesclada, como vimos acima, com a tradição sapiencial bíblica citada de cor (isto é, com o coração), conforme a educação medieval48 – quando o abade considera ir ou não a um debate teológico proposto por Abelardo:

Em primeiro lugar, porque sou uma criança, e ele um guerreiro adestrado desde a adolescência; ademais, porque me parecia indigno provar a solidez da fé com pobres raciocínios humanos, quando nos consta que ela se apóia em uma verdade certa e imutável. Repeti que bastam seus escritos para acusá-lo, e que não era preciso minhas palavras e sim a dos bispos, a quem compete julgar o dogma. (Carta 189, 4)

Em minha necessidade, eu me prometia um largo repouso depois que cessou a raiva leonina e a paz à Igreja retornou. Aquilo passou, mas eu não descanso.49 Ignorava que vivo em um vale de lágrimas50 ou havia esquecido que habito na terra do esquecimento.51 Não me dava conta de que na terra na qual habito germinam cardos e espinhos52 que, cortados, rebrotam, e depois, outros, numa sucessão sem fim. Havia escutado, mas a dor faz compreender melhor, como agora a experimento.53 A dor refrescou, mas não foi exterminada.

As lágrimas me inundam porque me abatem as desgraças: às vítimas do degelo sobreveio a neve.54 Quem suportará esse frio congelador55, esse frio que congela a caridade para que campeie a iniqüidade?56 Livramo-nos de um leão, mas caímos nas fauces de um dragão, talvez mais insidioso57, oculto em sua cova, que o outro, que ruge nas montanhas58, embora já não esteja na cova: oxalá seus papéis empoeirados estivessem armazenados nas bibliotecas e não fossem lidos nas aulas. Seus livros voam, e os que odeiam a luz, porque são maus59, arremeteram contra a luz, convertendo-a em trevas. (Carta 189, 2)

Os epistolários, como se percebe nesses extratos, eram o espaço mais privilegiado para as emoções, as angústias, os sofrimentos e as dilacerações da alma por parte do eu amoroso. Neles vislumbramos os principais temas nos quais a individualidade se manifestou: a defesa da fé60, a admoestação da virtude, a liberdade da consciência que só pode escolher o bem, ou seja, os valores humanos mais sublimes que moldaram, domesticaram e civilizaram o mundo ocidental. Bernardo diz o que sente, sem ameias, sem constrangimentos. É incapaz de se expressar de um modo impessoal.61 É humano, integral, íntegro, total. Isso porque, para ele, o verdadeiro amor aconselha, admoesta, responde ao chamado do amigo hesitante:

Minha primeira reação foi não contestar ao que quisestes consultar à minha brevidade. Não é que duvidasse do que deveria responder, mas que me parecia uma supérflua presunção aconselhar a uma pessoa experiente.62 Mas, pensando que a maior parte, para não dizer todas as pessoas sábias, confia suas dúvidas mais no juízo alheio do que no próprio, elucidam com facilidade as obscuridades alheias e nas suas titubeiam escrupulosamente, eu rompo com o que havia decidido, e creio que não o faço sem razão, para expor com simplicidade meu ponto de vista sem prejulgar aquele que é mais sábio do que eu (...)

Pelo fato de o amor ser o sentimento da divindade, ser a própria divindade, já que Deus vive segundo uma lei que é o amor (Carta 11, 4), o homem que ama é livre, pois diz o que sente, diz a verdade de seu coração. Por isso, Bernardo se dirige aos poderosos com total independência e liberdade de consciência, sem o receio típico das consciências devedoras, como quando escreveu ao imperador Conrado III de Hohenstaufen (c. 1093-1152), e o exortou a defender a autoridade papal contra romanos rebeldes:

Por isso, cinge a espada, potentíssimo63, e que César restitua para si o que é de César, e a Deus o que é de Deus. É evidente que convém a César proteger sua coroa e defender a Igreja. O primeiro é próprio do rei, o segundo do protetor. Confiamos no Senhor que a vitória será facílima. Os romanos têm mais soberba e arrogância que fortaleza. Existe algum grande e poderoso homem, mesmo imperador ou rei, que se atreva a tramar uma ação tão vil contra o Império e o sacerdócio? E este povo maldito e turbulento, que ignora as suas forças, não sabe fazer planos nem prever a utilidade, têm a ousadia de cometer este horrendo sacrilégio aos impulsos de sua imundície e de seu furor. Que a força do populacho ou a barbárie da chusma não resista nem um só momento à face do Rei.

Sou um insensato, porque sou uma pessoa vil e sem títulos, e atuo como um grande personagem, dando conselhos de tal qualidade e prudência e sobre um assunto tão importante. Mas quanto mais indigno e desprezível eu sou, mais livre me sinto para manifestar o que me inspira a caridade. Por isso, atrevo-me a acrescentar, nas asas de minha necessidade: caso alguém se atreva a te sugerir algo distinto do que te disse – embora não creia – esse não ama verdadeiramente o rei, ou entende muito pouco das exigências da majestade real, ou busca seus interesses64 e não se entrega como convém a Deus e ao rei. (Carta 244, 3)

Esse amor-liberdade, sentimento fundante da interioridade mais recôndita do ser, torna os amigos íntimos, na melhor tradição ciceroniana, amizade que sofre com a ausência do amigo, se preocupa com as preocupações do amigo, se rejubila com os júbilos do amigo, e sofre seus sofrimentos:

Esperava, caríssimo, que recebesse algum alívio de minhas preocupações por ti, ao ignorar teus problemas, porque não me contavas. Recordo ter dito em outra carta, entre outras coisas, que se devo ser delicado contigo e não me desentender com tuas angústias, tu serias por tua parte cruel comigo se me comunicasse tudo o que te faz sofrer. Mas o que eu esperava que me aliviasse, te confesso que me agravou ainda mais. Porque antes só me doía o temia o que tu mesmo me comunicavas.

Mas agora, haverá alguma desgraça que possa te ocorrer e que eu não a tema? Já disse teu querido Ovídio: “Quando deixei de temer perigos mais graves que os reais?”.65 Efetivamente, suspeito tudo quando não sei nada de ti, e frequentemente sinto que uma verdadeira tristeza me afoga em puras apreensões.

Isso porque uma vez que o espírito foi afetado pelo amor, já não é dono de si mesmo. Teme o que ignora, sente o que não deve, se preocupa mais do que deseja do que aquilo que não deseja, padece com o outro sem querer, e se compadece com o pesar seu. Como vês, filho, nem minhas preocupações mais medrosas nem tua indelicada prudência me servem para nada a esse respeito.

Por isso, termino suplicando-te que não me ocultes o que te sucede e assim, pretendendo evitar-me a aflição, me aflijas ainda mais. Quando puder, envie-me meus opúsculos que tens em teu poder. (Carta 74)

Como se percebe, a narrativa da identidade do eu amoroso baseia-se fundamentalmente na tradição bíblica, mas não evita, quando é o caso, os escritos clássicos. Aqui Bernardo escrevera a Reinaldo, que entrara em Claraval em 1117 para sair em 1121 como abade fundador de Foigny.66 Sabedor que o amigo estimava Ovídio (43 a.C-17 d.C.), Bernardo se valeu de seus conhecimentos da poesia romana para trazer o amigo novamente para si – e justamente aludindo ao poema erótico ovidiano em que a mulher (Penélope) se dirige ao marido ausente (Ulisses)!

Isso nos leva à definição mais bela do que é o amor no epistolário de Bernardo de Claraval, sua carta primeira. A estória é comovente. Roberto, jovem sobrinho de Bernardo, abandonara Cister por Cluny e trocara a vida rígida e austera que seu tio compartilhava com os cistercienses pela opulência da vida cluniacense, nesse drama pessoal sofrido por Bernardo e que sintetiza a grande polêmica monástica do século XII: deveria a Igreja optar pelo luxo – a vida de Cluny – ou pela pobreza – como Cister?67

Roberto optou pelo luxo e a vida mais relaxada dos cluniacenses. Bernardo sofreu com isso e o chamou de volta, em uma comovente carta:

Diletíssimo filho Roberto, esperei até o limite do possível, confiando que talvez a piedade de Deus se dignasse a visitar tua alma por si e a minha por ti, isto é, que Ele infundisse em ti a saudável compunção e em mim a grande alegria de tua salvação. Mas já que até agora me senti frustrado em minha expectativa68, não posso encobrir mais a minha dor, nem reprimir a minha ansiedade, nem dissimular a minha tristeza.

Por isso, mesmo contra toda a ordenação jurídica, minha ferida me induz a chamar àquele que me feriu e a desprezadamente requerer àquele que me desprezou, humilhando-me para satisfazer a injúria de meu injuriante, e rogando a quem devia me rogar.

Claro que a dor excessiva não delibera nem se ruboriza, não consulta a razão, não teme o dano da própria dignidade, não se atém à lei, não aquiesce com o juízo; ignora o modo e a ordem, pois, antes de tudo, busca uma solução para o sofrimento ou o gozo do que falta. Tu poderás replicar-me: “Eu não feri ninguém, e a ninguém desprezei. Pelo contrário: eu fui o ferido e desprezado de mil maneiras; limitei-me a fugir de meu malfeitor. A quem eu injuriei fugindo das injúrias? Não é melhor distanciar-se do perseguidor que viver agüentando-o? Não é preferível fugir daquele que te fere que feri-lo?

Após esse preâmbulo retórico-jurídico que adornou a dor que Bernardo sentia, chega-se ao ponto crucial: a definição do que é o amor:

Estou de acordo. Não pretendo discutir, mas dirimir a discussão. Fugir da perseguição não é culpa do fugitivo, mas do perseguidor. Não o contradigo. Omito os fatos, não discuto as culpas, não retrato as causas, não recordo as injúrias. Isso só serve para instigar as discórdias, não para mitigá-las. Somente quero falar o que mais me afeta. Sofro muito porque não te tenho ao meu lado, não te vejo, pois vivo sem ti e, para mim, morrer por ti é viver, e viver sem ti é morrer.

Não me pergunto por que fostes; o que me dói é que não voltes. Não denuncio as causas de tua partida, mas a dilação de teu regresso. Vem e façamos as pazes; volta e satisfaça meus desejos. Vem, insisto, volta que eu cantarei com gozo: “Fora morto e reviveu; fora perdido e encontrado”.69

Reparem que o discurso sempre principia com o “Eu”: foi o “Eu” que sofreu e que deseja; é o “Eu” que canta e não pode viver sem o amigo, já que morrer pelo amigo é viver, e viver sem ele é morrer. Bernardo recorda a amizade ciceroniana, pois, para o filósofo e político romano, uma vida digna não poderia ser vivida se não repousasse na benevolência mútua de um amigo.70 A amizade, para Cícero, só poderia existir entre pessoas boas, pois é sobretudo uma harmonia:

Eu somente posso aconselhar que você anteponha a amizade a todos os interesses humanos, pois não há nada mais apropriado à natureza nem mais necessário para a vida, tanto nos momentos favoráveis quanto nos adversos. A amizade não é senão uma harmonia entre todas as coisas, tanto divinas como humanas, acompanhada pela benevolência e pela estima; creio verdadeiramente que, excetuando a sabedoria, não há nada melhor das coisas outorgadas pelos deuses imortais ao gênero humano.

Há gente que antepõe as riquezas; outros, a boa saúde; outros, o poder; outros, as honrarias. Muitos também colocam os prazeres. Esses últimos são como as bestas, enquanto as outras opções são caducas e incertas, e dependem não tanto de nossa eleição como da inconstância da Fortuna.

Contudo, há aqueles que colocam o bem supremo na virtude – e estes obram verdadeiramente muito bem – e essa é a mesma virtude que engendra a amizade e a mantém. É que a amizade não pode, de nenhuma maneira, existir sem a virtude.71

Conclusão

Forma corrente de comunicação em um mundo pré-industrial no qual as distâncias eram longínquas e incertas – mesmo no século XIX as cartas ainda gozavam de um grande prestígio – os epistolários medievais foram espaços fundantes da interioridade, espaços discursivos, dos sentimentos e das angústias da alma, espaços em que o limite era verdadeiramente ser.

Expressos sempre com uma profunda convicção de que só a verdade libertava, eles mostram ao historiador o mundo mental do passado em sua forma mais vívida, mais pura, além de causar-nos uma grande perplexidade por constatar quão profunda era a sensibilidade e o sentimento dos homens do passado, mesmo em meio a um mundo ainda rude, bruto.

Calcada na tradição cristã com pinceladas clássicas, as cartas de Bernardo de Claraval revelam a formação da psique moderna, do eu amoroso, que não só se afirmou em meio ao caos da existência, mas também pretendeu ordenar o real sob suas leis, as leis da filia (φιλία), isto é, do amor.72

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Fontes

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CICERÓ. LELI (De l’amistat) (introd., text revisat, traducció i notes de Pere Villalba I Varneda). Barcelona: Fundació Bernat Metge, 1999.
DENZINGER, Enrique. El Magisterio de la Iglesia. Barcelona: Editorial. Herder, 1963.
DHUODA. La Educación Cristiana de mi hijo (introd., trad. y notas de Marcelo Merino). Pamplona: Ediciones Eunate, 1995.
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SAN BERNARDO DE CLARAVAL. Obras completas de San Bernardo VII. Madrid: Biblioteca de Autores Cristianos (BAC), MCMXC.

Bibligrafia

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Notas

  • 1. PLATÃO. Protágoras-Górgias-Fedão (tradução do grego de Carlos Alberto Nunes). Belém: Editora da UFPA, 2002, Fedão, 85a, p. 291.
  • 2. COSTA, Ricardo da. “As raízes clássicas da transcendência medieval”. In: MARINHO, Simone (org.). Contemplatio. Ensaios de Filosofia Medieval. Campina Grande: EDUEPB, 2013, p. 19-42.
  • 3. “...bendigo a minha mãe ter me insuflado tudo que existe em mim de força de vontade e de domínio. Eu lhe devo igualmente minha hesitação diante de todas as terapias ditas modernas. Essa desvantagem me trouxe, ao contrário, felicidade (...) É o contrário até da psicologia coletivista americana ou da psicanálise freudiana que exige do indivíduo ser semelhante aos outros. A própria idéia de ser ‘como os outros’ me parece uma aberração.” – JAHANBEGLOO, Ramin. George Steiner: à luz de si mesmo. São Paulo: Editora Perspectiva, 2003, p. 29.
  • 4. HUIZINGA, Johan. O Outono da Idade Média. Estudo sobre as formas de vida e de pensamento dos séculos XIV e XV na França e nos Países Baixos. São Paulo: CosacNaif, 2010, p. 591. Ouso ir além: ao contrário da ideia de que a Idade Média renegou a mulher e ignorou a criançaLE GOFF, Jacques. A civilização do ocidente medieval. Lisboa: Editorial Estampa, 1984, vol. II, p. 44.
  • 5. ROUCHE, Michel. Alta Idade Média Ocidental”. In: ARIÈS, Philippe e DUBY, Georges (dir.). História da vida privada I. Do Império Romano ao ano mil. São Paulo: Companhia das Letras, 1991, p. 405.
  • 6. RODULFUS GLABER. The Five Books of the Histories, ed. J. France, Oxford, 1989. Por sua vez, Georges Duby (1919-1996) considera Glaber a melhor testemunha do seu tempo, apesar de “pouco dócil e instável”, e não ter boa reputação entre seus contemporâneos, pois “dizem-no linguareiro, crédulo, inapto, e acham o seu latim difuso”. DUBY, Georges. O ano mil. Lisboa: Edições 70, 1986, p. 22-23.
  • 7. In: Patrologia Latina, 156, p. 838-962. Sobre Guibert de Nogent, ver CHAURAND, J. “La conception de l’histoire de Guibert de Nogent (1053-1124)”. In: Cahiers de Civilisation Médiévale, p. 381-395.
  • 8. NICHOLAS, David. A Evolução do Mundo Medieval. Sociedade, Governo e Pensamento na Europa: 312-1500. Lisboa: Publicações Europa-América, 1999, p. 64.
  • 9. DUBY, Georges. “A emergência do indivíduo”. In: DUBY, Georges (org.). História da vida privada II. Da Europa Feudal à Renascença. São Paulo: Companhia das Letras, 1990, p. 502-526.
  • 10. TOUBERT, Pierre. “O período carolíngio (séculos VIII a X)”. In: BURGUIÈRE, André, KLAPISCH-ZUBER, Christiane, SEGALEN, Martine, ZONABEND, Françoise. História da Família. 2. Tempos Medievais: Ocidente, Oriente. Lisboa: Terramar, 1997, p. 65.
  • 11. Adotado por ULMANN, Walter. The individual and Society in the Middle Ages, Baltimore, 1966, e GUREVITCH, J. Aron. As categorias da cultura medieval. Lisboa: Editorial Caminho, 1990.
  • 12. BYNUM, Caroline. “Did the Twelfth Century discover the individual?”. In: Journal of Ecclesiastical History, 31, 1980.
  • 13. “O século XIII, enfim, marcou uma virada na qual se manifestaram sintomas que testemunham pretensões crescentes, na pessoa humana, de ser reconhecida.” LE GOFF, Jacques. São Luís. Biografia. Rio de Janeiro: Editora Record, 1999, p. 447.
  • 14. Lc 16, 19-31 (nessa passagem, conclui-se que cada alma, logo ao deixar esse mundo, recebe a devida sanção); Lc 23, 43 (logo após a morte, o pecador julgado e agraciado goza da bem-aventurança destinada aos justos); 2Cor 5-6 (depreende-se que logo depois da morte, os justos gozam do prêmio da visão de Deus); Fl 1, 23. A crença na existência do Juízo Particular, já se desenvolveu a partir da Alta Idade Média, e foi confirmada no II Concílio de Lyon (1274): “D-464. Aquelas almas que, após ter recebido o sagrado batismo, não incorreram em qualquer mancha de pecado, e também aquelas que, após terem contraído, foram purgadas, ou, enquanto permaneciam em seus corpos ou depois de desnudarem-se deles, como se disse acima, são recebidas imediatamente no Céu. Contudo, as almas daqueles que morrem em pecado mortal ou somente o original, descem imediatamente ao Inferno para serem castigadas, embora com penas desiguais. A mesma sacrossanta Igreja Romana crê e afirma firmemente que, do mesmo modo, todos os homens com seus corpos comparecerão no Dia do Juízo diante do Tribunal de Cristo para dar conta de seus próprios feitos (Rm, 14, 10).” – DENZINGER, Enrique. El Magisterio de la Iglesia. Barcelona: Editorial. Herder, 1963, p. 137-138.
  • 15. “Não há nada de encoberto que não venha a ser revelado, nem de oculto que não venha a ser conhecido. Portanto, tudo o que tiverdes dito às escuras, será ouvido à luz do dia, e o que houverdes falado aos ouvidos nos quartos, será proclamado sobre os telhados”, Lc 12, 2-3.
  • 16. “Como por meio de um só homem o pecado entrou no mundo e, pelo pecado, a morte, e assim a morte passou para todos os homens, porque todos pecaram”; “Pela desobediência de um só homem, todos se tornaram pecadores”, Rm 5, 12 e 5, 19.
  • 17. PANTLAGEAN, Evelyne. “Bizâncio: séculos X-XI”. In: ARIÈS, Philippe e DUBY, Georges (dir.). História da vida privada I. Do Império Romano ao ano mil, op. cit., p. 572.
  • 18. DUBY, Georges. “A emergência do indivíduo”, op. cit., p. 505.
  • 19. Rm, 1, 1.
  • 20. 1Cor 1, 1.
  • 21. LÚCIO ANEU SÉNECA. Cartas a Lucílio. (trad., prefácio e notas de J. A. Segurado e Campos). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2007.
  • 22. VERBAAL, Wim. “Bernardus Philosophus”. In: Sapientia Dei – Scientia Mundi. Bernardo de Claraval e o seu tempo. Revista Portuguesa de Filosofia. Braga, vol. 60, fasc. 3, 2004, p. 567-586.
  • 23. Publicadas em Brathair 7 (1), 2007: 107-136.
  • 24. COLOMBÁS, G. M. La tradición benedictina. Ensayo histórico. II. Los siglos VI y VII. Zamora: Ediciones Monte Casino, 1990, p. 215-274.
  • 25. Obras completas del Pseudo Dionisio Areopagita. Madrid: Biblioteca de Autores Cristianos, MCMCV.
  • 26. DHUODA. La Educación Cristiana de mi hijo (introd., trad. y notas de Marcelo Merino). Pamplona: Ediciones Eunate, 1995, p. 51.
  • 27. Abelardo – Heloísa. Cartas. As cinco primeiras cartas traduzidas do original apresentadas e comentadas por Zeferino Rocha. Recife: Editora Universitária da UFPE, 1997, p. 74-77.
  • 28. Para o debate teológico entre Bernardo e Abelardo, ver COSTA, Ricardo da. “‘Há algo mais contra a razão que tentar transcender a razão só com as forças da razão?’: a disputa entre São Bernardo de Claraval e Pedro Abelardo”. In: LAUAND, Jean (org.). Anais do X Seminário Internacional: Filosofia e Educação - Antropologia e Educação - Ideias, Ideais e História. São Paulo: Editora SEMOrOc (Centro de Estudos Medievais Oriente & Ocidente da Faculdade de Educação da USP) / Núcleo de Estudos de Antropologia UNIFAI / Factash Editora, 2010, p. 67-78.
  • 29. DUBY, Georges. “A emergência do indivíduo, op. cit., p. 5o6.
  • 30. COSTA, Ricardo da. “‘O verdadeiro amor nasce de um coração puro, de uma consciência boa e de uma fé sincera, e ama o bem do próximo como se fosse seu’: a mística de São Bernardo de Claraval”. In: COSTA, Marcos Roberto Nunes (org.). A Experiência humana do divino. Perspectiva Filosófica Recife, v. I, n. 35, jan./jun. 2011, p. 125-140.
  • 31. COSTA, Ricardo da. “O que é Deus? Considerações sobre os atributos divinos no tratado Da Consideração (1149-1152), de São Bernardo de Claraval”. In: Revista Coletânea. Revista de Filosofia e Teologia da Faculdade de São Bento do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Editora Lumen Christi, Ano IX, fasc. 18, jul-dez 2010, p. 223-238.
  • 32. SAN BERNARDO DE CLARAVAL. Obras completas de San Bernardo VII. Madrid: Biblioteca de Autores Cristianos (BAC), MCMXC, p. 121. A partir de agora citaremos somente o número da carta.
  • 33. “Ide, portanto, e fazei que todas as nações se tornem discípulos, batizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo e ensinando-as a observar tudo quanto vos ordenei. E eis que eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos!”, Mt 28, 19-20.
  • 34. CURTIUS, Ernest Robert. Literatura Européia e Idade Média Latina. São Paulo: HUCITEC, 1996, p. 115-116.
  • 35. COSTA, Ricardo da. “Las definiciones de las siete artes liberales y mecánicas en la obra de Ramon Llull”. In: Revista Anales del Seminario de Historia de la Filosofía. Madrid: Publicaciones Universidad Complutense de Madrid (UCM), vol. 23 (2006), p. 131-164.
  • 36. COSTA, Ricardo da, e SEPULCRI, Nayhara. “Querer o bem para nós é próprio de Deus. Querer o mal só depende de nosso querer. Não querer o bem é totalmente diabólico”: São Bernardo de Claraval (1090-1153) e o mal na Idade Média”. In: Anais do II Simpósio Internacional de Teologia e Ciências da Religião. Belo Horizonte, ISTA/PUC Minas, 2007.
  • 37. Quadro extraído do mapeamento de ARANGUREN, Iñaki. “Introduccion”. In: SAN BERNARDO DE CLARAVAL. Obras completas de San Bernardo VII, op. cit., p. 04.
  • 38. “Ora, eu vos digo, conduzi-vos pelo Espírito e não satisfareis os desejos da carne. Pois a carne tem aspirações contrárias ao espírito e o espírito contrárias à carne”, Gl 5, 16-17.
  • 39. “Ora, eu vos digo, conduzi-vos pelo Espírito e não satisfareis os desejos da carne. Pois a carne tem aspirações contrárias ao espírito e o espírito contrárias à carne”, Gl 5, 16-17.
  • 40. “Já que tenho tédio à vida, darei livre curso ao meu lamento, desafogando a amargura da minha alma. Direi a Deus: Não me condenes, explica-me o que tens contra mim. Acaso te agrada oprimir-me, desdenhar a obra de tuas mãos e favorecer o conselho dos ímpios?”, Jó 10, 1-3.
  • 41. “Qualquer ferida, menos a do coração; qualquer malícia, menos a da mulher”, Eclo 25, 13.
  • 42. “Sei que sois a descendência de Abraão, mas procurais matar-me, porque a minha palavra não penetra em vós”, Jo, 8, 37.
  • 43. “Como a chuva e a neve descem do céu e para lá não voltam, sem terem regado a terra, tornando-a fecunda e fazendo-a germinar, dando semente ao semeador e pão ao que come, tal ocorre com a palavra que sai da minha boca: ela não torna a mim sem fruto; antes, ela cumpre a minha vontade e assegura o êxito da missão para a qual a enviei”, Is 55, 10-11.
  • 44. “Se o teu irmão pecar, vai corrigi-lo a sós. Se ele te ouvir, ganhaste o teu irmão. Se não te ouvir, porém, toma contigo mais uma ou duas pessoas, para que toda questão seja decidida pela palavra de duas ou três testemunhas. Caso não lhes der ouvido, dize-o à Igreja. Se nem mesmo à Igreja der ouvido, trata-o como o gentio ou o publicano. Em verdade vos digo: tudo quanto ligardes na terra será ligado no céu e tudo quanto desligardes na terra será desligado no céu”, Mt 18, 15-18.
  • 45. “Ah! Se fosses meu irmão, amamentado aos seios da minha mãe! Encontrando-te fora, eu te beijaria, sem ninguém me desprezar; eu te levaria, te introduziria na casa de minha mãe, e tu me iniciarias; dar-te-ia a beber vinho perfumado e licor de minhas romeiras.”, Ct 8, 1-2.
  • 46. “Portanto, pelo conforto que há em Cristo, pela consolação que há no Amor, pela comunhão no Espírito, por toda a ternura e compaixão, levai à plenitude a minha alegria, pondo-vos acordes no mesmo sentimento, no mesmo amor, numa só alma, num só pensamento, nada fazendo por competição e vanglória, mas com humildade, julgando cada um os outros superiores a si mesmo, nem cuidando cada um só do que é seu, mas também do que é dos outros. Tende em vós o mesmo sentimento de Cristo Jesus”, Fl 2, 1-5.
  • 47. “Das lágrimas de Cristo ao choro profético de João, o Antigo Testamento fornece muita matéria para conferir às lágrimas uma positividade que a Igreja irá explorar amplamente. O dom das lágrimas tornar-se-á mesmo um critério de santidade a partir do século XI. Mérito ao dom, virtude ou graça, habitus (isto é, segundo Tomás de Aquino, uma “disposição habitual”) ou carisma, os homens pios andam à procura de lágrimas.” – LE GOFF, Jacques, e TRUONG, Nicolas. Uma história do corpo na Idade Média. Lisboa: Editorial Teorema, 2005, p. 62. Em relação à malícia legoffiana – a religiosidade cristã vista sempre como instrumento político ou uma manifestação de classe, materialista – são muitos os exemplos, desde a conversão “maquiavélica” do rei Clóvis (“A grande esperteza de Clóvis esteve na conversão, dele e de todo o seu povo, não ao arianismo, mas ao catolicismo”, A civilização do Ocidente Medieval, vol. I, op. cit., p. 47), sem qualquer comprovação documental (para isso, ver os documentos sobre a conversão do rei franco, segundo Ávido de Viena [c. 470-523] e Gregório de Tours [c. 538-594], em HILLGARTH, J. N. Cristianismo e Paganismo. 350-750. A Conversão da Europa Ocidental. São Paulo: Madras, 2004, p. 90-92 e 95-97) até a “luta de classes” expressa quando São Francisco beija os pés de um camponês (São Francisco de Assis. Lisboa: Teorema, 2000, p. 79-80). O beijo de São Francisco, para Le Goff, significa a tentativa de atenuar os conflitos sociais!
  • 48. COSTA, Ricardo da. “História e Memória: a importância da preservação e da recordação do passado”. In: LAUAND, Jean (org.). Filosofia e Educação – Estudos 10. Edição Especial VIII Seminário Internacional CEMOrOc: Filosofia e Educação. São Paulo: Editora SEMOrOc (Centro de Estudos Medievais Oriente & Ocidente da Faculdade de Educação da USP) – Factash Editora, 2008, p. 81-89.
  • 49. “Vivo sem paz e sem descanso, eu não repouso: o que vem é a agitação!”, Jo 3, 26.
  • 50. “Ao passar pelo Vale das Balsameiras eles o transformam em fonte”, Sl 83, 7 (Vale das Balsameiras – a balsameira, ou “árvore que chora”, deve ser a amoreira).
  • 51. “Conhecem tuas maravilhas na treva, e tua justice na terra do esquecimento?”, Sl 87, 13 (o Salmo 87 é o da súplica do fundo da angústia!).
  • 52. “Ele produzirá para ti espinhos e cardos”, Gn 3, 18.
  • 53. “Em suma, só o medo fará entender a mensagem”, Is 28, 19.
  • 54. “Meus irmãos atraiçoaram-me como uma torrente, como canais de um rio que transborda, tornando-se turvo pelo degelo e arrastando consigo a neve”, Jo 6, 16.
  • 55. “Ele atira seu gelo em migalhas: diante do seu frio, quem pode resistir?”, Sl 147, 17.
  • 56. “E pelo crescimento da iniqüidade, o amor de muitos esfriará”, Mt 24, 12.
  • 57. “Fraude e astúcia lhe enchem a boca, sob sua língua há opressão e maldade. Põe-se de emboscada entre os juncos e às escondidas massacra o inocente”, Sl 9, 29.
  • 58. “Ele ruge contra a tua pastagem”, Jr 25, 30.
  • 59. “Por que foi dada a luz a quem o trabalho oprime, e a vida a quem a amargura aflige”, Jo 3, 20.
  • 60. COSTA, Ricardo da. “‘Há algo mais contra a razão que tentar transcender a razão só com as forças da razão?’: a disputa entre São Bernardo de Claraval e Pedro Abelardo”, op. cit.
  • 61. ARANGUREN, Iñaki. “Introduccion”, op. cit., p. 08.
  • 62. “O homem sensato não despreza os conselhos, o estrangeiro e o orgulhoso não conhecem o temor. Não faças nada sem conselho: não te arrependerás de teus atos”, Eclo 32, 18-19.
  • 63. “O homem sensato não despreza os conselhos, o estrangeiro e o orgulhoso não conhecem o temor. Não faças nada sem conselho: não te arrependerás de teus atos”, Eclo 32, 18-19.
  • 64. “Não tenho ninguém de igual sentimento que tão sinceramente como ele se preocupe com o que vos diz respeito; pois procuram atender os seus próprios interesses e não os de Jesus Cristo”, Fl 2, 20-21.
  • 65. Ovídio (Publius Ovidius Naso, 43 a.C-17 d.C.) foi um poeta romano, autor de três obras de poesia erótica (Heroides, Amores e Ars Amatoria), das Metamorfoses (poema hexâmetro mitológico) Fastos, Tristia e Epistulae ex Ponto (coletâneas de poemas), além de peças menores. Nesta carta, Bernardo cita a obra Heroides (1, 11), poema elegíaco que Ovídio compôs antes de seu desterro. São 21 cartas de amor que personagens femininos da Mitologia e da Literatura escrevem a seus amados. Bernardo cita a primeira, em que Penélope se dirige a Ulisses.
  • 66. ARANGUREN, Iñaki. “Introduccion”, op. cit., p. 24.
  • 67. Para o tema, ver, COSTA, Ricardo da. “Cluny, Jerusalém celeste encarnada (séculos X-XII)”. In: Revista Mediaevalia. Textos e Estudos 21 (2002), p. 115-137.
  • 68. “Sustenta-me, conforme tua promessa, e eu viverei, não deixes que minha esperança me envergonhe”, Sl 118, 116.
  • 69. “Trazei o novilho cevado e matai-o; comamos e festejemos, pois este meu filho estava morto e tornou a viver; estava perdido e foi reencontrado.”, Lc 15, 23- 24.
  • 70. Para o apreço que os medievais tinham por Cícero, ver CONVENIT SELECTA – 7. Cicero and the Middle Ages.
  • 71. CICERÓ. LELI (De l’amistat) (introd., text revisat, traducció i notes de Pere Villalba I Varneda). Barcelona: Fundació Bernat Metge, 1999, V.17, 18, VI, p. 98, 99 e 102.
  • 72. “Repare que la palabra griega filia (φιλία) tanto designa el amor cuanto la amistad. El significado de la palabra es siempre lo mismo para Platón: se trata de una forma que es fundamental para toda la comunidad humana que no sea puramente natural, sino una comunidad espiritual y ética.” – COSTA, Ricardo da. Los clásicos que hacen clásicos. La importancia de los clásicos y de la tradición clásica en la configuración del canon cultural medieval. Cuadernos de Historia Universal UCR – UMA, Tomo I, vol. II, agosto de 2013, p. 43.

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